Quais são os desafios de levar os jogos para o cinema?
Especialistas do mercado audiovisual explicam por que jogos eletrônicos, como The Last of Us e Sonic, tem sido uma fórmula de sucesso para a indústria cinematográfica
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Amanda Schnaider
7 de novembro de 2023 - 6h05
The Witcher, Sonic: O Filme, Arcane, Uncharted: Fora do Mapa, The Last of Us, Super Mario Bros. – O Filme, Gran Turismo: De Jogador a Corredor e Dungeons & Dragons: Honra Entre Rebeldes são só alguns dos exemplos de adaptações de jogos de videogame para o cinema, ou melhor, para a indústria audiovisual, lançados nos últimos cinco anos. Vale ressaltar que os últimos três foram lançados em 2023.
Apesar de parecer uma tendência atual, adaptar histórias dos jogos eletrônicos para o cinema e televisão não é algo novo. Na verdade, transformar a história de um game em uma narrativa cinematográfica data da década de 1990. Um dos primeiros jogos a fazer isso foi o Super Mario Bros.
Posteriormente, outras grandes franquias de jogos, como Street Fighter e Mortal Kombat, ganharam suas versões nas telas de cinema. Mas foi mesmo nos anos 2000, que o boom das adaptações de jogos para filmes aconteceu, com franquias, como Tomb Raider e Resident Evil, surgindo no cinema.
Entretanto, essa tendência parece ter reaquecido nos últimos tempos, ainda mais com o sentimento de nostalgia voltando à tona, por meio de ondas como a dos vinis e das câmeras digitais. Nos últimos quatro anos, diversas produções baseadas em jogos foram lançadas. Muitas delas, inclusive, sendo aclamadas pelas críticas, como a série de The Last of Us, do MAX, que ficou com 96% de aprovação no Rotten Tomatoes.
Na visão da roteirista Thais Falcão, que já trabalhou para Netflix, Globoplay e HBO Max, essa tendência vem se desenhando por alguns motivos, sendo os principais a demanda e a enorme fanbase.
“Toda produção audiovisual é uma aposta e lançar algo que já tem uma base consolidada é sair uma casa na frente em direção ao sucesso”, complementa. O sócio-fundador da produtora audiovisual de conteúdo Farra, Gui Cintra, ressalta ainda que adaptar produtos bem sucedidos de outros formatos traz uma sensação de segurança para os grandes estúdios na hora de decidir onde investir seu dinheiro.
Além disso, para Thais, ao apostar em uma narrativa de jogos, as plataformas mostram aos seus assinantes que estão ouvindo o que eles gostam, o que eles querem.
Clarissa Millford, fundadora da Academia de TikTokers e com dez anos de experiência em conteúdos audiovisuais, salienta ainda que os jogos oferecem narrativas envolventes e personagens intrigantes, que proporcionam um material muito rico para adaptações cinematográficas.
“Os avanços tecnológicos recentes também desempenham um papel fundamental, permitindo que os filmes e séries tragam com mais precisão a estética e a jogabilidade dos jogos”, afirma Clarissa. A empresária ainda reforça que esse fator tecnológico oferece a oportunidade de criar experiências cinematográficas autênticas e imersivas, que agradam tanto aos fãs de jogos quanto aos amantes de cinema.
Porém, adaptar uma história dos jogos eletrônicos para o cinema ou televisão não é tão simples quanto parece. “Na prática, há décadas a gente também vem assistindo a inúmeras tentativas fracassadas de adaptação de games”, frisa Cintra.
Em contrapartida, o sócio da Farra pontua como o sucesso comercial de algumas adaptações recentes, como Super Mario Bros. – O Filme, Sonic The Hedgehog e The Last of Us, pode ter animado os produtores audiovisuais. “Ao que tudo indica, o estigma de que ‘adaptar videogames não dá certo’ pode enfim estar sendo substituído pela ideia de que, se bem feita, a empreitada vale a pena”.
Thais entende que o principal desafio de criar uma boa adaptação é encontrar o recorte da mesma. Ela explica melhor: “A narrativa dos jogos é construída de forma capilarizada, o jogador toma decisões que pode levar a história para um lugar ou para outro com consequências por vezes completamente opostas. Já as narrativas audiovisuais são lineares, um acontecimento desencadeia outro. O desafio é incorporar a nessa linearidade eventos marcantes do game mesmo que eles não façam parte do plot principal da história”.
Neste sentido, não descaracterizar a história original e as personagens é um dos principais desafios na hora de realizar uma adaptação de jogo para filme ou série, na visão de Clarissa. Thais concorda com Clarissa neste ponto, ressaltando que os roteiristas desses produtos derivados de outros formatos precisam se manter fiéis a alguns pilares da história: o universo, personagens principais e a motivação desses personagens.
Logo, para manter o equilíbrio entre atrair uma nova audiência que talvez não conheça o jogo original e satisfazer os fãs dedicados, na visão de Thais é necessário focar nas personagens. “Quando conseguimos engajar a audiência, fazer com que ela se importe com os dramas, conflitos, aventuras e relações de quem está na jornada, a audiência fica até o final”.
Apesar de ser um trabalho complexo, quando bem feito, pode gerar uma série de ganhos para o estúdio que o desenvolveu. Clarissa pontuas três principais vantagens que podem vir com essas adaptações: atrair a base da fãs do jogo como público inicial; oportunidades para merchandising, como brinquedos, roupas e outros produtos relacionados ao jogo; e sinergia de mídia, ou seja, essas adaptações podem fazer parte de uma estratégia maior de expansão de propriedade de entretenimento em várias formas de mídia.
Desse modo, Thais Falcão enfatiza a importância das trocas de experiências entre roteiristas de jogos e os de audiovisual. “Vejo que o intercâmbio entre essas duas áreas tem avançado. Houveram algumas tentativas da ‘gameficação’ das séries, como em Bandersnatch, da Netflix, por exemplo, que foi uma experiência muito válida para testar as possibilidades das plataformas de streaming e a recepção da audiência. Acredito que experiências como essa vão ficar cada vez mais comuns e sofisticadas”, finaliza.
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