Cigarro e propaganda: MP no Senado reacende o debate
Documento que regulariza ações de comunicação institucional de fabricantes vai ao plenário nesta semana
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Teresa Levin
14 de novembro de 2011 - 4h56
A indústria de cigarros estará mais uma vez no centro das discussões na próxima semana, desta vez no Senado Federal. A Medida Provisória (MP) nº 540/2011 que, entre outros itens, trata do aumento de preços e impostos de cigarros, estabelece uma série de restrições para essa indústria. Mas é categórica ao estabelecer que as medidas não se estendam à divulgação institucional dos fabricantes, compreendendo aqui, de acordo com o texto, “qualquer modalidade de informação ou comunicação que não se refira ao produto em si, mas sim a empresa ou instituição, visando a disseminação de sua marca e imagem e não a promoção de seus produtos”.
A MP deve ser avaliada no plenário nacional esta semana e, se aprovada, segue para a sanção presidencial. Na área da publicidade, o documento dá suporte a algo que já acontece: o uso de ações de marketing pelas fabricantes de cigarro – incluindo aí o patrocínio a eventos -, desde que com cunho institucional.
Na prática, o que pode mudar se a MP realmente virar lei? Uma fonte ouvida pelo Meio & Mensagem, que prefere não se identificar, explica que, sim, apesar de o patrocínio a eventos como forma de publicidade institucional de indústrias de cigarros ser uma realidade, não há nada registrado sobre o assunto na legislação brasileira.
“Esta medida simplesmente dá uma segurança jurídica para as empresas de tabaco fazerem uso da marca corporativa em atividades e ações que já fazem”, diz a fonte, que destaca ainda que, em tempos nos quais a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) tem invadido a seara do legislativo, tentando disciplinar a liberdade de informação e expressão das empresas, esta passa a ser uma questão econômica e de segurança jurídica para fabricantes de cigarros.
Sobre a possibilidade de que o País volte a ter eventos grandiosos na área cultural com o nome dessas empresas, o profissional consultado pelo Meio &Mensagem considera a hipótese completamente descabida. “Hoje não faria sentido nenhum ter um Souza Cruz Jazz Festival. Não há espaço para isso, é um estágio pelo qual a sociedade e as próprias empresas já passaram. O objetivo do legislador, neste caso, é disciplinar o uso da marca corporativa nas empresas, dentro do contexto atual. Nenhuma empresa faria algo assim no ponto em que estamos. As marcas querem apenas estar presentes, com segurança jurídica, em apoios culturais a palestras e eventos”, conclui.
Repercussão
Armando Strozenberg, chairman da Euro RSCG, acredita que a MP não muda nada. “Se partíssemos do pressuposto de que este patrocínio não existe, seria um fato novo. A Souza Cruz patrocina, por exemplo, o Festival da ABP (Associação Brasileira de Propaganda) e por aí vai”, diz, lembrando que a empresa também faz acordos pontuais de patrocínio ao programa de rádio Liberdade de Expressão, da rádio CBN. “O que se quer no Parlamento é saber se isso deve ser proibido ou criar uma cobertura legal para o que já existe. Objetivamente, a presença da Souza Cruz no mundo promocional acontece há muito tempo”, diz.
Strozenberg pondera que as marcas de cigarros estão proibidas de fazer qualquer tipo de comunicação com o mercado, mas não há restrição para que as corporações o façam. “São empresas registradas, que pagam impostos, têm milhares de funcionários. Em princípio me parece bastante razoável que se decida que a corporação pode patrocinar alguma coisa. O nome não diz o que a empresa faz, não se poderia nem acusar que seria propaganda subliminar ou algo que estivesse de alguma forma burlando a legislação”, opina. “A não ser que o governo diga amanhã que é proibido produzir cigarros, assim elas seriam clandestinas. Do contrário, fico feliz por esta iniciativa no Parlamento. É uma coisa democrática”, completa.
Já Gleidys Salvanha, diretora de mídia e atendimento da Publicis, lembra que as marcas de cigarro foram grandes anunciantes no passado, em uma época em que propaganda era muito focada em veículos como TV e revista. “Com a proibição da propaganda de cigarros, os veículos e as agências que tinham as contas das principais marcas do setor sofreram um grande impacto. Mas acho prematuro dizer que esse projeto resgataria, no curto prazo, a proporção investida pelo segmento em propaganda antes da proibição”, diz.
Para Gleidys, caso aprovada, a lei permitirá à indústria tabagista se comunicar com o público em formatos que são cada vez mais utilizados e têm mostrado grande eficácia nos planos de comunicação. “Sem entrar no mérito do julgamento sobre a propaganda de cigarros, acredito que a definição de regras para esse segmento pode estimular e profissionalizar o jeito que se investe em cultura hoje no País. Essas ações poderão influenciar outros setores no apoio cultural”, diz.
Questão de convenção
O assunto, como todo tema polêmico, provoca reações opostas. Há quem veja contradição na permissão de que as indústrias de cigarros façam ações institucionais com a publicidade das marcas estando suspensa. “A indústria do tabaco só fabrica cigarros. É óbvio que a publicidade institucional de uma empresa que só fabrica cigarros tem como objetivo melhorar a imagem do produto junto ao consumidor”, argumenta Adriana Carvalho, advogada da ONG ACT (Aliança de Controle do Tabagismo), que critica a postura flexível do governo no debate. “Estamos falando de uma empresa que fabrica um produto que mata metade dos consumidores regulares. Não dá para dissociar a imagem institucional do produto.”
Adriana realça que o Brasil assinou o tratado internacional Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco, que dispõe de diversas medidas que devem ser tomadas pelos mais de 170 países signatários com o objetivo de reduzir a epidemia do tabagismo. As advertências nos maços de cigarros estão incluídas entre as diretrizes da convenção, assim como o banimento total da publicidade de cigarros, o que, para a advogada, inclui a propaganda institucional. Por esses motivos, a ONG tem trabalhado junto a vários senadores para que este artigo da MP não seja aprovada.
“A interpretação de proibição da publicidade tem de incluir a institucional sim. Hoje a lei não fala nisso e as empresas têm atuado na brecha da lei”, avalia Adriana. Diretor de assuntos internacionais da ESPM, Ivan Pinto afirma que, se a MP virar lei, há realmente uma contradição em relação à Convenção-Quadro. Mas essa discussão, segundo Pinto, seria estritamente jurídica.
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