Arquitetos fazem grandes renovações em pequenos lugares

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Arquitetos fazem grandes renovações em pequenos lugares

Uma casa simples na Vila Matilde ganhou projeção global e elevou o status dos arquitetos Fernanda Sakano, Danilo Terra e Pedro Tuma; o projeto estará na Bienal Internacional de Arquitetura de Veneza

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19 de abril de 2016 - 14h57

Na zona leste de São Paulo, encravada entre a Penha, a Vila Carrão, Aricanduva, Cidade Líder e Artur Alvim, numa área de quase 9 quilômetros quadrados, fica a Vila Matilde. Até recentemente, associava-se o bairro à escola de samba Nenê da Vila Matilde. Mas um terreno minúsculo, de 4,8 m por 25 m de profundidade, praticamente um corredor, foi o suficiente para levar o bairro ao mundo. Em 2011, o filho da doméstica dona Dalva procurou o Terra e Tuma Arquitetos para verificar a possibilidade de fazer um projeto residencial para a mãe. Em 2014, com problemas estruturais, dona Dalva deixou a casa, que corria o risco de ruir, e as obras começaram. Foram quatro meses de demolição da residência avariada e, seis depois, uma pequena obra de arte da arquitetura estava pronta: no térreo, a sala, o lavabo, a cozinha, a área de serviço e suíte; na parte superior, outra suíte. No total, 95 metros quadrados de área construída. Em fevereiro deste ano, a Vila Matilde, dona Dalva e sua casa ganhariam alcance global: o projeto conquistaria o Archdaily Building of the Year 2016, conferido pelo site ArchDaily, um dos mais importantes de arquitetura, que recebe mais de 160 milhões de visitas por mês. Também elevaria o status dos arquitetos Fernanda Sakano, Danilo Terra e Pedro Tuma que, de repente, se viram no centro das atenções. E ainda não acabou: o Terra e Tuma estará na Bienal Internacional de Arquitetura de Veneza, no pavilhão do Brasil, em maio, por causa desse projeto. Os três arquitetos receberam Meio & Mensagem para falar sobre as arquiteturas da construção e da destruição: a técnica que constrói a partir de espaços reduzidos, como foi a casa de dona Dalva, e a que também destrói o antigo para dar vez ao novo, como acontece a todo momento na cidade de São Paulo.

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Fernanda Sakano, Danilo Terra e Pedro Tuma, do Terra e Tuma, estarão na Bienal Internacional de Arquitetura de Veneza, no pavilhão do Brasil, em maio, por causa do projeto da Vila Matilde

Meio & Mensagem — Temos, em São Paulo, dois extremos: o Vitra, assinado por Daniel Libeskind (responsável pela revitalização do Ground Zero em Manhattan), com apartamentos de 565 metros quadrados a 1.145 metros quadrados, de plantas exclusivas; e os projetos dos conjuntos habitacionais Parque Novo Santo Amaro e Heliópolis, assinados por Hector Vigliecca (conhecido pelas iniciativas de urbanismo em áreas críticas). São faces da arquitetura que atendem a cidade em suas demandas. Como vocês veem esses dois lados?
Fernanda SakanoEm ambos os casos, os arquitetos atuam em grande escala. Na casa da Vila Matilde, trata-se de construir a cidade, mas em pequena escala, dentro do lote. Tanto o Hector quanto o Libeskind tendem às glebas, terrenos que atendem a uma série de famílias.
Pedro Tuma O Libeskind atende ao lote, também, na verdade. E o Hector tem um projeto urbano que atende a cidade. O que têm de semelhante é que ambos trabalham com o poder. Um, o Hector, com o poder político, e o outro, Libeskind, com o poder econômico. A arquitetura, desde seu surgimento, vem ligada ao poder. Seja político, econômico ou religioso.
Fernanda As grandes construções do mundo têm essa proximidade com o poder.
Tuma Ainda que ambos atendam às demandas, não rompem o elo, como fizemos na Vila Matilde, onde atendemos diretamente uma pessoa comum. Hector atende a baixa renda em larga escala, mas o cliente dele é a prefeitura de São Paulo.

