Democratizando a Cultura: desafios e oportunidades da acessibilidade em eventos

21 de setembro de 2023 - 17h47

(Crédito: iryna-adobestock)

Já pensou como seria participar de grandes eventos e festivais de música sem infraestrutura básica? Filas enormes para usar os banheiros, uma dificuldade quase insuperável para comprar uma simples garrafa de água, e muitas outras situações que te fariam hesitar em participar novamente, mesmo que o seu artista favorito estivesse se apresentando? 

É frustrante, não é? Agora, considere que essa mesma situação afeta mais de 45 milhões de pessoas com deficiência no nosso país. É por essa razão que trago esta reflexão, com o objetivo de destacar um tema que há muito tempo deveria ter sido palco, mas eu acredito que nunca é tarde para fazer a diferença. 

 Segundo dados da Prefeitura de Curitiba, de todas as ações voltadas à pessoa com deficiência, apenas 4% são em relação à arte e cultura – isso mostra o tamanho da injustiça social que a comunidade PcD (pessoas com deficiências) enfrenta constantemente. A inclusão e a acessibilidade são temas de extrema relevância na sociedade atual. Cada vez mais, é necessário garantir que todos os indivíduos tenham igualdade de oportunidades e acesso a diversos aspectos da vida – incluindo a participação em eventos culturais.   

É preciso destacar que a acessibilidade vai além de oferecer rampas e banheiros adaptados. É necessário pensar em todos os aspectos que envolvem a experiência de uma pessoa com deficiência, ainda mais em eventos culturais do tamanho de um Rock in Rio, The Town ou Lollapalooza, por exemplo. Eu, que sou pessoa com deficiência física, com fraqueza muscular e cadeirante, já estive nestes festivais e, baseada na minha experiência, gostaria de compartilhar algumas reflexões e boas práticas que podem ser válidas para organizadores, marcas e autoridades. 

As estruturas físicas são, sem dúvida, cruciais em tais situações. No entanto, igualmente fundamentais são as medidas que garantem informações acessíveis e transparentes sobre o evento. Isso abrange desde a disseminação de informações sobre acessibilidade nos sites, aplicativos e redes sociais, até a venda de ingressos, bem como a disponibilização de mapas e guias para facilitar a locomoção durante o evento. Tudo isso requer uma abordagem holística que considere a experiência global, abarcando tanto o mundo físico quanto o digital, desde o início até o fim do processo. 

 Um aspecto crucial é garantir espaços adequados para pessoas com deficiência. É imprescindível que tenhamos banheiros realmente acessíveis, locais com áreas reservadas, com boa visibilidade e conforto, para que essas pessoas possam desfrutar plenamente das apresentações musicais. Além disso, é essencial oferecer pontos de recarga para cadeiras de rodas motorizadas e contar com uma estrutura adequada e profissionais treinados para auxiliar na mobilidade das pessoas com deficiência durante o evento. Isso é especialmente importante em locais de grande dimensão, como festivais, nos quais a locomoção pode ser desafiadora e, por vezes, as cadeiras de rodas motorizadas podem ficar sem bateria devido à extensão do espaço.   

Igualmente importante é disponibilizar intérpretes de Libras (Língua Brasileira de Sinais) para garantir que todos possam compreender as informações transmitidas durante as apresentações. Além disso, é importante disponibilizar legendas em tempo real nas telas de vídeo, para que pessoas com deficiência auditiva e neurodivergentes possam acompanhar as letras das músicas; audiodescrição e informações táteis para pessoas com deficiências visuais terem autonomia; e redutores de ruídos, fones ou espaço sensorial para pessoas com autismo, ansiedade ou TDAH, por exemplo. Essas são ações muito básicas, que são o mínimo necessário para permitir que todos tenham acesso às experiências oferecidas pelos eventos. Vale lembrar que todas essas iniciativas não apenas auxiliam as pessoas com deficiência em suas dificuldades, mas também podem ser de grande ajuda em situações inesperadas que afetam o público em geral, como um mal súbito ou um ataque de pânico, nas quais alguém pode precisar de recursos como uma cadeira de rodas, por exemplo. 

 É necessário que os organizadores de grandes eventos e festivais de música entendam a importância da acessibilidade e se comprometam a tornar seus eventos inclusivos. Ao garantir a acessibilidade, eles não apenas estão cumprindo as leis e normas vigentes no nosso país, mas também estão proporcionando uma experiência completa e inclusiva para todas as pessoas, independentemente de suas condições. Precisamos propagar o conceito de que acessibilidade não é um favor, e sim um direito de todas as pessoas com deficiência. Ao promovermos a inclusão em grandes eventos e festivais de música, estamos construindo uma sociedade mais justa e igualitária, contribuindo para um futuro mais inclusivo e acessível para todos.