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Opinião

Criatividade em redes: democratizando a invenção

Neste ambiente, criatividade não é um conceito abstrato, mas uma prática de fluxo contínuo, como um jogo de capoeira — se a intuição não te levar de um lado para o outro da roda, a roda te bota direto no chão


24 de setembro de 2018 - 16h16

Crédito: Cindy Sherman/Reprodução

As fotografias da artista norte-americana Cindy Sherman estão nos maiores museus e nas melhores coleções particulares internacionais. Há anos nas listas dos mais talentosos artistas contemporâneos, é conhecida pelos retratos em que ela mesma aparece no papel de personagens cuidadosamente construídos, muitas vezes em cenas congeladas de filmes ou outras representações femininas na mídia. É também uma artista muito valiosa. Em 2011, uma das cópias de seu trabalho Sem título #96 foi vendida pela casa de leilões Christie’s por US$ 3,9 milhões, o maior valor recebido por uma fotografia até então. Na verdade, seu nome aparece sete vezes na lista das 25 fotografias mais caras do mundo.

Personalidade do controlado mercado das artes, Sherman surpreendeu a todos quando no ano passado, passou a publicar sistematicamente selfies distorcidos e alterados em sua conta no Instagram. Desconstruindo seu trabalho e sua própria imagem, juntou-se a centenas de milhões de artistas que fazem das redes um poderoso circuito de expressão pública.

https://www.instagram.com/p/Bl651qGAvLC/?hl=pt-br&taken-by=cindysherman

As redes democratizaram a criatividade, abriram as portas para novos estilos, novos modelos narrativos e novas cadências de diálogos. Abaixaram as barreiras, criaram novas ferramentas e facilitaram a expressão massiva. Estrelas consagradas, fenômenos emergentes e as pessoas mais comuns se conectam em uma extensa cadeia, onde a diversidade estética é a maior moeda e a fonte primaria de inspiração. Criatividade neste ambiente, não é um conceito abstrato, mas uma prática de fluxo contínuo, como um jogo de capoeira — se a intuição não te levar de um lado para o outro da roda, a roda te bota direto no chão. Nelas, a relação não pressupõe um emissor no controle, sensibilizando com seu talento um receptor idealizado. Na rede estes papéis são dinâmicos, agentes trocam de lado com facilidade e frequência. Desconhecidos permanecem assim somente se quiserem e os participantes se revezam continuamente no protagonismo criativo.

As mudanças, neste caso, são bem mais que superficiais e vão além do novo discurso estético. Nas redes, emocionar com uma mensagem poderosa ainda é fundamental, mas o potencial de conexões é bem maior que o proporcionado pelo impacto emocional. A experiência de comunicação em redes é baseada em uma economia de transações imediatas, mais parecida com as experiências da vida em uma cidade que com exibições de imagens numa sala de cinema. Está mais para trocas afetivas diretas, menos para o afastamento das projeções e idealizações. É possível ir mais fundo, abrir as portas de uma marca para experiências completas. Acomodar os novos discursos criativos, abrir novas conexões e construir fluxos sem atrito e plenos de significado.

Aqui do nosso lado, as implicações são muitas. Todo mundo já entendeu que para nos comunicarmos na rede precisamos de outra atitude criativa e de outras construções narrativas. Ou aprendemos a nos colocar dentro de uma agenda contínua de aprendizados, ou vamos deixar de perceber ideias fantásticas que nosso repertório simplesmente não consegue identificar. E não adianta simplesmente tentar uma carona no brilho dos criadores: precisamos abrir espaço para incorporar novos pontos de vista, criar juntos experiências com dimensões plurais e completas para as marcas. De um lado, é preciso mais generosidade na hora de colocar na mesa tudo aquilo que sabemos fazer melhor. De outro, é preciso muito mais abertura na hora de enxergar de outras perspectivas. Mais ainda, é preciso muita curiosidade e vontade para inventar alguma coisa nova que seja diferente do lugar de onde todos partiram.

Estamos todos em modo de aceleração e descobertas. Vamos ter de criar pontes a todo momento e inventar coletivamente. Todo mundo também já entendeu que isto não é um problema, mas uma oportunidade gigantesca, por isso se fala tanto em transformação digital de negócios. Transformações não acontecem sem mudanças radicais de mentalidade, sem a abertura de novas perspectivas, sem a experimentação genuína de novas práticas.

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