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“Marcas precisam de lideranças orientadas para o entretenimento”

Felipe Braga, sócio da Los Bragas, produtora que lançará a terceira série brasileira na Netflix, acredita que é preciso espaço para novos formatos


11 de abril de 2018 - 7h00

Gerar inovação a partir de estruturas tradicionais é um desafio para as produtoras, cujo mercado no Brasil  foi historicamente construído com base na publicidade. É o que pensa Felipe Braga, diretor, roteirista e sócio da produtora Los Bragas junto à atriz Alice Braga e a produtora Rita Moraes. Ele acredita que é preciso abrir espaço para novos pontos de vista e formatos de entretenimento, o que envolve a criação de lideranças orientadas para isso dentro das estruturas dos anunciantes.

Depois das produtoras Boutique (3%) e Zazen (O Mecanismo), a Los Bragas será a terceira produtora nacional a lançar uma série original na Netflix. Intitulada Samantha!, a série conta a história de uma atriz que fez carreira como estrela mirim, e que tenta voltar aos holofotes após ser esquecida. A data de lançamento e o elenco ainda não foram divulgados.

Em entrevista ao Meio & Mensagem durante a conferência de criatividade Rio2C, que aconteceu na semana passada no Rio de Janeiro, Felipe Braga falou sobre o movimento de expansão da Netflix junto às produtoras brasileiras e as vantagens de ser uma produtora pequena. Também comentou sobre os desafios do branded content, que na sua avaliação se tornou um “termo vazio”. Confira a entrevista abaixo.

Rita Moraes, Felipe Braga e Alice Braga, sócios da Los Bragas. Foto: Divulgação

Netflix e a produção nacional

A Netflix está fazendo um movimento de expansão no mundo inteiro, e o Brasil naturalmente é um mercado importante para eles por conta do dinamismo e tamanho da audiência deles aqui. Eles chegaram de forma muito aberta, no sentido de estarem disponíveis para conversar com todo mundo no mercado: o mais interessante é que as primeiras produtoras a trabalhar com a Netflix no Brasil são pequenas e não têm a estrutura de produtora tradicional que faz muita publicidade. Eles buscam produtos direcionados para uma audiência nova, uma geração pós-streaming que não necessariamente tem televisão em casa e que está preocupada com um tipo de representação que não é de uma nação de homens brancos. É claro que um grande player como Netflix vai querer trabalhar com grandes produtoras com tradição de produção de conteúdo, mas eles são acessíveis e querem identificar vozes emergentes no contexto de produção.

O desenvolvimento de séries no Brasil

Uma série, assim como qualquer produto de TV, parte de um princípio de continuidade e múltiplas temporadas, que pressupõem todo um trabalho de pesquisa e inteligência para colocar de pé um um universo de personagens e referências. Isso é difícil de fazer e tem sua carga de loteria, de alguma maneira. Se soubéssemos exatamente o que vai dar certo ou errado, todos os projetos seriam os melhores do mundo.  Trabalhamos muito com investimento direto de canais, que têm investido muito já que querem reter propriedade intelectual. Também trabalhamos com mecanismos de financiamento via canais de TV para produtos pontuais. Com alguma frequência temos investimento direto de marcas, quando é um projeto que tem perfil de inovação e casa com alguma marca especificamente. Fizemos isso com Latitudes, lançado há 4 anos e 100% financiado pela Fiat, Heineken e P&G; e também com o documentário A Vida Fora dos Campos, série com o Neymar financiada pelo Santander. Eram projetos de entretenimento puro, e não branded content, pois tínhamos total autonomia editorial.

Branded Content

O branded content hoje ao meu ver é algo que não interessa a produtoras verdadeiramente voltadas para entretenimento, justamente por causa dos vícios que agências e marcas começaram a desenvolver com o formato. Com frequência, quando vejo alguém de agência ou marca falando de branded content, estão falando de uma campanha normal, muitas vezes feita sem dinheiro. Este se tornou um termo vazio, o que é uma pena pois existe um potencial grande para isso. O futuro das marcas deveria ser o entretenimento, e em última análise, será, mas para fazer entretenimento é preciso que haja liderança dentro das marcas.

O futuro das marcas será o entretenimento, mas será preciso que haja lideranças orientadas para isso dentro das marcas

É preciso que dentro de cada anunciante haja pelo menos uma pessoa que entenda o sentido de se fazer associações com projetos de entretenimento e estabelecendo métricas de retorno sobre o investimento que são diferentes daquelas de um comercial de 30 segundos ou ação com embalagem. É claro que o comercial tem um valor informativo importante de informar o consumidor sobre as características de um produto, e no entanto trabalhar com entretenimento serve para reforçar os valores mais intrínsecos da marca no longo prazo. Sempre que se aplica uma lógia de varejo dentro de uma produção de entretenimento de marca, dá errado para todos os lados.

Produtoras no Brasil

O modelo de produtora de 200 pessoas está muito baseado na cultura histórica da publicidade, que fez com que conteúdo fosse historicamente produzido por produtoras que tradicionalmente fazem publicidade. As produtoras brasileiras são estruturas estanques por definição, na grande maioria das vezes são pesadas e caras porque estão dentro de uma linha de pagamento de entretenimento que engloba uma estrutura de publicidade insana do ponto de vista de custo. Ao mesmo tempo isso faz com que produtoras menores de entretenimento sejam competitivas também, pois nossos orçamentos não têm todos esses penduricalhos. Em geral, o mercado de produtoras e agências de publicidade no Brasil é um mercado de herdeiros, e não necessariamente é das empresas comandadas por filhos de donos que virá a inovação e originalidade.

Regulamentação do VOD

A regulação do VOD é uma promessa há tantos anos, que se algum dia ela causou algum tipo de ansiedade, hoje não causa mais pois todo mundo sabe que ela vai acontecer. É importante ter certeza de que as aplicações tributárias corretas serão feitas de todos os lados. O mercado de entretenimento precisa de um choque de modernização do ponto de vista fiscal, e esta é inclusive uma forma de atenuar eventuais discrepâncias de competitividade e criar linhas de fomento e investimento.

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