Victor, Zé Mayer, BBB: como a Globo analisa suas crises
Diretor de comunicação da emissora, Sérgio Valente fala sobre a responsabilidade do veículo em relação a casos de assédio, agressões e questões que impactam a sociedade
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Bárbara Sacchitiello
17 de abril de 2017 - 18h09
Em menos de dois meses, três situações ocorridas com profissionais e pessoas de seu casting colocaram a Globo em uma situação delicada. Em fevereiro, o cantor sertanejo Victor Chaves (que, ao lado do irmão, Léo, era um dos técnicos do reality show The Voice Kids), foi acusado de agressão pela esposa. No início de abril, a figurinista Susllen Tonani, que trabalhou na equipe da novela A Lei do Amor, acusou publicamente de assédio o ator José Mayer, um dos nomes mais antigos da emissora. E, em sua reta final, Big Brother Brasil acabou gerando assunto para as editoriais policiais: o participante Marcos foi expulso da atração após uma delegada ter constatado que ele agrediu Emilly, outra participante do confinamento.
Embora estejam vinculados a diferentes áreas da empresa, os três episódios têm em comum a agressão e desrespeito às mulheres, um dos temas que mais mobiliza a sociedade atual, dentro e fora do País. Consciente da importância e do buzz em torno do assunto, a Globo procurou tomar providências. O cantor Victor foi afastado do The Voice Kids, ficando representado pelo seu irmão. No episódio envolvendo José Mayer, a emissora foi ainda mais firme: afastou o ator da próxima novela da qual ele participaria, divulgou publicamente que repudia qualquer forma de assédio e deu espaço, em sua própria programação, à campanha #MexeuComUmaMexeuComTodas, iniciada pelas funcionárias e atrizes da casa. E, no Big Brother, a Globo decidiu expulsar o participante na semana da final (não, sem antes, receber diversas críticas por ter, segundo o público, demorado a tomar uma atitude punitiva).
Na opinião de Sérgio Valente, diretor de Comunicação da Globo, embora a emissora não tenha responsabilidade sobre as opiniões e atitudes que seus colaboradores tenham fora do ambiente de trabalho, é preciso ter cuidado para “ajustar” cada manifestação pessoal que não esteja de acordo com as filosofias e crenças da casa.
Em entrevista ao Meio & Mensagem, Valente comenta como a emissora lidou com os episódios e como os aproveitou para reforçar as bandeiras de responsabilidade social que já vinha defendendo com a plataforma “Tudo Começa Pelo Respeito”. Ele também explica o porquê de a emissora ter demorado a tomar uma atitude em relação ao participante Marcos e fala dos cuidados e atenção nessários para que que as campanhas sociais não sejam classificadas como oportunistas. Veja:
Meio & Mensagem: A Globo teve de lidar com diversos problemas envolvendo seus contratados e sua programação nos últimos meses (com o cantor Victor, o ator José Mayer e mais recentemente, com o BBB). Que tipo de responsabilidade a emissora tem em acontecimentos como esses?
Sérgio Valente: É uma responsabilidade indireta. As empresas, obviamente, são responsáveis pelo que seus colaboradores fazem em relação ao trabalho, mas elas não podem ser responsáveis por atitudes e opiniões pessoais que seus colaboradores tenham. Devem sim cuidar para alertar e ajustar cada manifestação pessoal que não esteja alinhada com os princípios e valores da empresa. Na Globo, não são atitudes isoladas. Aliás, é uma postura que já temos há muito tempo, pelo entendimento de sermos uma empresa que fala com milhões de pessoas diariamente. É preciso acompanhar e prestar atenção constantemente a essas manifestações para que elas nos conduzam para onde estão os nossos princípios e valores. E uma das formas mais efetivas de fazer isso é estar o tempo inteiro comunicando ao seu time, ao seu quadro de colaboradores, quais são esses princípios e valores, que, temos certeza, são compartilhados por quase todas as pessoas que aqui trabalham. Entendemos que são princípios e valores que a sociedade também segue. Assim, na realidade, a gente tem uma responsabilidade de difundir o assunto, interna e externamente, e também de fiscalizar. E tanto entendemos que é nossa responsabilidade que, como Grupo, temos uma estrutura de compliance, de ouvidoria, extremamente efetiva e atuante.
M&M: A campanha contra o assédio feita pelas funcionárias da emissora foi endossada pela Globo e ganhou visibilidade na programação e também nas redes sociais. Por que razão a emissora optou por apoiar essa campanha após o episódio envolvendo o ator?
Valente: Primeiro, uma pequena correção: essa campanha não é originária das atrizes da Globo. É uma campanha que existe há algum tempo e que preconiza valores de comportamento coletivo e de defesa coletiva de direitos. Na verdade, nós apoiamos qualquer iniciativa que esteja alinhada com nossos princípios e valores. Não à toa, tantas ONGs, tantas instituições veiculam nos intervalos da Globo, em um espaço que é aberto pela empresa de maneira pro-bono (gratuita) exatamente para a divulgação de mensagens que estão alinhadas ao que acreditamos, porque representam uma melhora na sociedade. Apoiamos sempre que percebemos que há essa identificação. No caso, o ‘Mexeu com uma, mexeu com todas’ tem total aderência ao que a gente acredita, seja no objeto principal da luta contra o assédio, que deve sim ser incentivada, seja no que tange o comportamento inclusivo, do respeito à diversidade e às pessoas, algo extremamente necessário na sociedade. Tanto é que nós mesmos, na Globo, iniciamos uma campanha de valorização do Respeito, em agosto do ano passado, e que já foi para o futebol, para direito da mulher, para a F1, e que vai nos acompanhar sempre porque efetivamente acreditamos que a sociedade merece uma mobilização em torno de uma frase que é ‘Tudo Começa pelo Respeito’, que batiza a campanha. Afinal, quando você tem respeito não há espaço para vários dos males sociais que sofremos hoje em dia.
