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Como construir um ecossistema para startups
Nicolás Shea, fundador do Start- Up Chile, explica as bases para qualquer país criar seu próprio Vale do Silício
Nicolás Shea, fundador do Start- Up Chile, explica as bases para qualquer país criar seu próprio Vale do Silício
6 de julho de 2016 - 11h49
Por Ian Chipman
Nicolás Shea tem uma proposta interessante: sua startup pode ter US$ 40 mil em financiamento equity-free, vistos de um ano e espaço gratuito para o escritório. A única condição: você deve levar a empresa para o Chile por pelo menos seis meses.
Nicolás é o desenvolvedor do Start-Up Chile, modelo de negócios lançado em 2010 e gerido pela Agência Chilena de Desenvolvimento Económico, que alcançou o sucesso. Já são mais de 1.200 startups, de 72 países, que participaram do projeto. De acordo com o seu criador, as empresas que saíram do programa levantaram mais de US$ 100 milhões e criaram mais de 1.500 postos de trabalho. Toda essa movimentação tem feito a região ganhar a atenção. Não só o programa atraiu cerca de 18 mil candidatos no último ano, como também contribuiu para que o local fosse apelidado de “Chilecon Valley” pela revista The Economist enquanto a Inc. classificou Santiago como um dos principais centros de inovação do mundo.
Nicolás aposta que o sucesso conquista no Chile pode ser replicado em outras partes do mundo. O ex-aluno do curso MSx (Master of Science for Experienced Leaders, da Escola de Negócios de Stanford), em colaboração com o Centro de Stanford para Estudos Empresariais, está desenvolvendo um manual intitulado Start-Up Chile: A História da Revolução Empresarial do Chile, no qual quer oferecer um roteiro para outros países que buscam dar o pontapé inicial em seus ecossistemas empresariais.
De onde surgiu a ideia para criar a Start-Up Chile?
Sou chileno, mas nasci em Nova York. Depois de me formar em Stanford, em 2009, eu fiquei nos EUA. Porém, muitos dos meus amigos estrangeiros não tiveram a mesma sorte, já que não tinham visto de permanência. Eles adorariam ter ficado e eram supertalentosos, bem relacionados, pessoas que você gostaria de ter em seu país. Mas em vez disso, a América, basicamente, os expulsou após a graduação. Isso não fazia sentido para mim e eu me lembro de pensar que se eu tivesse o poder, eu ia querer que esses caras fossem para o Chile.
Depois da formatura, fui convidado pelo Ministro da Economia [do Chile] para me juntar a equipe como consultor empresarial e de inovação. Três dias depois, o país teve um terremoto e esse tsunami deu um senso de urgência e propósito para muitas pessoas. Tivemos que reconstruir o Chile. Começamos, então, a pensar ideias malucas e queríamos efetivar as coisas rapidamente. Foi ai que coloquei em prática esse plano de “sequestrar” as pessoas dos principais centros de inovação no mundo e trazer para o Chile.
O que é melhor para a Argentina: ter Lionel Messi jogando em Barcelona ou no Boca Juniors? A mensagem é ter seus habitantes locais jogando nas ligas principais onde quer que estejam e ter estrangeiros vindo para jogar nas suas
Por que um empresário optaria ir para o Chile ao invés de trabalhar sua ideia em seu próprio país?
Digamos que você tem uma grande ideia, e você está trabalhando nela e comendo pizza no porão do seu amigo. Você acabou de sair da Universidade, está empolgado, porém seu poder de negociação é mínimo. Nesse cenário, você vai aceitar qualquer oferta que receber. Meu ponto é espere, não se apresse. Por que assinar um termo de compromisso agora? Nesse período inicial a ideia é como um feto. Toda semana ela cresce. Qualquer bom empresário vai saber que quanto mais tarde você assinar, melhor, porque é onde o valor real dela está sendo garantido.
Basta vir ao Chile por seis meses e fazer seja lá o que você estava fazendo. Vou dar a você um espaço para abrir seu escritório e dinheiro para que você possa viver e trabalhar. Os US$ 40 mil são suficientes para se manter e ainda ter algum capital de giro.
Com seis meses de funcionamento, se a sua ideia se provar um desastre, você vai agradecer a Deus por não ter assinado qualquer termo de compromisso. Agora, se você tiver conquistado um sucesso estrondoso, alguém que já estava disposto a dar dinheiro para você antes, ficará ainda mais. Você provou que tem um protótipo de algo que funciona e clientes. Eu não sou (um investidor), mas, se eu fosse, isso me diria muito.
Outra coisa interessante sobre a Start-Up Chile é o efeito de “não amarras” que temos. Não há nenhuma equidade de capital, nenhuma dívida. Com isso, estamos dizendo para o empresário “Confiamos em você. Tudo o que é bom para você vai ser bom para mim”.
O que o Chile ganha com isso?
A população do Chile deve ser uma das mais hegemônicas do mundo. E a Start-Up Chile é sobre acelerar nossa cultura para algo mais interligado e conectando. Nós somos um país pequeno e essas conexões trazem tantas coisas positivas…mais comércio, mais vendas, mais receita, mercados maiores etc. Além disso, o Chile está construindo uma comunidade de não-chilenos que vivem espalhados em todo o mundo.
