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Tudo indica que Cannes deve mudar. Mas para ser o quê?

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Blog do Pyr

Tudo indica que Cannes deve mudar. Mas para ser o quê?

Há uns 5 anos, no evento MIXX, em Nova Iorque, eu sentadinho ali na primeira fila da plateia, vi o próprio Sorrell afirmar que o negócio da nossa indústria havia mudado e que ele é hoje um negócio de tecnologia e dados, a serviço da excelência financeira, do ROI, da última linha dos clientes e das próprias agências. Foi ele quem disse, ok?


26 de junho de 2017 - 6h40

Falo aqui de carteirinha, porque ajudo o Grupo M&M a realizar seus eventos há anos e sei o tamanho do pepino que é mudar o rumo e o conceito de um evento. É um problema que faz parte da planilha dos organizadores sempre. Quem mandou se meter nessa, não é mesmo?

Pois bem, Cannes enfrenta, na minha opinião não de hoje, a necessidade de se reinventar. Os organizadores reconheceram isso, agora publicamente, e convocaram um conselho para buscar alternativas.

Mas o que deveria vir a ser o novo Festival de Cannes?

Martin Sorrell, do WPP, deu lá seus pitacos. Ele acha que o evento deve mudar de local (só para registro, acho essa ideia uma bobagem e não vou portanto nem perder tempo com ela aqui) e que deve estar mais em linha com a situação dos negócios da indústria de hoje em dia.

Há, numa primeira instância, uma preocupação financeira. Ele reconhece a inegável relevância de Cannes, mas sinaliza que ficou pesado bancar o jogo nas dimensões que o evento assumiu.

Arthur Sadoun, do Grupo Publicis, na mesma linha, foi lá e chutou o baldão. Não deixou dúvida de que esse é de fato o problema e que, por conta disso, vai boicotar o evento 100% ano que vem. Aliás, não só Cannes, como também todos os demais festivais. Segundo disse, para economizar e investir mais em tecnologia digital (volto a isso logo adiante).

Mas o que acho de fato relevante observar e considerar nas declarações do homem mais poderoso da nossa indústria, falo de Sorrell (ou seriam Sergey Brin e Larry Page?), foi sua observação de que o evento tem que ir em busca de se reinventar diante das transformações pelas quais passa o setor. E citou textualmente a presença de grandes players de tecnologia e de consultoria numa cena em que antes só existiam empresas clássicas de comunicação, com um ecossistema conhecido e dominado a sua volta.

Os organizadores do evento vêm tentando há anos fazer isso. E a forma que encontraram é brilhante, notadamente para quem precisa aumentar suas fontes de receita: aumentar também o número de categorias.

Digital se sofisticou? Tasca lá umas 10 novas categorias que reconheçam a abriguem essas mudanças e vamo que vamo.

Quer saber, acho que eles estão (ou pelo menos estiveram até aqui) certinhos. Endereçaram os anseios de mudança de quem frequenta o evento em busca de se referenciar diante das mudanças de mercado e das evoluções em curso. Criatividade no centro. Da sua forma, eles entregaram isso.

E do ponto de vista do caixa, aí então maravilha. Mais categorias, mais inscrições. Bottom line azulzão, com uma linha de custo que não deve ter crescido lá tanto assim. As margens devem ter se mantido bem gordinhas esses anos todos, suponho.

Mas tem duas coisas aí, que explodiram inexoravelmente este ano na cara de todos: o jogo ficou caro demais com tantas categorias para quem paga a conta. Eles se esqueceram, portanto, de combinar com os russos.

E mais: mesmo incorporando novas categorias, o evento não parece mais refletir a complexidade da indústria. A formula parece ter chegado a seu limite. No mínimo, pelo seguinte … levando em conta o fato de que a realidade só vai se sofisticar e ficar mais complexa daqui para frente, como é que fica ? O evento vai seguir criando infinitamente novas categorias para acomodar os novos avanços?

Não rola. Talvez seja preciso olhar diferente para tudo isso.

Sadoun vai em busca de mais tecnologia. Sorrell sinaliza que a chegada de grandes players de tecnologia e de consultoria transformaram a indústria num setor diferenciado. Também acho. E aí talvez haja um campo possível de mudanças.

Há uns 5 anos, no evento MIXX, em Nova Iorque, eu sentadinho ali na primeira fila da plateia, vi o próprio Sorrell afirmar que o negócio da nossa indústria havia mudado e que ele é hoje um negócio de tecnologia e dados, a serviço da excelência financeira, do ROI, da última linha dos clientes e das próprias agências. Uma indústria de tecnologia e finanças, portanto. Foi ele quem disse, ok? Não fui eu.

Acho que é no que ele continua acreditando hoje.

Certamente é no que acreditam empresas como Google, Facebook, Microsoft, IBM, Accenture, McKinsey, só para ficar com as que ele mesmo citou, hoje todas do nosso setor (de minha própria autoria, eu acrescentaria Netflix, Amazon e todas as telecoms, isso para não me estender muito mais).

Essa passou a ser a nova lógica de impulsionamento dos negócios da nossa indústria e o evento, que hoje se realiza em Cannes e que chamamos de Festival de Cannes, talvez tenha que mudar também seu olhar diante dessa nova realidade. Não apenas acrescentando novas categorias, mas transformando-se num evento que, além da criatividade, possa eventualmente refletir e representar de fato os reais destinos dos negócios do setor.

Nunca foi essa, falar de tecnologia e negócios, a proposta do Festival, que nasceu há 64 anos em Veneza (e não na França, como disse Sorrell). Seu objetivo foi sempre e segue sendo celebrar a excelência da criatividade. Na época, exclusivamente das peças de cine-publicidade. Hoje, de todo o resto.

Começou a arranhar essa questão de negócios quando incorporou mais recentemente prêmios que reconhecem a eficácia e os resultados da comunicação. Mas, quem sabe, talvez tenha sido tímida essa solução. A ver.

Fato: os organizadores têm um pepinaço nas mãos. Precisam se reciclar, talvez como nunca tenham se reciclado antes nestas mais de seis décadas. O evento mudou de mãos algumas vezes. O grupo que controla Cannes hoje é um grupo de investimentos, não necessariamente do nosso setor. E isso pode ser bom ou ruim para o desafio, vamos ter que acompanhar.

Torço para que tenham sucesso, porque precisamos de um evento como o de Cannes na indústria, internacionalmente falando.

Que os Leões alados que simbolizam o evento (inspirados nos da Piaza San Marco, de Veneza, para quem não sabe) tragam em suas asas as soluções que Cannes tanto precisa.

Mas intuo que isso passa por brigar mais de frente com SXSW, CES, MWC, DMEXCO e tantos outros eventos que definitivamente encaram de frente e acolhem a tecnologia e os avanços das novas ciências do marketing e da comunicação digital como as premissas inexoráveis dos negócios da nossa indústria. Hoje, e cada vez mais no futuro. ROI como pano de fundo.

E a criatividade? Pois a criatividade tem papel definitivo em tudo isso. Sem ela, nossa indústria inexiste. Vira outra coisa. Criatividade vai junto nessa. No papel de protagonismo que sempre teve. E seguirá tendo.

 

 

 

 

 

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