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Opinião

Inclusão racial na propaganda: estamos presos a uma resposta?

Quando acreditamos que há apenas uma única forma de resolver um problema, deixamos de abrir os olhos para possibilidades


15 de junho de 2020 - 10h36

(Crédito: Thaís Silva/ blackcollage.com.br @blackcollage_)

Outro dia, estava ouvindo a Chimamanda Adichie falando, já há muitos anos, sobre o perigo de uma história única. Já ouvi e li o texto algumas vezes, mas da última vez que li – daí a beleza de reler um texto -, imediatamente surgiu um paralelo na minha cabeça: o problema de uma resposta única.

Quando acreditamos que há apenas uma única forma de resolver um problema, deixamos de abrir os olhos para possibilidades. Não enxergamos alternativas. Ficamos presos a essa uma, única solução, esperando que ela aconteça. Rejeitamos novas respostas que aparecem, somos incapazes de ouvir argumentos. Nos tornamos cegos.

Tenho visto um movimento nesse sentido quando tratamos do mercado de comunicação. É evidente que o mercado de comunicação brasileiro precisa resolver o quanto antes a questão da inclusão racial. E, tão evidente quanto o problema, é a resposta – ou a forma de resolver este problema: é preciso que profissionais negros atuem nesse mercado. No dia em que houver igualdade entre brancos e negros no nosso mercado, certamente muitas campanhas racistas serão evitadas, e certamente os negros passarão a ser representados. Não há dúvida quanto a isso. Isso é indiscutível, inquestionável e parece ser a única solução definitiva. É a forma de resolver a raiz do problema – e não só isso: trata-se de justiça social.

Mas seria essa a única forma de resolver esse grave problema? Ou indo além, pensar em outras respostas para essa falha gravíssima da indústria de comunicação brasileira – que não sabe se comunicar com metade dos brasileiros – seria uma forma de impedir ou prejudicar o ingresso de profissionais negros no mercado? Ou o contrário, novas respostas poderiam ajudar a acelerar o processo?

Temos visto que muitas empresas, sejam agências, anunciantes ou veículos, têm comitês de diversidade, dão entrevistas falando a respeito da importância da pluralidade, mas ainda assim é muito difícil encontrar profissionais negros. Segundo o Instituto Ethos, seguindo o ritmo atual, levaríamos cerca de 150 anos para atingir uma igualdade racial no mercado de trabalho.

Dado que esta inserção de profissionais negros tem sido muito lenta, o que fazer? Vamos ficar sentados esperando o próximo século chegar? Não é possível esperar.

Vejo que muitos estão empenhados em acelerar esse processo. Mas acredito também que existe uma outra resposta. Um outro caminho. Um caminho que não exclui o primeiro. Um caminho que se soma a este.

Se, da noite para o dia, não é possível acordar numa agência onde metade da criação é preta, ou numa empresa onde o vice-presidente de marketing e metade de sua equipe é preta, é possível sim começarmos imediatamente a fazer propaganda que considere e dialogue com 56% dos brasileiros. Basta a gente começar a pensar em cor como fator determinante na hora de pensar em qualquer campanha.

O que quero dizer com isso? Você não vai fazer nada sem saber se está falando com mulheres ou com homens, com jovens ou com mães. Vender um chocolate para um idoso é completamente diferente de vender um chocolate para um adolescente. Despertar o desejo de um perfil é diferente de despertar o desejo de outro. Usamos e adaptamos a linguagem, o humor, o casting, a trilha – e evidentemente, a ideia… E se podemos fazer isso, é porque buscamos informação e conhecimento profundo sobre nosso target. Mas não nos damos conta de que nosso target não é apenas branco.

Até que a igualdade racial seja uma realidade, é importante que o mercado de comunicação se conscientize de que devemos começar a fazer propaganda para negros e não apenas com negros.

O interessante dessa alternativa é que ela não precisa de anos para se concretizar. Ela pode mudar imediatamente. Havendo vontade, isso pode começar a valer agora, na próxima campanha. A pergunta que fica é: Sua empresa de fato se preocupa com a inclusão racial? Se importa de fato, a ponto de arregaçar as mangas e começar a mudar a maneira de definir o target, de fazer pesquisa, briefing, escolher agências? Ou apenas adota um discurso de diversidade e inclusão? Essa é a hora em que se separa o joio do trigo.

*Crédito da foto no topo: Thaís Silva/ blackcollage.com.br @blackcollage_

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