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Estímulo versus prevenção

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Em perspectiva

Estímulo versus prevenção


30 de outubro de 2013 - 3h40

Por Nathalie Ursini

Na quinta-feira passada, 17, o Ministério Público de São Paulo lançou a campanha “Cerveja também é álcool” por meio da plataforma change.org A iniciativa busca assinaturas da população para forçar o Congresso Nacional a alterar a Lei 9.294/96, que restringe a publicidade de bebidas alcoólicas e cigarros, impondo as restrições vigentes também às cervejas. Atualmente, apenas bebidas com teor alcoólico superior a 13 graus Gay-Lussac enquadram-se na lei. Vinhos e cervejas estão livres das restrições. O assunto, porém, é ainda mais delicado.

A bandeira levantada pelo Ministério Público paulista tem como foco o consumo de bebidas por menores de 18 anos, que, em seu entendimento, é motivado, entre outros fatores, pela publicidade. Jairo Edward de Luca, promotor de Justiça da Infância e Juventude de São Bernardo do Campo (SP) e idealizador da iniciativa, defende que todas as medidas possíveis devem ser tomadas para que as crianças não tenham contato com bebidas alcoólicas. Durante o lançamento da campanha, a psicóloga Ilana Pinsky, vice-presidente da Associação Brasileira de Estudo do Álcool e outras Drogas (Abead), ressaltou que a publicidade de bebidas alcoólicas está cada vez mais interativa, com ações na internet e patrocínios a festas universitárias, o que sai da alçada de fiscalização do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar).

Caso a mudança na lei ocorra, a publicidade de cervejas não poderá induzir o consumo nem fazer associação a celebrações cívicas ou religiosas, esportes olímpicos e sexualidade. Além disso, só poderá ser veiculada entre 21h e 6h — o que seria um enorme baque para agências e veículos. Paralelamente, os fabricantes emovimentam-se com ações de responsabilidade e programas de consumo consciente. A Ambev, por exemplo, maior do setor, lançou, na semana passada, campanha “Papo em família”, em parceria com a Mauricio de Sousa Produções, voltada a pais e educadores, com a finalidade de combater o fato de 46% dos jovens consumirem bebidas alcoólicas pela primeira vez dentro de casa (dado do International Center for Alcohol Policies). Próximo a datas comemorativas, é possível notar um aumento no número de campanhas preventivas. Mas será que são efetivas ou servem apenas para os anunciantes dizerem que estão fazendo a sua parte? 

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Governo
“Quando aplicadas no ponto de venda, às vezes, as campanhas têm algum resultado didático. Já os informativos aplicados nos anúncios surtem pouco efeito do ponto de vista de persuasão. A locução em ritmo de jóquei dos comerciais cai na paisagem e surte pouca efetividade para mudança de comportamento. Creio que, com o volume de investimentos da indústria de bebidas, seria possível um trabalho bem mais abrangente. Afinal, as mazelas sociais causadas pelo álcool vão muito além das mortes no trânsito. O problema é que o volume de investimentos nas campanhas que induzem ao consumo são muito superiores aos esforços para prevenção e consumo responsável. No ministério, por exemplo, temos uma parceria com a Brasil Kirin, que nos empresta os espaços do patrocínio das corridas de Stock Car para fazermos campanhas de redução de acidentes junto a esse público. A grande maioria das marcas está presente em eventos culturais e esportivos e poderia fazer muito mais ações efetivas de prevenção junto ao público jovem. A glamourização da bebida apresentada com frequência nos comerciais tem aquele parco contraponto no final: “se beber, não dirija”, que não tem quase nenhum efeito prático.”  

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Anunciante

“As campanhas de prevenção são efetivas, sem dúvida. Mas não se deve apostar em uma única iniciativa isolada. A prevenção vem de identificação do problema e educação. É a soma de iniciativas que vai trazer resultados. A Ambev organiza ações de defesa das práticas de consumo responsável há dez anos. Lançamos o Jovem de Responsa, programa que instrumentaliza os jovens a conversarem com os próprios jovens. Em seguida, veio o Supermercado de Responsa, levando a responsabilidade para quem vende a bebida, com um sistema que trava a venda incorreta. Depois, fizemos treinamento com os bares, e, agora, na última fase, lançamos o Papo em Família. Pesquisas mostram que, na maior parte dos casos de jovens alcoólatras, o primeiro contato com a bebida foi dentro de casa. É um assunto que deve ser discutido em família. O mais importante é a formação de rede: indústria, governo, escolas, todos têm de falar para que a campanha seja efetiva. Principalmente para a indústria fabricante, não nos interessa esse consumo indevido. Não queremos esse lucro; prejudica a indústria.” 

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Justiça

“Não há muitas campanhas de prevenção à bebida, e, quando existem, não surtem o efeito desejado. A campanha que induz o consumo é muito mais forte e atraente para os jovens. Um estudo realizado com crianças entre 12 e 14 anos de idade, de São Bernardo do Campo, comprovou que elas foram estimuladas a ingerir bebida alcoólica pela publicidade. Temos especialistas que dizem que a estratégia desse tipo de publicidade é com foco no jovem e no adolescente, que ainda não tem mecanismo crítico desenvolvido. O jovem de hoje é muito bem informado, e, mesmo que veja que uma marca fala sobre consumo consciente, vê outras tantas que o estimulam a comprar. É necessário ter medidas para enfrentar o consumo de álcool por jovens, e só quem está na vara da infância acompanha esse problema de perto. Não propomos censura e nem o não consumo de bebidas. Queremos bom senso, e que o interesse da saúde pública prevaleça sobre o interesse econômico. É importante e louvável que as marcas mostrem seu lado de responsabilidade, mas precisam mexer na questão do estímulo”. 

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Agência

“Tive a oportunidade de fazer uma campanha de prevenção ao álcool para a Universidade Mackenzie. Eles detectaram, em um estudo interno, um aumento significativo do consumo de bebidas alcoólicas por parte das meninas. Na mesma pesquisa, perceberam que imagens chocantes apenas afastam os jovens do diálogo. É normal, quando somos jovens, não acreditarmos que determinadas coisas possam acontecer com a agente. Então, nós mesmos já banimos essas imagens chocantes do nosso imaginário, e, consequentemente, às mensagens que vêm juntas. A verdade é que as pessoas não são convencidas com argumentos subjetivos do tipo “se beber, não dirija”. Campanha de conscientização só funciona quando tem argumentos contundentes baseados em pesquisas, e se for feita de forma inovadora. Tem de fazer as pessoas pararem para pensar. É importante que as marcas de cerveja tenham em seu DNA essa consciência. A Skol faz propaganda, vende seu produto, e elegeu o Motorista da Vez. A marca conseguiu manter o conceito de diversão entre amigos, mas com responsabilidade.” 

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