Pyr Marcondes
29 de julho de 2019 - 6h45
Que estamos todos sendo vigiados os últimos acontecimentos, aqui mesmo no Brasil, de invasão da privacidade pública de parte relevante dos gestores da República no País, são um exemplo mais do que emblemático. E obviamente preocupante.
Nesses casos, tivemos a privacidade de representantes públicos invadida e, algumas, expostas.
Quero, desde já, me posicionar sobre uma coisa aqui: a vida privada das pessoas públicas, naquilo que tange especificamente a sua atividade pública em si, tem que ser pública. Ponto.
Quer entender melhor meu (controverso, reconheço) ponto? As conversas do Moro com o Dallagnol sobre os casos em que estavam profissionalmente envolvidos devem, sim, ser públicas. Deveríamos poder ouvir, no limite, a conversa deles e de todos os representantes do poder público, em um aplicativo. Ao vivo. Em tempo real. Entendeu?
Radical? Sem duvida! Exagerado? Nem ferrando.
A transparência radical no âmbito público é a mais valiosa (acho, na verdade, que é a única) moeda intangível que nós, cidadãos, temos, para que os representantes e gestores do Poder Público não se encantem e ponham no bolso outras moedas. Bem Reais, se você me entendeu.
Esses caras são representantes da nossa cidadania. Tudo e simplesmente tudo que esteja diretamente vinculado às atividades que exercem têm que ser de domínio público. Não deveríamos precisar de hackers ou crakers para ter acesso a elas.
(Entendo as exceções de Segurança Nacional e das investigações sob sigilo em casos mais sensíveis a segurança pública, mas não vou entrar nesse meandro jurídico aqui porque não sou técnico e porque aí a discussão vai longe…)
Meu ponto principal aqui não é nada disso. Na verdade, é exatamente na outra ponta da cadeia: nossa própria vida privada. Essa tem que ser preservada ao limite. E aqui temos que ser igualmente radicais: nada, ABSOLUTAMENTE NADA, que eu e cada um de nós, cidadãos, civis, regular people, que não exercemos nenhuma função pública e não desejemos que seja público, NÃO PODE SER PÚBLICO. Nem acessado pelo Poder Público. Nem por ninguém.
Se, no âmbito privado, estivermos cometendo algum tipo de crime socialmente reconhecido e legalmente condenável, investigações conduzidas pelas normas jurídicas vigentes têm, obviamente, o direito de vir atrás de nós, nos pegar no pulo e, se juridicamente cabível, nos condenar. Porque aí estaremos, no ambiente privado protegido, infringindo regras socialmente pactuadas como prevalentes para a organização e gestão do que é público. A afronta a isso se chama crime.
Público, esclareçamos, é tudo que é da coletividade. Nomeamos instituições para exercerem a função de gestão da Coisa Pública para que zelem pela operacionalização das normas que regem institucionalmente as sociedades.
E aí, no exemplo criminoso acima, quando formos descobertos, teremos que pagar por isso. Por essa violação. Quem mandou!
É nisso que acredito.
A fantástica Inteligência Artificial, que pode e está sendo utilizada para uma série de avanços mega bem-vindos para o bem da sociedade como um todo, tem também, infelizmente – e você tem acompanhado certamente exemplos disso todos os dias – para o mal. Para a nossa vigilância em massa, por exemplo, sem que sequer saibamos disso.
A ótica do Estado, de que somos dados e personas identificáveis e estatisticamente controláveis não é, per se, equivocada. Reduzir seres humanos a data base geridos por AI tem suas vantagens indiscutíveis. Caramba, como é que teríamos as estatísticas de controle de uma epidemia de sarampo, por exemplo? E como o seu Manuel, dono da padaria ali da minha esquina (ele se chama Manuel, juro), poderia ser tratado como um indivíduo em meio a uma massa de indivíduos? Só com data. E só com a excelência cada vez mais acurada da AI.
Mas o problema disso é a falta de controle disso.
A Europa, ainda bem, começa a se manifestar contra o uso indevido da AI para esse fim escroto, do controle de todos nós. E começa, como fez pioneiramente com a regulação do uso indevido dos nossos dados privados via criação da GDPR, a criar arcabouços legais que regulem a AI para a vigilância em massa e a criação de social scores (como faz a China, que investiga e vigia todos os seus cidadãos e os classifica segundo um ranking – scores- de pessoas mais ou menos confiáveis aos olhares do Regime … 1984, George Orwell, Big Brother total…).
Pela exposição pública de tudo que é público! E pela privacidade radical de tudo que é privado!
Leia aqui um bom artigo do Tech Crunch sobre o tema. E se indigne contra qualquer tipo de vigilância pública não consentida. É seu Direito e de todas as sociedades que prezam a Liberdade.