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Opinião

A sua cozinha é aberta?

A colaboração e a cocriação estão pedindo licença, principalmente no mercado publicitário, estereotipado pelo ego e falsa meritocracia


28 de outubro de 2021 - 6h00

Você prefere dividir com o time o que está fazendo durante o processo ou prefere dividir quando tudo está pronto?

Engana-se quem acha que terá protagonismo ou maior impacto profissional entregando o projeto ou sua parte finalizada para a equipe. Esse tempo passou. A colaboração e a cocriação estão pedindo licença, principalmente no mercado publicitário, estereotipado pelo ego e falsa meritocracia.

Aprendi duramente os benefícios de trabalhar de cozinha aberta, compartilhando o documento em WIP – work in progress. Mas esse passo nem sempre é fácil antes de algumas mudanças de mentalidade.

Na minha jornada profissional, sempre lidei com a síndrome do impostor e inferiorização em relação aos meus pares. Talvez por consequência de trabalhar com tantas pessoas talentosas em um ambiente que incentivava a competição. Mas isso é conversa para outro artigo. O que importa é que evoluí com velocidade, mas criei um fantasma na mesma proporção.

Tive a oportunidade de passar em outros lugares onde não tinha pares para gerar comparação e disputa. Nesse ambiente solo, percebi que não ter a troca, referências, era também muito ruim. Comecei a perceber a riqueza de conversar, compartilhar, trocar ideia, discutir caminhos e possibilidades com o outro. Não queria competição mas também não queria a jornada solitária do crescimento. Foi nesse ponto que comecei a entender os benefícios da cozinha aberta.

Começou devagar. Primeiro chamando o colega de trabalho de outro departamento para ouvir o meu pensamento. Depois, fui mostrando o trabalho inacabado. Por último, fui convidando para cocriar ainda na fase inicial. E, nesses babies steps, aprendi que existia muito mais prós do que contras nessa dinâmica de cozinha aberta.

Engana-se quem acha que terá protagonismo ou maior impacto profissional entregando o projeto ou sua parte finalizada para a equipe. Esse tempo passou (Créditos: Blue Planet Studio/shutterstock)

Hoje, ficam claros a mudança e o ganho profissional de trabalhar com a cozinha aberta. E o poder da vulnerabilidade! E quando a empresa incentiva esse mindset, o trabalho se torna mais íntegro, completo, assertivo, prazeroso com um ambiente de trabalho saudável e cheio de empatia. Compartilho algumas dicas e aprendizados sobre a cozinha aberta:

Implementando a cozinha aberta:

1. Convide as pessoas já no início do processo: de largada, já apresente para a equipe com quem você está trabalhando o que você está pensando, o que você está buscando entregar e as etapas do seu trabalho.

2. Deixe tudo on-line: por mais que tudo pareça caótico e desorganizado, compartilhe o seu documento com seus pares. Deixe claro no documento o que é final, o que é brainstorm, o que é gaveta, o que é lixo, o que vai ficar para depois etc. Você vai perceber que é simples guiar os “convidados” no seu documento.

3. Peça feedback constantes: esse ponto é fundamental. Essa estratégia fará a equipe olhar constantemente para o seu documento, ver a evolução e sugerir correção de rota se necessário. E, ao receber o feedback, evite defender demais seus pontos e apenas tente dizer: “obrigado por compartilhar, vou avaliar e ver o que posso fazer”.

Mentalidade para a cozinha aberta:

1. Não é nada pessoal. O primeiro passo é entender que, quando você deixa a cozinha aberta e convida as pessoas para olharem, as críticas e comentários são a respeito do projeto em si, não da sua capacidade ou talento profissional. Aqui a síndrome de impostor bate forte.

Inclusive nesse texto. Dividi com Marco Antônio, Head de Estratégia do Grupo Dreamers, em WIP, e recebi críticas construtivas que, em algum nível, aquela vozinha interior tentou levar totalmente para o pessoal. Mas, pera! Ele estava apenas emitindo uma opinião profissional sobre o meu texto para torná-lo melhor. É isso que precisamos fazer: eliminar as amarras da vozinha interior que nos limita de crescer ouvindo o próximo.

2. O foco é o projeto e não você. Quase repetindo o tópico anterior, é preciso ter o compromisso para ouvir, absorver e entender que as pessoas querem ajudar você a entregar algo melhor. E, sim, vão existir críticas ou perguntas em fase que você ainda não chegou. E tudo bem responder: “ainda não cheguei nessa parte, mas vou deixar isso em mente” ou “tinha pensado a mesma coisa, só não deu tempo”, mas “maravilha. Obrigado por compartilhar” faz parte.

Como estrategista, eu sofro bastante com isso. Muitas vezes, quando ainda estamos na fase de divergência e compartilhamos o material, é normal as pessoas descerem para convergência. E aí “fica parecendo” que eles encontraram a conclusão! Ooolha a vozinha ali!

Encare essa fase quase como uma oportunidade para entender como seus pares ou seu chefe pensam, além de ter um checkpoint de ajustes e melhorias quase que instantâneo.

3. Menos refação e aprovação. Uma vez que os pares, colegas de trabalho ou seu chefe estão na cozinha com você, seu projeto vai ser naturalmente aprovado ou no mínimo sofrerá menos ajustes, uma vez que todo mundo participou da construção.

4. Vulnerabilidade abre oportunidades. Por último, a cozinha aberta vai dar a oportunidade de outros entenderem como você pensa. Em um mundo BANI, depender do resultado final nem sempre é a resposta. Dar a oportunidade de as pessoas entenderem como você pensa, sua bagagem e referências de trabalho podem abrir mais oportunidades futuras do que um projeto com resultados.

Foi abrindo a cozinha que cheguei onde estou e foi abrindo a cozinha que tornei meu trabalho mais fácil.

Comunicação se faz com a cozinha aberta.
E aí? Vamos abrir a cozinha?

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