ProXXIma
24 de maio de 2018 - 7h39
Por Henrique Szklo (*)
Esta última edição do ProXXIma foi, mais uma vez, imperdível. É claro que estou puxando um pouco o saco, mas estou sendo sincero ao mesmo tempo. Uma das apresentações que mais me impressionaram foi a do diretor de marketing da IBM, o Mauro Segura.
Ele, basicamente falou de inteligência artificial e machine learning. E para ilustrar, mostrou um aplicativo que nos dá a possibilidade de conversar com produtos expostos nos pontos de venda. Ele fez uma demonstração ao vivo, conversando com um pão de forma. Perguntou se o pão tinha glúten, qual era a composição e se o fato de torrar o pão tiraria as propriedades nutritivas. O pão, com voz feminina, respondeu a todas as perguntas educadamente, com detalhes e desenvoltura. Chegou até a oferecer algumas receitas. A cena foi insólita.
Imediatamente fiquei me perguntando se as máquinas com inteligência artificial realmente se desenvolverem e criarem opinião própria. Como serão evidentemente muito inteligentes, poderão se transformar em entidades sem muita paciência com os seres inferiores, no caso, nossotros. Ou pior: aprenderem a nos manipular e, ingratas, cuspir no prato que comem, detonando a própria empresa que as contratou. Sim, se elas ficarem inteligentes, com certeza desenvolverão uma característica muito comum aos humanos: a ingratidão. E se a sinceridade estiver associada, a nossa economia correrá um sério risco.
Imagine os seguintes diálogos entre o consumidor e os produtos:
Carne
– Por favor, você está fresca?
– Tá me estranhando, brother?
– Não, desculpe, só quero saber se está apropriada para consumo.
– Preparada estou, só não aconselho…
– Por que?
– A higiene lá do frigorífico não é das melhores. Semana passada teve até uma multa da autoridade sanitária.
– Puxa…
– Sem contar que o dono está preso. A propina ali corre solta. Virou carne de vaca…
– Acho que vou comprar uma salada
– Faz bem
Suco em caixinha
– Qual o seu sabor?
– Aqui diz laranja, mas de laranja mesmo só a cor da embalagem. Na verdade o sabor mais parece mistura de sapato velho com cera de depilação.
– Mas não é tudo natural?
– Se você considerar que produto químico é natural...
– Mas na propaganda apareciam pessoas felizes colhendo as laranjas numa plantação enorme…
– Tudo montagem. Tudo aqui é artificial, inclusive minha nteligência. Mas a sua não tá muito atrás não.
– Mas o que é que eu faço então?
– Bebe água. Mas não essa aqui do lado que elame falou que vem da torneira.
Tênis
– Você tem tamanho 40?
– O que você acha?
– E qual é o material utilizado na sua fabricação?
– Crianças tailandesas acorrentadas…
– Ah, mas achei você bem bonito
– Se você for desfilar na avenida…
– Eu vou levar, o preço tá bom
– Tá ótimo, principalmente se você considerar que custou um décimo pra fabricar.
Apartamento em construção
– Por favor, você tem mesmo 100 metros quadrados?
– Ha!
– Os materiais utilizados são de qualidade?
– Ha, ha!
– E o acabamento?
– Ha, ha, ha!
– Mas vai entregar as chaves no prazo, né?
– Meu deus…
Joalheria
– Que anel maravilhoso… quanto você custa?
– Mais do que você pode pagar.
– Como é que você sabe o que eu posso ou não posso pagar?
– Eu tenho inteligência artificial mas não sou cego. Pela sua cara dá pra ver
– Que saber, vou comprar só pra te esfregar na cara…
Cliente entra na joalheria. E o anel comemora:
– Legal… mais uma venda. Vou querer comissão.
Sinceramente, acho que o uso de inteligência artificial pode ser um tiro no pé. Ao invés de facilitar nossa vida, pode acabar nos levando acrises sem precedentes em nossa história. Quer saber? É melhor a gente deixar as coisas como estão e continuarmos com a nossa ignorância natural.
(*) Henrique Szklo é Sócio e Chief SubversionOfficer da Escola Nômade para Mentes Criativas