14 de abril de 2020 - 13h16
(Crédito: Akindo/ iStock)
O mundo enfrenta uma crise sem precedentes. Uma doença altamente contagiosa, e que pode levar à morte principalmente os idosos, força grande parte da população do planeta a ficar em casa. Escolas, restaurantes, pequenas, médias e grandes empresas estão fechados. É praticamente certo que entraremos em uma recessão global que vai se estender por um tempo considerável. É hora de repensarmos as coisas como são. Algumas empresas neste momento estão alienadas, outras são oportunistas e estão tentando se aproveitar. Mas tem aquelas que querem de fato ajudar, que são responsáveis e entendem sua relevância nesse momento. A gente está nesse último caso e estamos muito empenhados. Congelamos os investimentos em publicidade. Não tem sentido querer vender algo agora, enquanto as pessoas estão preocupadas em sobreviver, em não ficar doentes. É a hora de estarmos próximo das pessoas de outras formas.
O cenário preocupa muito, mas em vez de abrir espaço para o pessimismo, é preciso entender o que está acontecendo e encontrar as soluções que farão com que as engrenagens voltem a rodar. E, para todos que trabalham com criatividade e comunicação, não é exagero afirmar que este momento é um divisor de águas.
Ao mesmo tempo em que autoridades, médicos e pesquisadores estão batalhando dia e noite para vencer a doença por meio de uma vacina ou de um tratamento eficaz, é necessário descobrir o remédio que vai tirar os negócios de um estado anêmico e impulsioná-los para uma trajetória pujante e dinâmica.
Em um recente Ted Talk, Bill Gates disse que “o efeito econômico disso é realmente dramático. Em nossa vida, isso nunca tinha acontecido com a economia. Mas trazer a economia de volta… isso é mais reversível do que trazer as pessoas de volta à vida. Então, vamos lidar com a dor na dimensão econômica — muita dor —, para minimizar a dor na dimensão de doenças e de mortes”.
Na área do marketing, esse medicamento já existe, mas é bem pouco receitado e utilizado, principalmente no Brasil. É o propósito. Esta crise evidencia algo que está tomando corpo há algum tempo: num futuro próximo, vão sobreviver apenas as marcas que consigam transmitir valores que se conectem com os anseios da sociedade.
O marketing emocional teve um importante papel na construção da imagem das marcas, mas é uma ferramenta que está ultrapassada. Porque, no imaginário das pessoas, as marcas estão se transformando em commodities, e só vão se sair bem aquelas que tiverem sucesso em associar o seu nome a um propósito.
Passou a época em que o consumidor era um elemento passivo na relação com as marcas. É uma via de mão dupla: ele tem aspirações e estão cada vez mais conscientes do que ocorre tanto na sua rua como do outro lado do mundo. E querem, exigem, que as marcas estejam ligadas nesse contexto.
Comunicação tem de ser autêntica e assertiva. Entender os desejos e as necessidades das pessoas e entregar o que elas esperam.
Tenho muito carinho e admiração pelo que foi feito na época de ouro da publicidade, entre os anos 1960 e o final dos anos 1990. Porque eram dias em que pipocavam ideias originais, e elas se colocavam como o principal condutor de campanhas que iam ao encontro das aspirações daqueles tempos. A criatividade construía a conexão entre o produto e o consumidor. O David Ogilvy não disse “Se não vende, não é criativo” à toa.
Hoje, mais do que nunca, a criatividade tornou-se um bem de primeira necessidade. Sem ela, não há inovação e nenhum produto vai vender. Em um estudo chamado Future of Jobs, feito pelo Fórum Econômico Mundial, a criatividade foi citada como uma das três habilidades mais importantes para os trabalhadores do futuro. As outras: pensamento crítico e a capacidade de resolver problemas complexos. O estudo afirma que 85% dos empregos que existirão em 2030 ainda não foram inventados. Portanto, se hoje a criatividade já é importante para qualquer profissional da comunicação, em poucos anos ela será fundamental até para a sobrevivência.
Uma das melhores análises a respeito de como uma mente criativa pode impactar os negócios está em Originais: Como os Inconformistas Mudam o Mundo, livro do professor e pesquisador Adam Grant. A partir de vários estudos e de histórias reais, Grant mostra como as ideias originais surgem muitas vezes de situações e momentos inusitados e como a criatividade pode ser estimulada e desenvolvida. Assim, pode-se derrubar barreiras, medos e preconceitos. Aprendendo com o passado, mas olhando para o futuro.
Esta crise nos coloca diante do maior desafio que já enfrentamos. E ela aparece no momento em que há uma mudança de conceitos, de hábitos e do que as pessoas esperam das empresas. Para atingir essas expectativas (e não morrer na praia), é necessário definir quais são os valores de cada marca e comunicálos com espontaneidade e legitimidade. Criar uma relação que seja verdadeira, orgânica, duradoura. As agências têm de estar atentas a essa mudança de paradigma e, a partir daí, o vínculo com os anunciantes vai se fortalecer e gerar resultados consistentes e perenes.
Este período inédito e turbulento vai passar. Mas para todos nós sairmos realmente fortalecidos, é preciso que a criatividade esteja direcionada para um alvo: o propósito.
*Crédito da foto no topo: Pixabay