M&M: Houve algum receio, por parte da Comunicação, de a emissora ser considerada oportunista ao levantar essa bandeira após os acontecimentos?
Valente: O cuidado tem que ser eterno. Você nunca pode deixar uma oportunidade virar oportunismo. E oportunismo, pra mim, é muito bem representado em uma expressão em inglês, a ‘Green Wash’, que é quando você faz um projeto da boca pra fora, tem um comportamento green somente para dar uma ‘limpada’ na marca. Quando a ação é verdadeira, séria, consistente, histórica, não há oportunismo
algum. O que acontece é que sempre precisamos acompanhar os movimentos do mundo para identificar oportunidades que sejam pertinentes para divulgar princípios e valores que colaboram com a melhoria da sociedade, desde que sejam princípios e valores em que você efetivamente acredita. E acreditar não é simplesmente dizer. É sentir. É colocar isso em todas as suas atitudes ao longo do tempo. Por isso, fico muito tranquilo de apoiar qualquer iniciativa de respeito porque nós falamos sobre isso há muito tempo. Não estou falando só da campanha, mas sim de tudo que já fizemos nesses 50 anos, mostrando muitas vezes que temos atitudes de respeito quando divulgamos iniciativas de ONGs, quando inserimos em nosso conteúdo comportamentos que são socialmente importantes, como incentivo à educação, doação de órgãos ou repúdio à violência contra a mulher, que já foram tema de novela, entre outros. Esse incentivo à melhoria da sociedade é uma realidade na Globo e por isso temos muita tranquilidade em lidar com isso e saber que nosso comportamento não é oportunista, mas sim oportuno.M&M: No caso do BBB, a emissora foi, inicialmente, muito criticada por ter demorado a tomar uma atitude em relação ao participante. Essa intensa mobilização das redes sociais exige iniciativas e providencias mais rápidas? Como que o buzz da internet pauta as ações de comunicação em situações de crise?
Valente: A Globo sempre ouve o público, mas precisa atuar com responsabilidade. Decisões corretas nem sempre são populares. Basta recordar que, na noite anterior à expulsão, quanso as redes já estavam se manifestando, Marcos estava no paredão com Marinalva e o público teve a oportunidade de eliminá-lo. No entanto, a eliminada foi Marinalva, com 77% dos votos. Precisamos reforçar que, desde o primeiro momento, desde a discussão do casal na madrugada de domingo, a Globo agiu firmemente, incansavelmente. Envolvemos e ouvimos advogados, especialistas, psicólogos, conversamos muito para tomar uma decisão correta, uma decisão justa. Quando ficaram comprovados indícios de agressão física, a decisão foi tomada e Marcos foi expulso do BBB17 na segunda-feira. Pois, de acordo com as regras do programa, agressão gera expulsão. Agressões não são aceitáveis nem no programa nem fora dele. Tem um princípio que eu considero muito, e adoro ver que a Globo respeita muito, que é a isenção. No jornalismo, é ouvir os dois lados. Isenção corporativa é pesar os dois lados para tomar uma decisão correta. Há ainda outro princípio do jornalismo da Globo que vale como exemplo de comportamento corporativamente positivo, que é a transparência. Você não tem que ter medo de mostrar que vai usar o tempo que for necessário para tomar a atitude correta. Precipitação pode levar a erros que devemos evitar em uma emissora de televisão tão abrangente quando a Globo, que chega a 99% dos lugares desse país, que fala com 100 milhões de pessoas diariamente. É claro que todos cometemos erros e que sim, estamos suscetíveis a eles também na Globo, mas precisamos estar atentos. E estamos. Foi isso que fizemos nesse caso e em tantos outros casos pelos quais já passamos.
M&M: É natural que, após esses episódios, qualquer tipo de conteúdo que a Globo exibir em relação a casos de assédio ou a representatividade da figura da mulher seja alvo de críticas e de comentários. Como a emissora pretende lidar com isso?
Valente: Devemos agir de acordo com o que acreditamos, com base nos nossos princípios e valores. Esta é a crença que nos norteia, seja em projetos de Comunicação, de Jornalismo, de Entretenimento ou Esporte. Nós temos essa responsabilidade, temos consciência da penetração que temos e, por isso, temos um enorme cuidado com tudo que fazemos e não somente com o que diz respeito a esses casos.
M&M: Os assuntos de violência contra a mulher, assédios e abusos ganharão mais espaço nas campanhas e na comunicação da emissora?
Valente: A gente já trabalha com esse tema há muito tempo. Lembro de uma campanha sobre violência contra a mulher que fizemos há três anos com a Lilia Cabral e que teve uma repercussão muito grande. Esse ano, já havíamos veiculado um filme, escrito por uma redatora da Globo, que traz um jeito brilhante de olhar para os direitos das mulheres. Enfim, nós já fazemos e vamos sim continuar fazendo porque identificamos que vivemos em uma sociedade que precisa ainda ser alertada para esse assunto. E essa não é uma atitude somente de Comunicação. O discurso do Tiago Leifert na expulsão do participante do BBB, inserido no conteúdo do programa, trouxe esse alerta, o quanto essas situações podem acontecer na vida real e o quanto as pessoas precisam refletir sobre isso e ficar atentas até para ajudar mulheres que também passam por situações difíceis e que, infelizmente, não conseguem enxergar características de agressão, o que é extremamente danoso para a sociedade. Assim, enquanto houver necessidade de campanhas para a conscientização dos direitos da mulher, nós as faremos.
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