Laura Esteves: “Quando um cliente pede uma liderança feminina, está mudando a cadeia inteira”
A nova VP de criação da DM9 fala sobre o novo momento da carreira, mulheres na liderança criativa e a importância do olhar diverso na área
Laura Esteves: “Quando um cliente pede uma liderança feminina, está mudando a cadeia inteira”
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Michelle Borborema
1 de fevereiro de 2023 - 12h42
“É difícil pensar numa fórmula criativa vencedora, porque ela vai ser boa esse ano, e no ano seguinte já vai ter sido percorrida, então estamos sempre em busca desse jeito novo de fazer. O processo criativo se desafia o tempo todo”, reflete Laura Esteves, nova VP de criação da DM9, ao pensar sobre as características de um bom trabalho na publicidade. A executiva, que se diz apaixonada e muito feliz pelo novo momento na carreira, acredita que a diversidade é crucial para trazer novos olhares ao mesmo produto ou serviço, e conta também sobre como acredita ter chegado à liderança feminina criativa como mulher.
“Alguém precisa acreditar que você pode e deve ocupar esse lugar. Isso é o que move o ponteiro. No momento em que uma cliente de uma conta grande, uma CMO, por exemplo, pede uma liderança feminina, ela está mudando uma cadeia inteira, porque é ela que está me dando uma oportunidade. São essas pessoas que estão realmente mudando nosso cenário no negócio”, diz Laura, que cita uma espécie de rede informal entre mulheres criativas. “Uma aponta para a outra, e isso tem sido muito produtivo.”
Laura ocupa um dos poucos cargos de liderança criativa feminina no Brasil e ao longo da premiada carreira teve a oportunidade de trabalhar em grandes agências, para clientes nacionais e internacionais. Após sua graduação, no início dos anos 2000, entrou na DM9DDB e foi selecionada para representar o Brasil no Young Creatives, sendo a participante feminina mais jovem do programa.
Depois de ganhar uma concorrência, foi convidada para juntar-se ao time da DDB New York, onde viveu por cinco anos e trabalhou ao lado de clientes como Budweiser, Unilever, Philips e Johnson & Johnson. No retorno ao Brasil, trabalhou em agências como VMLY&R, DPZ&T e mais recentemente na Galeria, antes de retornar à DM9, no dia 20 de janeiro, para atender clientes como Claro, Burger King, Vigor e Centauro.
Ao longo de sua carreira, conquistou 16 leões de Cannes e outros prêmios internacionais e locais. Foi selecionada várias vezes para julgar festivais internacionais e, atualmente, iniciou um programa na Harvard Business School para executivas seniores.
Confira abaixo a entrevista do Women to Watch com a nova executiva da DM9.
Você acabou de assumir o cargo de VP de Criação da DM9. Quais são seus maiores desafios na função?
Comecei minha carreira aqui, então esse retorno trouxe uma felicidade e um recado legal para mulheres e para o mercado, porque nossa profissão tem tetos de vidro. Tive muita felicidade de estar num lugar com uma oportunidade grande, e justamente a agência onde comecei. Sou de Belo Horizonte, então não sou do “mercado oficial”, e tive meu primeiro cargo em 2004. Eu estava há 4 anos na DM9, e tinha muita vontade de conhecer matriz da agência, que era em Nova York, e pedi para passar um mês de férias trabalhando lá. Eles me mandaram, e eu fiquei encantada com a cidade e com o escritório, e acabei ficando lá por cinco anos. Foi onde conheci o Ícaro, e sempre tive muita vontade de trabalhar com ele. Ele tem muita luz e uma paixão por criatividade. Foi muito generoso da parte dele ter pensado em mim no momento desse projeto, dessa nova fase da agência. Depois de alguns anos, ter oportunidade de voltar nessa nova fase, com novos clientes e uma nova equipe é uma grande alegria.
O que acha que a levou aos grandes cargos executivos de criação?
Há alguns pontos de suporte que são incríveis. São outras lideranças que nos dão apoio e oportunidade. Alguém precisa acreditar que você pode e deve ocupar esse lugar, tanto lideranças quanto pares. Isso é o que move o ponteiro. Clientes que acreditam em lideranças femininas. Tenho a sorte de ter clientes que valorizam, necessitam e pedem por isso. No momento em que uma cliente de uma conta grande, uma CMO, por exemplo, pede uma liderança feminina, ela está mudando uma cadeia inteira, porque é ela que está me dando uma oportunidade. São essas pessoas que estão realmente mudando nosso cenário no negócio. Há, então, líderes e clientes que pedem e solicitam isso. Há também a mídia, que nos dá luz e espaço para sermos consideradas, e, por fim, existe uma rede de suporte, de como uma ajuda a outra.
Existe algo muito bacana que acontece com muita frequência: no momento em que o mercado demanda, um líder acredita e uma cliente te indica, o que acontece muitas vezes é que vai aparecer a oportunidade para uma mulher, e ela pode não avançar nessa proposta, mas ela indica outra mulher. Então existe uma rede para manter essa vaga para outra mulher. Então uma aponta para outra, e isso tem sido muito produtivo. É quase algo informal, e o mais interessante é que sei exatamente quem me indicou, sabe? Me liga uma RH, por exemplo, e eu sei exatamente quem foi, sem ela precisar me contar. Então isso é uma rede de suporte de mulheres, entre profissionais não necessariamente amigas, mas pelo valor profissional das pessoas.
