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A liberdade da internet está chegando ao fim?

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A liberdade da internet está chegando ao fim?

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A liberdade depende do provimento de acesso, cujo custo pode se tornar inviável.
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28 de abril de 2016 - 16h23

Por Pyr Marcondes

A ideia mais original da internet é sua própria liberdade. Nascida como universo de todos e para todos, assim evoluiu até hoje. Mas faz já alguns anos discute-se a net neutrality, um tema visceral e central para a própria evolução da internet como um todo, em todo o mundo.

No âmago dessa questão está a aparente incompatibilidade entre o acesso e uso irrestrito da internet e a capacidade de gestão das companhias que promovem e detém o acesso à rede.

O tema voltou ao noticiário no Brasil, semana passada, após a Vivo ter sinalizado com a cobrança diferenciada por volume de uso para a banda larga fixa, algo que já ocorre na banda larga móvel. Ou seja, quem usar mais, vai pagar mais. A lógica é simples: banda larga não é um recurso infinito e a finitude está na base da lei da oferta e da procura. Bens escassos custam mais. No caso da banda larga, alega-se, há ainda o risco de eventual colapso do sistema, por overload de dados. O que, na teoria, inviabilizaria a rede como um todo. Não a da Vivo, mas de toda a internet mundial.

Pode até ser que haja uma dose de alarmismo nisso, mas há também um arrazoado empresarial e de negócios que não pode ser simplesmente desprezado.

No celular, pagamos mais quando consumimos mais. Ou então temos a velocidade e a qualidade dos serviços reduzidos quando extrapolamos os limites contratados. É a lógica da escassez, comercialmente expressa.

No meio desse conflito, temos a tarefa essencial dos órgãos reguladores do Governo, que é a de coibir abusos e colocar alguma ordem no tabuleiro dos interesses privados.

Então, resumindo, temos, de um lado, as corporações; de outro, a sociedade de usuários e cidadãos; no meio, arbitrando as contrapartes, o aparato legal (o Marco Regulatório da Internet) e de gestão do Estado. O antagonismo entre todos esses lados da equação não é necessário, mas tem sido, nesta questão, irremediavelmente habitual.

A Anatel cumpriu seu papel, no caso da Vivo, condicionando a operadora a manter o uso da banda larga fixa aberto e sem limitações a seus usuários.

Mas isso é sustentável no tempo? Difícil imaginar que sim.

O consumo de banda só vai crescer exponencialmente no Brasil e em todo o mundo. Dados e atividades como jogos online e vídeos são devoradores de banda e a conectividade promovida pela ampliação da base instalada de celulares só vai fazer esse consumo aumentar ainda mais.

As operadoras alegam que para investir na infra-estrutura necessária para fazer frente a tal demanda, aparentemente sem fim, só mesmo cobrando taxas diferenciadas para os que consumirem além de determinados parâmetros.

Faz todo sentido. Só tem um probleminha aí: esse é o fim da internet livre.

No trade-off, seguindo-se essa lógica, perde toda a sociedade, em nome da sustentabilidade tecnológica e comercial dos provedores privados, que por sua vez, são exatamente aqueles que sustentam a malha de acesso à internet livre, ampla, geral e irrestrita. É uma contradição de essência: só há internet, se houver provimento de acesso e o provimento de acesso é um bem finito. Onde fica a liberdade?

A internet nasceu como uma estrutura de código aberto e colaborativo, não proprietário. Foi graças a essa concepção original que ela se viabilizou até hoje. Foi sobre essa lógica que se instalaram os provedores e operadoras, que sentaram na janelinha, cobrando por seus serviços. Até porque, de graça, não ia rolar.

Há, como fica claro, um conflito não só de interesses, mas de conceito e de lógica na base do próprio sistema. A conclusão por observação é a de que um elo foi perdido na cadeia evolutiva.

Um dia, lá atrás, foi inevitável que empresas da iniciativa privada se transformassem em viabilizadoras de um serviço que, na sua origem e em sua essência, deveria ser público para poder ser eternamente livre. Nesse ponto, um nó foi atado e não estamos sabendo como desatar agora.

A defesa da ideia da net neutrality, ou seja, de que não há diferença essencial de valor entre os dados que trafegam na internet, o conceito de que a internet deve ser neutra, tem como finalidade assegurar que não apenas dados de maior interesse comercial tenham privilégios. A tese defende a integralidade de tráfego para dados de baixo ou nenhum interesse comercial, como educação, cultura e conhecimento, assim como a simples e cotidiana troca de dados entre usuários.

Pois sendo essa a equação, não há qualquer hipótese do conflito se resolver nem de forma espontânea, nem através de marcos regulatórios, ou ainda de ações pontuais das agências governamentais. O conflito está e estará instalado daqui para frente.

Há, claro, em andamento hoje em todo o mundo, inúmeros projetos de bypass tecnológico dessa questão. Há a possibilidade de mudança do protocolo TCP, que foi criado há décadas para uma internet sem esse problema de overload, um formato, segundo técnicos, extremamente ineficiente, por exemplo, para o tráfego de dados no ambiente mobile. Há também estudos de incremento da eficiência na interconexão entre os grandes backbones hoje já existentes no Planeta. Há estudos de macro-expansão do wi-fi. Até células humanas estão sendo testadas como transmissores e conectores para o tráfego de dados. Imagine.

E há, claro, a possibilidade de ampliação da infra-estrutura existente, mas aí voltamos ao início da questão: só com investimentos das operadoras de telecom.

Fato é que o problema de overload bate a nossa porta. Em 2019, estima-se, a continuar a expansão no uso da banda e na geração de dados em todo o mundo, estaríamos enfrentando o crack de todo o sistema. Nem dados mais caros trafegariam. É uma hipótese em questão. Alarmista? Não sei dizer.

Em 2007, estudo semelhante realizado pelo Nemertes Research Group chegou a mesma conclusão. E previu que o sistema todo quebraria em 2010. Aparentemente, se você está me lendo na web, não quebrou.

A torcida em todo o mundo, mesmo da parte das operadoras de dados, é grande para que alguma dessas soluções seja aquela milagrosa que afaste para sempre das nossas vidas o problema gerado pela superprodução e hiper-tráfego de dados na internet. É de se esperar que alguma solução tecnológica venha, finalmente, nos resgatar.

Mas não agora.

É triste, mas é bastante possível que estejamos diante do fim da internet livre. Esperemos que não da internet como um todo.

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