Meio & Mensagem
29 de outubro de 2014 - 3h23
* Por Marcos Caetano
Na minha razoavelmente profícua vida paralela de cronista, tive o prazer de colaborar com títulos importantes como os jornais O Estado de S. Paulo e Jornal do Brasil e as revistas Piauí, Bravo, Trip, 02 e Placar.
Faltava, no entanto, a glória de escrever para o veículo mais importante da indústria na qual ganho o pão de cada dia e o único em relação ao qual cultivo o prazeroso hábito de ler de cabo a rabo. Pois agora não falta mais: cá estou, todo metido a besta com o meu cantinho no Meio & Mensagem.
No princípio, os princípios. O único pedido que fiz a Regina Augusto foi não escrever mais uma coluna sobre marketing e comunicação. Ao menos, não uma coluna tradicional sobre esses assuntos. Foi por isso que batizei este espaço de Coffee Break. Justamente para dar o recado do que pretende ser: uma crônica despretensiosa sobre coisas que estão por aí, no nosso dia a dia, e sobre as quais raramente temos chance de falar sem passar a impressão de estarmos em cima de um palco e por trás daqueles púlpitos dos inescapáveis eventos corporativos que frequentamos.
Agora que você já sabe que não é para levar tão a sério o que lê por aqui, queria usar o resto de espaço do Coffee Break de estreia para falar sobre pesquisas. Não, não vou falar das pesquisas eleitorais, porque se há uma coisa que detesto é bater em gato morto. Falo das pesquisas de mercado mesmo, aquelas tradicionalíssimas, com pelo menos 150 slides, que tanto usamos para testar um novo conceito de produto ou avaliar uma campanha.
Nada tenho contra pesquisas ou ‘pesquiseiros’. Ao longo de minha carreira, trabalhei com dezenas de institutos e, com a ajuda de seus profissionais, consegui levar ao ar coisas bacanas. O meu ponto é: o problema não são as pesquisas, mas o uso que fazem delas gestores de marketing cada vez mais pressionados por resultados imediatos, comitês executivos tirânicos e áreas de vendas que não querem nem saber se o pato é macho ou fêmea — querem é ver o ovo.
A penúltima geração de marqueteiros, embora trabalhasse muito com pesquisas, tinha a sensação de que era simplesmente impossível medir todo e qualquer suspiro do consumidor. Diante disso, em algum momento, embora se borrando de medo, aqueles caras tinham de se jogar em alguma direção. A imprecisão fazia parte do pacote. Hoje, por conta da evolução dos instrumentos de medição, das redes sociais e do retorno online sobre quase tudo que se faz, a turma de marketing — da qual, que fique claro, faço parte — se apavora com a menor possibilidade de fazer algo capaz de gerar ruído.
E, sem ruído, leitor querido, nada muito genial virá à tona. Se o Washington Olivetto fosse ouvir pesquisas e medir a repercussão em redes sociais sobre um filme que trazia uma adolescente seminua provando uma peça íntima de vestuário, a campanha do primeiro sutiã que a gente nunca esquece jamais seria lembrada.
Toda vez que deixarmos exclusivamente nas mãos dos consumidores a tarefa de escolher entre duas campanhas, eles sempre escolherão a que tem um bebê, um vovô com o netinho, pessoas dançando em câmera lenta, funcionários cantando o jingle da empresa ou um golden retriever fofíssimo.
Sendo assim, colega marqueteiro, fica a dica: da próxima vez que você se decidir pelo caminho molezinha da agência maior, com a produtora mais consagrada, com o diretor mais caro e com o roteiro mais aclamado pelas pesquisas, pense outra vez. Pense no seguinte: será que Tony Soprano, Walter White ou mesmo o improvável Shrek teriam chegado às telas se tivessem passado por um famigerado estudo quantitativo de 150 slides?
Comidinha para os pensamentos, como dizem os norte-americanos. Acabou o
Coffee Break. Vamos voltar para o batente e até o próximo intervalo.
* Marcos Caetano é diretor global de comunicação corporativa da BRF.