Produção: há vagas
Com a nova legislação da TV paga e a maior demanda por conteúdo nacional, mercado de produtoras sente a carência de profissionais especializados
Com a nova legislação da TV paga e a maior demanda por conteúdo nacional, mercado de produtoras sente a carência de profissionais especializados
Teresa Levin
10 de outubro de 2012 - 8h11
A falta de mão de obra especializada já é hoje um problema para o mercado de produção nacional, que não tem roteiristas suficientes, assim como são poucos os diretores, diretores de arte, montadores e editores, entre outros cargos da cadeia produtiva. Com a nova lei da TV paga, esta escassez tende a se agravar. A perspectiva é de que, com as novas regras, o segmento da produção independente salte das 300 horas de programação desenvolvida atualmente para quase três mil horas ao ano, o que vai mobilizar a cadeia, mas, por outro lado, já tem preocupado o setor. O conteúdo nacional mínimo já deve entrar em vigor no último bimestre de 2012.
“Antes da lei já existe uma demanda natural, mas isso tende a aumentar com as cotas de programação nacional”, acredita João Daniel Tikhomiroff, chairman da Mixer. “É fundamental que o mercado continue um processo de formação de profissionais novos para que daqui a três anos, quando a lei estiver plenamente em vigor e a demanda for bem maior que a de hoje, não cheguemos a uma saturação”, alerta. Para ele, um dos pontos mais delicados é a área de desenvolvimento de roteiros. Tikhomiroff conta que a Mixer foi a primeira produtora brasileira independente a criar uma área de desenvolvimento próprio, há oito anos, com roteiristas contratados, fixos e exclusivos, desenvolvendo novos talentos. “Esse time deu uma maior tranquilidade visando o futuro. Claro que com o aumento de demanda, precisaremos de talentos nesta área”, prevê.
Para Tikhomiroff, este é um setor sempre muito difícil. “Não é à toa que a TV Globo criou uma estrutura de núcleos de criação consagrada e mantém aquilo há sete chaves, com talentos retidos dentro da emissora. Ela sabe como é difícil encontrar substitutos à altura”, diz. Ele lembra que a nova lei exige que o desenvolvimento e a ideia original sejam brasileiros, tanto na dramaturgia quanto nos reality shows. “Não adianta comprar o formato de outra empresa internacional porque não passa na lei. Isso faz com que 100% da lei seja para que se faça conteúdo brasileiro, criado e desenvolvido por brasileiros. É claro que isso preocupa”, avalia.
O chairman da Mixer acredita que o mercado tem um número bom de diretores, bem maior que de roteiristas. “Mas os diretores mais talentosos são um número limitado. Não existe plantação que dê frutos que a cada ano e dobre a oferta profissional”, comenta. Caso semelhante ao da direção ele identifica na montagem, edição, direção de fotografia e direção de arte/cenografia. Para as áreas mais técnicas, ele lembra o Instituto Criar. “Fazem um trabalho muito sério e bom. A Mixer foi a primeira produtora a usar o programa do Criar”, informa. A ONG foi lançada em 2003 pelo apresentador Luciano Huck para estimular a formação de profissionais na área de audiovisual e atende 150 jovens, atualmente.
A produtora executiva e sócia da O2, Andrea Barata Ribeiro, defende que cabe às produtoras terem algum tipo de iniciativa de formação para sanar este problema que existe e continuará existindo. “A O2 há muitos anos tem esta política, mas acho que somos uma das poucas que têm esse pensamento. Geralmente as outras produtoras pegam a galera pronta”, aponta. Por outro lado, ela lembra que as escolas de cinema estão aumentando os cursos profissionalizantes. “Isto também vai jogar gente no mercado, agora em algum momento vamos enfrentar este problema, mas é uma crise superável”, avalia. Ela acrescenta que, como o principal negócio da O2 é a publicidade, área que já vinha crescendo, a produtora já sentia necessidade de injetar novos profissionais, como montadores, diretores, produtores e figurinistas.
Mais profissionais
Joana Mariani, sócia da Primo Filmes, faz coro em afirmar que já existe uma falta de profissionais neste momento, mas acredita que o problema vá estimular a entrada de mais profissionais, o que deve equilibrar a balança em breve. Ela lembra que existem dois tipos de equipe: a artística (roteiristas, fotógrafos, diretores, editores) e a técnica (câmera, maquinaria, elétrica, produção). “Em relação à equipe artística, temos no mercado alguns poucos profissionais altamente qualificados, que não conseguiriam suprir a demanda do mercado sozinhos. Temos também jovens talentos a ser lapidados. Estes talentos não têm a experiência dos profissionais, mas se bem trabalhados, em um curto tempo irão ser tão bons quanto os mesmos. O aumento da produção também provoca mais jovens olhando para o mercado de produção independente como uma carreira promissora”, acredita. Joana acrescenta que a Primo aposta em jovens talentos. “Mas colocamos junto a eles profissionais top do mercado. Esta equipe trabalha em conjunto, com uma ou mais pessoas com experiência supervisionando o trabalho. Este é também o trabalho dos produtores, ajudar a lapidar o produto até que ele esteja perfeito”, fala.
Equipes múltiplas
Já Belisario Franca, sócio e diretor artístico da Giros, avalia que o problema de demanda de profissionais depende do projeto. Ele lembra que o mercado de televisão por assinatura trabalha com projetos com níveis de complexidade que vão de um simples projeto factual, quase jornalístico, até séries de dramaturgia. “Para os projetos de baixa complexidade de planejamento e execução, que são a grande maioria do atual mercado, podemos afirmar que temos profissionais suficientes, e mais do que isso, as escolas de cinema já alimentam o mercado”, defende. “Mas quando subimos o nível de complexidade de execução aparecem algumas necessidades de maior profissionalismo. Planejamento, desenho de produção adequado ao projeto e direção artística estão entre essas necessidades”, lamenta. Para ele, uma das saídas é procurar profissionais oriundos de áreas como teatro, cinema, publicidade e internet. “Esse é o maior diferencial da Giros, e onde estamos fazendo os maiores investimentos estratégicos. Nessa nova fase do mercado as produtoras que melhor montarem suas equações serão as mais bem colocadas nos canais”, avalia.
Monique Bodin, produtora e executiva de desenvolvimento da Cinerama Brasilis, acredita que para a produção independente ter uma base de qualidade é necessário mais capacitação dos profissionais envolvidos na primeira etapa de produção de séries de TV, o desenvolvimento. “Esta etapa, a que leva maior tempo, é o alicerce de uma produção com qualidade. Desenhar e executar um bom plano de negócios e de transmídia para o produto audiovisual, pensar o business como um todo e executar uma boa pesquisa e roteiros, pode gerar mais verba investida, com uma maior proximidade com as empresas que querem investir via branded content e advertainment. A capacitação dos profissionais é essencial, o que custa caro e leva tempo”, afirma.
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