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Fim do consumismo: quem enjoou de comprar?

Marcas devem estar atentas às novas ondas, sem esquecer a escala, o tamanho e o impacto que terão nos negócios

e Michel Alcoforado
27 de abril de 2016 - 12h46

uber_screenshot_300Chamei um Uber. Carlos, o motorista, era torneiro mecânico em uma montadora de veículos no ABC paulista. A nova profissão era a sua aposta para pagar as contas e sustentar a família. Fui logo lhe perguntando a quem atribuía as causas da crise no setor automobilístico.

– Olha moço… Eu perdi meu emprego porque não se vende mais carro como antigamente. Se não vende, não tem porque produzir. Se não produz, não tem porque me empregar. Simples assim. Por que não “tão” comprando carro? Não é só culpa da crise. Estamos com dois problemas ao mesmo tempo: de um lado, os meninos novos começaram a perceber que não precisam mais de carro. Não ”tão” comprando mais. Por outro lado, quem sempre teve sonho em ter as coisas, agora, “tá” endividado e não “tá” podendo comprar. Juntou quem “tá” enjoado de comprar com quem não tem dinheiro pra comprar. Não sobrou ninguém. Deu nisso. Eu sou do povo da crise. Estou enjoado de comprar nada não. (risos)

Carlos entrou para o Uber não por acreditar que o futuro do mundo será a economia colaborativa, tampouco por achar que sentiremos vergonha da maneira como grande parte da população consome atualmente. Suas escolhas estavam longe do Lowsumerism. Inscreveu-se na empresa por necessidade de pagar suas contas, diante do desemprego. O motorista é mais um número dentro das estatísticas da empresa norte-americana. Acredita-se que, em 2016, na crise, o Uber receba 50 mil novos motoristas, um crescimento de 30% ao ano, o que torna o Brasil o País com as melhores perspectivas entre os países nos quais a empresa opera.

Segundo dados da empresa, 54% dos condutores estariam procurando emprego se não fosse a nova plataforma, à qual 30% recorreram após serem demitidos. Enfim, boa parte dos colaboradores do serviço o faz por necessidade, não por acreditar nas benesses da economia colaborativa. Por outro lado, os consumidores também não recorrem ao serviço porque veem uma alternativa mais alinhada com as tendências da economia compartilhada, mas sim porque encontram uma alternativa ao monopólio dos taxistas que prestam péssimos serviços e cobram preços abusivos.

É preciso colocar os pingos nos is e entender que o consumo colaborativo não é a nova moda; todos nós temos, ou teremos, que nos agarrar em algo para sobreviver no novo mundo. É óbvio e ululante que não poderemos consumir como a sociedade americana. Nem há planeta suficiente para isso. Mas, também, vivemos em um país onde há um exército de pessoas que entraram no mundo do consumo agora. Há muita gente buscando ainda o básico e sofrendo para bancar o mínimo diante do temeroso cenário de recessão que enfrentaremos. Não temo em afirmar que, por muito tempo, nós teremos mais que nos preocupar em como conjugar as necessidades dos novos clientes com os limites do planeta do que com os enjoados de comprar.

As marcas precisam estar sempre atentas às novas ondas, sem jamais esquecer a escala, o tamanho e o impacto que terão em nossos negócios. Sem isso, tudo não deixará de ser mais um blábláblá.

Afinal, o Brasil não é a Vila Madalena e Vila Madalena não é o Brasil.

(*) Michel Alcoforado é sócio fundador da Consumoteca

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