Opinião: Lula e Maluf abraçados em Cannes
Na luta pelo poder, nem a lei, nem a moral, nem a biografia podem ficar entre o candidato e a vitória. Por Rodrigo Leão
Na luta pelo poder, nem a lei, nem a moral, nem a biografia podem ficar entre o candidato e a vitória. Por Rodrigo Leão
Meio & Mensagem
4 de julho de 2012 - 6h09
A mais impactante imagem de propaganda surgida durante o Festival de Cannes este ano não veio da BBH, da DDB, da CP+B nem de nenhum outro grupo de consoantes. Não foi mostrada no Palais nem agraciada com Leão. Não utilizou recursos de computação 3D nem Photoshop. Já nasceu obra-prima irretocável. Refiro-me à foto do Lula apertando a mão de Paulo Maluf e entre eles, posando no papel de “o padre que casou a dupla”, o candidato do PT à Prefeitura de São Paulo.
Com uma única imagem Lula e Maluf conseguiram explicar tudo que é preciso saber sobre política: que na luta pelo poder nem a lei, nem a moral, nem a biografia podem ficar entre o candidato e a vitória. Se o Marcola, líder do PCC, outro partido muito ativo aqui de São Paulo, tivesse um minuto de horário eleitoral gratuito na TV o Lula ia lá abraçá-lo em Presidente Bernardes e segurar a faixa “Paz, justiça e liberdade”.
Enquanto essa imagem causava ondas de choque por todo o mundo, especialmente na cuca da Luiza Erundina, num pacato e decadente balneário francês, a nata da propaganda mundial se reunia para se autopremiar, beber além da conta, fazer networking profissional, sexo casual e tentar definir na base de um acordo de cavalheiros, afinal, o que é a boa propaganda na atualidade — já que não existem métodos eficientes nem consensuais de mensuração de eficácia nesse ramo. A boa propaganda, como a boa política, conforme demonstraram Maluf e Lula, é um conceito muito vago e meio bobo. Político eleito e propaganda premiada têm sempre razão — saíram do espectro “bom versus ruim” para a escala “vitória versus derrota”. Os dois gênios criativos da política sabem que dos derrotados a história não fala, exatamente como os publicitários brasileiros, que foram até Cannes e trouxeram na mala mais de 70 Leões.
Por isso, eu não entendi o bafafá na mídia especializada e na blogosfera sobre a presença maciça de propaganda fantasma do Brasil tentando faturar prêmios em Cannes. Uns achando que a propaganda brasileira vai se desmoralizar como negócio por causa disso. Outros achando que não é tão grave assim, já que o mundo inteiro faz fantasmas. Por mais que eu encontre muita seriedade e inteligência em ambos os argumentos, acho que a discussão é outra. A única pergunta que se pode fazer é: você, dono de agência, quer ou não fazer propaganda da sua agência desse jeito? E ponto.
Os prêmios de propaganda existem, pois são a maneira mais reconhecida e barata de se fazer propaganda de agência de propaganda. Representam para as agências o que o espaço na TV representa para os políticos. São a “realpolitik” da propaganda. Como em política, ou você está dentro ou está fora. Não há meio-termo. Se você está dentro, faça o que todo mundo faz para ganhar: conchavos com os jurados, lobby, pressão, campanhas fantasmas, videocases mentirosos e o escambau. Se o gol for de mão e o juiz marcar, é gol, não é, Maradona? Ou você imagina que as premiações de publicidade são agremiações de virgens vestais? Hahahaha. Boa.
No entanto, se achar melhor, faça como eu, que nunca fui a Cannes, nunca ganhei Leão, nunca inscrevi peça da minha agência em prêmio nenhum e nem por isso deixei de ter uma carreira em publicidade ou criar trabalhos admirados internacionalmente. Não é moleza. Não é hipster. Não é moralmente melhor. É só uma escolha possível e diferente.
No dia em que o Lula apertou a mão do Maluf, o jornalista Humberto Werneck postou essa frase do “Baú de ossos”, do Pedro Nava, no seu timeline do Facebook. Acho que ela traduz bem o que a pressão por prêmios tem feito com as agências. Fala-se de política, mas podia ser publicidade. “…deixaria definitivamente a política. Melhor para ele, afastar-se desse monstro que reduz os homens bons ou maus, inteligentes ou estúpidos, dignos ou… Indignos, a uma espécie de denominador comum — com aquela inevitabilidade com que o intestino fabrica a mesma merda com a fruta fresca, o macarrão macio, o delicado vol-au-vent e o pesado feijão”.
Rodrigo leão é sócio-diretor de criação da Casa Darwin e professor dos MBA de Marketing, MBA Executivo Internacional e International MBA da FIA. Uma vez por mês ele escreve artigos para Meio & Mensagem. Este texto foi publicado na edição 1516, de 2 de julho.
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