Qual é a sua relação com a criatividade?
Tenho momentos de repensar o que há de difícil em ser brasileiro, mas logo percebo que a criatividade sempre esteve e vai estar à nossa volta. Cada vez mais vemos talentos brasileiros fora do Brasil. Então, tenho paixão pelo que a gente faz. Mesmo em momentos mais difíceis da economia, diante de mudanças de relevância, quando se questiona o papel das agências, o que fazemos é incrível. Tenho sorte de estar num lugar em que a luz é sobre a criatividade, e isso me retoma no eixo e me leva para um lugar semelhante à paixão de quando começamos a trabalhar. É o fogo de quando você pensa sobre fazer isso no começo da faculdade. Estou vivendo essa mesma paixão, esse frio na barriga agora, uns bons anos depois, e isso é uma oportunidade muito grande.
As mulheres ainda são minoria na criação, mas elas têm ingressado cada vez mais na área. Do início da sua carreira pra cá, como analisa esse cenário e o que fazer para mudar essa realidade?
É um assunto em movimento. Quando era criativa, nunca me ocorreu que eu teria alguma dificuldade. Na verdade, eu sempre tive muitas oportunidades. Vim de outro mercado, mas sou uma mulher branca, fiz faculdade, tenho recorte social de muito privilégio, então nunca me coloquei num lugar desfavorável. Mas tenho plena consciência de que esse assunto ganhou muita relevância, e isso é maravilhoso, porque fez eu mesma refletir sobre um tema que antes, para mim, só era assim. Eu nunca tinha refletido sobre desvantagens ou vantagens por ser mulher, mas é inegável que existe um movimento muito construtivo de dar voz e espaço. Me beneficio e faço parte disso, e o mínimo que posso fazer é facilitar e estender essas oportunidades que passam por mim para que outras meninas que estejam começando tenham um caminho diferente ou mais fácil. Mas eu, individualmente, faço parte de algo muito privilegiado. Estou aqui paras próximas.
Hoje, o que você acha que configura um bom trabalho criativo na publicidade?
É difícil pensar numa fórmula vencedora, porque ela vai ser boa esse ano, e no ano seguinte já vai ter sido percorrida, então estamos sempre em busca desse jeito novo de fazer. O processo criativo se desafia o tempo todo. Acho que passamos por um momento de as marcas buscarem propósito, e isso também nos faz questionar o propósito de cada ideia, o que é fundamental. Ao mesmo tempo, também temos trabalhos que não deixam de ser mais ou menos criativos, mas cumprem um papel, seja de ser vendedor, de levar bom humor, ser informativo, ter argumentação, de posicionar um cliente em relação ao outro… Há muitas possibilidades para esse papel criativo. Estamos em tempos de buscar o propósito de cada marca, mas sempre me lembro de que todos outros papéis também têm muito valor.
Para você, por que é tão importante o olhar feminino na criação?
Estamos nesse movimento genuíno em muitos lugares. O olhar feminino tem várias coisas inspiradoras. O ambiente, a gestão, o jeito leve de conduzir, a proximidade. Temos conversas quase que como um RH. Criamos uma porta de entrada muito próxima e isso é muito bom. Temos um olhar complementar. Nosso tipo de ofício deveria ser o de explorar vários ângulos, o de ter a criatividade de ver por esse lado, e por aquele, e depois de todo jeito. Então, a diversidade deveria trazer esse ponto da complementariedade. Meu ponto de vista, feminino, de uma mulher que veio de outro estado, é diferente de outra pessoa com outro recorte social e racial, por exemplo. Temos visto que essas combinações de idades, gêneros, raças e experiências são muito produtivas, extremamente bem-vindas e trazem novos olhares pro mesmo produto e pro mesmo serviço.
Quais mulheres inspiradoras você segue, lê e observa? Como elas te inspiram?
Tenho um núcleo menor e mais íntimo de amigas, madrinhas do meu casamento, e são todas publicitárias. Também faço parte de um grupo de lideranças criativas do Brasil, por onde trocamos vagas, oportunidades de palestras e em festivais. É muito construtivo, e aborda desde o método de plano de saúde na sua agência ao restante. Há ainda um recorte maior, de um outro grupo, que não tem integrantes por senioridade, mas são criativas do país todo, com skills não necessariamente de publicidade. É uma turma ainda mais aberta, multidisciplinar e diversa. Nesses grupos, as trocas são muito valiosas.
Tirando o crachá, quem é a Laura Esteves?
Sou muito apaixonada pelo que fazemos. Sou muito feliz em ter esta oportunidade como executiva, mas minha essência é criativa. Vou estar sempre tentando participar de movimentos criativos da nossa indústria. Onde estiver brilhando pontos da nossa criatividade, onde houver líderes que buscam presença feminina criativa, é nesses lugares que quero estar. Não sei se tirei o crachá, mas é isso.
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