Mas o maior retorno é a mudança social e cultural. Temos dois requisitos para os empresários participarem. Um é estar fisicamente no Chile a maior parte do tempo. Você pode sair e adquirir financiamentos, mas quero que você faça do Chile a sua residência. A outra coisa que pedimos é que você interaja tanto quanto possível com os chilenos. Queremos que você seja visto. Nós não buscamos a equidade financeira – mas sim a equidade social. O resultado disso são mais de 200 mil chilenos interagindo com empresários da Start-Up Chile. E isso cria um efeito cascata.
Eu realmente acredito em uma sociedade aberta, interligada. É muito mais do que apenas milhares de startups. São amizades. São famílias. Minha colocação favorita sobre isso é que 12 bebês nasceram nestes últimos cinco anos entre chilenos e estrangeiros do programa.
As relações do Chile com o empreendedorismo mudaram como resultado de toda essa interação?
Um dos principais problemas que as pequenas economias têm é que todo mundo dá aulas de empreendedorismo com Steve Jobs e Bill Gates como modelos. Mas, por favor, quando é que um chileno vai se relacionar com Steve Jobs?
Quando você traz empresários reais, você pode mostrar que eles não são Steve Jobs; eles são como você. Você pode tocar e sentir o cheiro deles, falar com eles, e você percebe que você é tão bom quanto eles são. O que está acontecendo agora é que os melhores alunos querem ser empreendedores. Na verdade, eu sou o culpado por ser muito difícil contratar pessoas. Todo mundo quer iniciar uma empresa.
No mês passado, 200 empresários vieram me dizer adeus e um deles pediu desculpas por levar dois engenheiros chilenos com ele para Berlim. Eu estava tipo, “Você está brincando comigo! Isso é exatamente o que queremos!”. Esperamos que todos os nossos engenheiros saiam daqui.
Você não se sente responsável por essa ideia de que é bom para o Chile exportar talentos?
A sabedoria convencional diz que você precisa concentrar todo o talento aqui. Bem, não é assim que o mundo funciona. Eu estava tendo uma discussão com um ministro argentino que disse “Eu não posso entender por que você não está forçando os empresários a ficar no Chile”. E eu respondi “O que é melhor para a Argentina: ter Lionel Messi jogando em Barcelona ou no Boca Juniors?”. A mensagem é ter seus habitantes locais jogando nas ligas principais onde quer que estejam e ter estrangeiros vindo para jogar nas suas.
Qual foi o maior desafio no desenvolvimento da Start-Up Chile?
Quando você inicia um programa como o Start-Up Chile, você não pode esperar que ele resolva o problema do desemprego ou do crescimento econômico do país. Muitas vezes, porém, as pessoas nos criticavam porque não estávamos discutindo estas questões. Mas também não valia muito. Tivemos um orçamento em inovação de US$ 1 bilhão, algo como US$ 5 milhões por ano, e não é como se estivéssemos queimando esse dinheiro. Esse valor estará no Chile, com as startups gastando esse dinheiro aqui e interagindo. Nós todos sabemos que há valor nisso, mas é difícil traduzi-lo diretamente.
Realmente acredito em uma sociedade aberta, interligada. É muito mais do que apenas milhares de startups. São amizades. São famílias. Minha colocação favorita sobre isso é que 12 bebês nasceram nestes últimos cinco anos entre chilenos e estrangeiros do programa
Outros países estão criando programas semelhantes. Você se envolveu em algum deles?
Nós nos encontramos com todos eles, e eles têm, por unanimidade, a mesma questão: Como podemos convencer o governo a nos dar dinheiro? O Brasil fez isso, mas restringindo 95% dos fundos para os empreendedores locais e por meio de incubadoras e aceleradoras. O Peru está fazendo, mas com uma quantia muito modesta. E há ainda a Start-Up América que, segundo um empresário, é exatamente igual a Start-Up Chile, mas sem dinheiro e sem visto.
Todos esses países estão atraindo empresários e concentrando-os em seus territórios. Mas a beleza que eu vejo na Start-Up Chile, e que acho que a maioria dos empresários também aprecia, é a simplicidade. Você acaba de chegar ao Chile, recebe um visto de trabalho de um ano, começa com US$ 40 mil e um escritório incrível. Basta começar a convidar empresários, arregaçar as mangas e fazer o que for preciso. Eu prometo a você, eles virão.
Qual tem sido a parte mais gratificante de tudo isso para você?
Acho que nós influenciamos a abordagem do governo para políticas de empreendedorismo em outros mercados emergentes e temos provado que elas funcionam na América Latina em grande escala. O chileno ou o latino americano médio diria que essas coisas só podem acontecer nos EUA. Aqui, eles dizem, não há nenhum talento; você não pode competir; o empreendedorismo não funciona. Nós temos provado que isso está errado.
CONSTRUA UMA STARTUP EM QUALQUER LUGAR
O fundador da Start-Up Chile dá algumas das suas principais dicas para replicar o programa de sucesso e construir um forte ecossistema de startups:
Foco no empreendedor: Fazer seu país amigável para os estrangeiros inclui, além de vistos, ajudá-los com processos como alugar uma casa, colocar as crianças deles na escola e abrir uma conta no banco. O Chile ajuda em todos esses processos.
Ian Chipman é jornalista, escritor e colaborador da revista Stanford Business, onde este texto foi originalmente publicado
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