Qualquer pessoa guarda um hacker dentro de si
No quarto dia do SXSW, destaque para as palestras do Dennis Crowley, cofundador do Foursquare; Scott Belsky, fundador e CEO do Behance Network; e Stephen Wolfram, criador do sistema Wolfram|Alpha
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Meio & Mensagem
13 de abril de 2013 - 4h20
(*) Por Tiago Pereira
Antes de falar dos grandes nomes que passaram por aqui na segunda-feira 11, queria compartilhar essa mensagem que vi em uma pequena palestra feita pelo pessoal da Technology Will Save Us na Hackney House: "We (and you) are hackers". Essa frase, que a princípio parece um pouco generosa demais, começa a fazer todo o sentido quando você conhece alguns projetos e iniciativas incríveis que foram feitas por pessoas comuns, que não se consideram hackers, tipo eu e você. Um deles é o IkeaHackers – uma comunidade que reúne pessoas que modificam os móveis da marca para deixá-los melhores ou mais interessantes. Ninguém lá é profissional: são apenas pessoas dispostas a cortar uns pedaços de madeira para deixar suas casas mais legais. Outro projeto é o Free Universal Construction Kit: uma espécie de adaptador universal dos brinquedos, criado para que uma criança possa criar encaixes perfeitos entre brinquedos diferentes. Outra invenção interessante que foi mostrada por aqui é a Sugru, uma borracha inventada para ajudar você a consertar qualquer coisa. São exemplos simples, não digitais, mas que nos fazem começar a acreditar que podemos exercitar nosso espírito hacker.
É esse tipo de postura, carregada de uma agressividade construtiva em relação a tudo que parece já estar pronto e uma vontade de deixar as coisas melhores, que também faz nascer grandes plataformas como o Foursquare. O @dens, cofundador da plataforma, disse em sua apresentação que o Foursquare foi criado porque cidades são muito difíceis de usar. Em sua apresentação, Dennis Crowley mostrou diversas transformações que está fazendo na plataforma, todas elas com um objetivo: ajudar as pessoas a ter uma experiência urbana cada vez melhor. Ele definiu, de maneira simples, como o Foursquare quer ser visto: “The best of what’s nearby – friends, deals, cool spots.” E para ser compreendido dessa forma, eles estão diminuindo a relevância dos badges, posicionando o campo de busca como o principal item de sua interface e concentrando sua proposta no que eles realmente conseguem fazer bem. Contrariando pedidos e perguntas sobre novas funcionalidades, ele disse: “Seria inocência achar que as pessoas vão usar o Foursquare todos os dias, todas as horas. Queremos resolver apenas um problema e fazer isso muito bem (A título de curiosidade: segundo ele, o Brasil é o país que mais usa o recurso de check-ins)”.
No final de sua palestra, ele mostrou os braços cheios de pulseiras e aparelhos de self-tracking, como a FuelBand da Nike – e disse: isso é o que os nerds fazem agora e o que as pessoas normais farão no futuro. E manifestou seu interesse em fazer do Foursquare uma plataforma que não precisa funcionar somente através do smartphone, mas também em relógios, óculos e outros aparelhos.
Criativos desorganizados
Outro cara que emana esse espírito empreendedor e hacker que domina o SXSW é o Scott Belsky, fundador do Behance Network e da 99% Conference. Em sua palestra, ele contou a história e os planos que têm para a plataforma. Belsky acha que o mercado de criativos é o mais desorganizado do mundo, e que o Behance existe para ajudar a torná-lo mais organizado, produtivo e com base em mérito. Em meio à sua missão de ajudar criativos a expor seu portfólio e fomentar novos trabalhos, um dos maiores desafios é “medir” a qualidade dos projetos postados. Para isso, ele não acredita na mecânica de likes como a solução principal. No Behance, o ranking e reconhecimento dos projetos acontecem através de uma estratégia que envolve três parâmetros: 1) How many liked it – o número de pessoas aleatórias que clicaram no botão curtir; 2) Who liked it – quais pessoas relevantes e credenciadas curtiram o projeto; 3) Did we liked it? – curadoria feita pelo time de criativos do Behance. Belsky acredita que, para manter o nível de curadoria da plataforma, essas três frentes precisarão sempre coexistir.
O executivo anunciou também que o Behance agora faz parte da Adobe. A ideia da fusão é integrar o momento da criação ao de compartilhamento e diminuir o atrito que existe nesse processo. Essa fusão pode facilitar a vida dos criativos e fomentar o compartilhamento de seus trabalhos. Dentre seus planos e sonhos, um deles é garantir que todos os projetos compartilhados na internet tenham uma ficha técnica indissociável, de maneira que o trabalho saia do Photoshop (ou de qualquer outro software) para o portfólio de seus autores de forma automática – e sempre que esse trabalho for visto em qualquer outro site os autores estejam presentes. Para Belsky, isso teria um grande impacto na criação de oportunidades de trabalho. No momento em que a autoria se perde, as oportunidades também se perdem.
Falando sobre a época em que começou o Behance, disse que não tinha uma ideia estruturada do que estava fazendo. Só queria fazer com que os criativos conseguissem produzir mais e melhor. Com isso em mente, largou todas as outras oportunidades que tinha na mão para investir em seu projeto pessoal. O movimento deu certo e se transformou na lição com a qual ele terminou a palestra: “Nothing extraordinary is ever achieved through ordinary means.”
Genialidade
Outra palestra muito marcante foi a do Stephen Wolfram. O criador do Wolfram|Alpha tem uma trajetória repleta de genialidade e reconhecimento, mas que passa por invenções tão complexas que prefiro deixar para a Wikipedia te contar. Mas apresentou duas novidades que valem a pena ser compartilhadas. Uma delas é o projeto computerbasedmath.org, que terá sua estreia na Estônia, e visa reformular o ensino da matemática através de computadores de maneira que as crianças usem a inteligência da computação para resolver rapidamente todos os cálculos e invistam seu tempo na geração de conceitos e ideias. Se você quer ter uma ideia do que se trata, entre em wolframalpha.com e digite ‘the size of the world divided by two’ ou qualquer outra coisa que necessite de um cálculo.
A outra é novidade uma plataforma que usa os dados do seu perfil no Facebook para te entregar insights e informações mais profundas sobre sua vida social digital: wolframalpha.com/facebook. O report é bem detalhado e inclui informações como ‘seu amigo mais distante (geograficamente)’, ‘sua foto mais curtida’, ‘seus amigos mais influentes’ e uma série de outras coisas que outros apps por aí já mostram. Não acho que seja uma grande novidade, mas vale a pena ficar de olho. Stephen Wolfram é reconhecido como o cara que mais coletou dados sobre si mesmo durante a vida e com certeza tem algo a acrescentar ao tema do self-tracking, tão discutido recentemente.
Através dessas e outras milhares de palestras, atrações e encontros, a sensação que o SXSW deixa é que todo mundo deve se apropriar do espírito hacker e abraçar o empreendedorismo para reinventar as coisas. E, assim, ajudar o mundo a seguir dando passos para frente.
(*) Tiago Pereira é diretor de criação da LiveAD. Ele está com a equipe da agência em Austin, acompanhando o SXSW, e escreve como colaborador para o Meio & Mensagem.
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