M&M — De que a forma a arquitetura pode promover a socialização nas grandes cidades?
Tuma Temos, constantemente, um rompimento com o modelo que está pronto, seja com as requisições tradicionais de apartamentos de quatro suítes, seja pelo fato de que, para você ser um bom arquiteto, tem de ter um escritório enorme. O tempo inteiro questionamos, não temos mais um modelo para seguir. As praças, em São Paulo, por exemplo, são fechadas. A praça Roosevelt é muito usada. Tem grades? Não. É mais perigosa do que outras com grade? Não sei. É uma forma de desenho que não é só tirar a grade. A praça da República, com todas as árvores, talvez seja um pouco mais hostil. Temos de atender com qualidade. Não vamos jogar a estética no lixo, claro. Quando estamos num momento de escassez como o atual,criamos coisas boas também.
Danilo Terra De forma geral, as pessoas não sabem o que querem. A Apple, por exemplo, impõe seus modelos e diz que é o que as pessoas precisam. As pessoas dizem: “Este será o meu apartamento, a minha casa”. Na verdade, somos o tempo todo induzidos a “querer” isso ou aquilo.
Tuma Não culpo a publicidade porque o publicitário vende aquilo que o mercado pede. A Zarvos (a Ideia!Zarvos, que levanta edifícios principalmente na Vila Madalena, faz prédios coloridos, com plantas flexíveis, jardins abertos ao público e grades recuadas), por exemplo, tem terrenos muito pequenos, um custo altíssimo e precisa vender um apartamento a custo alto, sem piscina, sem varanda gourmet. A publicidade, nesse sentido, consegue viabilizar pequenos lotes que a construtora adensa em lugares que têm infraestrutura pronta. Isso é bom para a cidade. Em certa medida, é bom verticalizar.

“Historicamente, temos um problema sério de arquitetura e urbanização do País. Temos excelentes exemplos de arquitetos, mas não estamos nem no começo de um caminho sério. Temos exemplos muito bons de qualidade de projetos de habitação social”, afirma Terra, sobre a alegada falta de espaço para construir na cidade de São Paulo

M&M — É possível construir casas em São Paulo ainda?
Terra Sim! Temos muito espaço! O mercado é que não vê isso. Se você ficar atento, verá que tem muito espaço. Só o que o estado ou a prefeitura perdem de oportunidade! Se tentar ver caso a caso, você encontrará. Historicamente, temos um problema sério de arquitetura e urbanização do País. Temos excelentes exemplos de arquitetos, mas não estamos nem no começo de um caminho sério. Temos exemplos muito bons de qualidade de projetos de habitação social. Quem estabelece as regras e leis de urbanização? São advogados, políticos. Mas boa parte da culpa é nossa, de arquitetos. Nós nos colocamos à parte desse envolvimento. Com o Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU, criado no final de 2010, quando se desmembrou do Crea), isso pode mudar, porque tenta estabelecer o papel social do arquiteto.
Tuma Em São Paulo, 70% da população ainda vive em casas.

M&M — Quanto à ocupação da cidade, principalmente em São Paulo, com a implantação das ciclofaixas, como as pessoas conseguem se integrar, notadamente quanto à limitação aos carros (redução de velocidade média, de vias exclusivas para ônibus)?
Tuma Existe uma política federal de incentivo aos veículos. Ao mesmo tempo, temos um prefeito (Fernando Haddad), com uma política de transporte que investe em num modelo experimental, com erros e acertos, mas, é fato: não adianta mais construir pontes, fazer avenidas. Isso não funciona mais.
Terra Não é apenas político. É estatístico. Em determinados momentos, carros não devem passar porque vão parar os ônibus. E pronto.
Tuma Falta muita coisa, mas tem o impulso dos corredores de ônibus, que são superimportantes na procura desse novo modelo que se adequa às nossas condições.
Fernanda Um modelo que visa pensar em algo mais multimodal, e não apenas no carro. Os corredores exclusivos, as bicicletas. Ou seja, viabilizar outras formas.

M&M — A Colômbia tem sido citada como modelo de urbanização e mobilidade bem-sucedido. A população de São Paulo parece estar pronta para absorver isso. Há uma exaustão do modelo convencional?
Tuma Sim, mas por que a bicicleta não é mais barata, então? Por que não torná-­la mais acessível? É um contrassenso. O carro é importante, sim. Não dá para eliminar. Não é uma guerra contra o carro. Temos o intermodal e a reflexão do uso da bicicleta sem a supressão do uso do carro. Ou ônibus sem a supressão da bicicleta.
Terra Falta o metrô se adaptar mais ainda à bicicleta, os ônibus carregarem bicicletas. Saia da garagem com o seu carro em Tóquio, por exemplo, e veja o quanto pagará de estacionamento! Só tira quem realmente precisa! Até quando esperaremos dizer que não pode andar de bicicleta? Esperar o modelo ser bom?

A íntegra desta entrevista está publicada na edição 1705, de 11 de abril, exclusivamente para assinantes, disponível nas versões impressa e para tablets nos padrões iOS e Android.

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