29 de março de 2017 - 7h37
Luiz Villar (*)
Não sou da primeira geração que desbravou e abriu picadas no então inóspito e desconhecido universo da Internet. Mas com algum conhecimento acumulado desde que fiz da web meu foco profissional, lá no começo dos anos 2000, posso afirmar, com convicção, que há uma mudança monumental acontecendo na atuação das agências digitais.
Alguns de vocês podem achar que, por estarmos no meio de uma chacoalhada tão grande em mercados, hábitos e comportamentos, me refiro ao que alguns acadêmicos chamam de “transformação mais importante desde a Revolução Industrial”.
Claro que está relacionado, mas meu ponto é bem mais específico: o que faço no meu dia a dia vem chamando a atenção de uma audiência bem diferente.
Quem começou a trabalhar com propaganda e marketing digital nos primórdios da web viveu aqueles dias em que marcas e clientes primeiro discutiam estratégias de compra de mídia, de veiculação do “filme manifesto” na TV, do anúncio na página dupla da revista semanal e, só depois, se desse tempo, ouviriam, impacientes, o que “os meninos da internet” tinham a dizer. E só então saíamos da “mesa das crianças” para tentar convencer todos os adultos, inclusive os do marketing, que podíamos fazer mais do que o manjado banner repetindo o conceito com a cara do artista da novela.
Hoje, vejam só, já existem profissionais que sempre trabalharam com o digital tomando posse da caneta do marketing em corporações gigantes, apresentando aos homens de negócios todos os dashboards possíveis das várias campanhas paralelas focadas em nichos diferentes que a velha “estratégia de massa” considerava iguais. E não tem volta. Porque além de jogar para o mundo suas mensagens, as marcas precisaram aprender a ouvir. Sempre muito atentas às milhares de conversas que acontecem sobre elas o tempo todo.
Mas, por mais desafiador que tenha se revelado esse novo cenário, para um velho combatente das trincheiras digitais não foi uma novidade. A mudança foi progressiva, constante e nunca deu sinais de que poderia recuar. Meu relato aqui hoje é sobre uma mudança que, confesso, não vi chegar.
E o que mudou, de fato?
Muitos de nós, profissionais do digital, somos hoje procurados não por conta da habilidade em trabalhar o branding ou a capacidade de mapear onde estão os consumidores de um produto: estamos sendo abordados pelo lado da “mesa dos adultos” que nos ignorou por muito tempo.
CEOs, CFOs, COOs e outros camaradas com siglas de peso no crachá marcam presença em nossos lounges com pufes coloridos para uma conversa bem diferente: pedem um caminho para transformarem seus negócios.
Os desafios mudaram. As regras mudaram. E, principalmente, em muitos casos, a concorrência mudou também. E se tornou imprevisível justamente pelas novidades que trouxeram pra velhos segmentos onde as regras do jogo eram “claras e conhecidas”.
Lembro perfeitamente quando, há pouco mais de dois anos, recebi um convite para tomar um café com um amigo do mercado financeiro que me fez uma pergunta direta: “Sua agência tem um lado de consultoria?”. E depois emendou: “Coloquei uma grana num negócio que precisa de um caminho futuro. E não tenho dúvida de que a resposta está no digital!”.
Desde então, caros leitores, já fui procurado por empresas de varejo, por agências de recrutamento, por instituições de ensino, por bancos e até mesmo empresas de comunicação com anos de mercado, mas com o incômodo declínio que bate na porta de quem não se preparou para mudança tão anunciada.
E se engana quem pensa que isso só ocorre no Brasil. Em poucos meses de operação de nosso novo escritório em Londres, já participamos de conversas onde o tema é “mudar para sobreviver”. E, diferente dos velhos tempos da “mesa das crianças”, espera-se que os profissionais do digital surpreendam as velhas práticas com uma solução ou ferramenta que garanta o bônus dos gestores das empresas.
O termo “digital transformation” está na agenda de corporações de todos os tamanhos. Outro dia recebi um cartão de visitas com o título “Business Transformation Manager”. E departamentos inteiros vêm sendo criados com especialistas em dados, profissionais de conteúdo e jovens nativos das mídias sociais em grandes firmas que se veem ameaçadas pela velocidade operacional e a audácia das startups.
E certamente as grandes do ramo da consultoria já tinham visto o começo dessa onda quando surpreenderam o mercado e abriram, há alguns anos, a temporada de compra de agências digitais. Centenas de aquisições aconteceram em um relativo curto espaço de tempo. E lá foram os “meninos da internet” sentar na mesa com tomadores de decisão de negócios que, há décadas, tinham seu espaço garantido no mundo.
Ao contrário dos antigos players da publicidade, as agências digitais não fazem workshops para discutir o “futuro da comunicação”. Estamos, enquanto isso, envolvidos em projetos onde a construção de marca é um dos vértices do complexo novo plano de negócios. E temos voz em boa parte deles.
Os tempos mudaram. Não dá para olhar para frente e pensar em marketing, propaganda e negócios sem considerar o papel fundamental da tecnologia. E o futuro a nós pertence, amigos digitais.
(*) Fundador e Diretor Executivo da CasaDigital