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O iPhone de dois quilos (que nunca existiu)
Por que não temos um iPhone de dois quilos neste mundo? Simples: porque nessa dimensão do universo, a Apple decidiu que, antes de pensar no seu negócio, irá pensar nos seus usuários.
Por que não temos um iPhone de dois quilos neste mundo? Simples: porque nessa dimensão do universo, a Apple decidiu que, antes de pensar no seu negócio, irá pensar nos seus usuários.
6 de julho de 2015 - 2h07
(*) Por Marcos Del Valle
Imaginem a seguinte cena: o diretor da área de celulares da Apple chega para seus engenheiros e apresenta o desafio: “Como podemos manter as mesmas funcionalidades que temos no iPhone e, ao mesmo tempo, diminuir o custo de produção pela metade?” O velho dilema do bom, bonito e barato que todo engenheiro deve enfrentar diariamente. Após muitos cálculos, discussões, pizzas e noites em branco, os engenheiros apresentam a solução que irá, de um dia para o outro, multiplicar por dois os lucros da Apple no mundo.
A solução: um iPhone com uma bateria infinitamente mais barata e com o dobro do tempo de uso da antiga. O único detalhe que as diferencia é que a nova bateria pesa dois quilos (mas, imaginem os lucros!).
Por que não temos um iPhone de dois quilos neste mundo? Simples: porque nessa dimensão do universo, a Apple decidiu que, antes de pensar no seu negócio, irá pensar nos seus usuários. Parece ser uma decisão bastante lógica e coerente, não é? Então, por que não vemos essa mesma filosofia aplicada nas principais interfaces que permeiam o dia a dia digital? Exemplos não irão faltar (fiquem à vontade para incluir os seus nos comentários). Porém, vou começar com os mais básicos (e, infelizmente, os mais comuns):
Intervenção para capturar cadastro de e-mail em e-commerce
Nada como estar à procura do seu sapato favorito e ser impactado por uma intervenção enorme pedindo para você cadastrar seu e-mail para receber “novidades, promoções e descontos exclusivos”. Imagino que, algum belo dia, alguém deve ter olhado para o funil de conversão dessas lojas virtuais e ter dito “minha taxa de conversão é de 1%, como posso fazer para conseguir mais clientes sem dar nada em troca?” (vide celular de dois quilos…). Eis que nasceu o famoso lightbox de newsletter. Chato, feio, inoportuno. Mas, pelo menos, está gerando cadastros qualificados!.
200 mil campos no formulário de cadastro
Esse é outro exemplo que sempre me deixa muito feliz. Deve ter nascido numa conversa entre alguém da área de CRM e o gestor do site.
– “Como podemos melhorar o desempenho das nossas campanhas de e-mail marketing através de uma estratégia de microsegmentação de perfil?”.
– “200 MIL CAMPOS NO FORMULÁRIO DE CADASTRO! EUREKA!”.
– “Metade dos usuários vão desistir da compra, mas, pelo menos, vamos conseguir saber qual é a cor favorita dos que comprarem!”.
Visto que o sucesso da Apple confirma a necessidade de colocar a experiência do usuário em primeiro lugar, o que devemos fazer para melhorar a construção dos sites brasileiros? Parte da resposta, acredito, está na criação ou formalização de um cargo que deveria existir em qualquer empresa que lida com usuários: o product owner (PO), que representa os stakeholders do projeto e é a voz do consumidor. É responsável por garantir que a equipe entregue valor para o negócio. O PO escreve demandas que são centradas no cliente (customer-centric), as prioriza e as adiciona ao backlog do produto (fonte Wikipédia).
Tenho visto que essa função, normalmente, é diluída entre diferentes áreas do ciclo de desenvolvimento de um produto digital. Algumas vezes, o PO é o desenvolvedor, o arquiteto de informação ou o próprio gestor da área de negócios. O que acontece é que essas pessoas têm interesses conflitantes com a experiência dos usuários. Por exemplo, o desenvolvedor pode estar mais interessado em conseguir terminar seu backlog de tarefas do que questionar o motivo por trás das funcionalidades solicitadas. O gestor da área de negócios é o pior PO, pois sempre terá a pressão de ter que vender mais e, como vimos acima, isso nem sempre se traduz em uma experiência bem pensada.
Tentem encontrar uma pessoa que tenha uma boa base de negócios, mas que consiga se colocar nos sapatos do consumidor. O PO deverá sempre ter a última palavra, não importa o quanto isso fira as hipóteses mirabolantes das áreas comerciais. Deverá passar metade do dia navegando no site e a outra metade interagindo com usuários. Mais do que pensar grande, deverá tentar enxergar os pormenores que possam impactar o usuário. Uma espécie de “ministério dos pequenos detalhes” que possa barrar solicitações de celulares de dois quilos e que revise até a última vírgula do texto do menor banner do site.
(*) Marcos Del Valle é sócio e diretor de comunicação e tecnologia da Jüssi
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