Pyr Marcondes
30 de maio de 2017 - 6h25
Vou roubar aqui descaradamente este tema do Eco Moliterno, que falou sobre a obsolescência de todos nós em excelente artigo publicado no Meio & Mensagem. O título do artigo do Eco é “Você é à prova de Futuro?”, que define e explica tudo já de cara. Você e o que você sabe fazer farão algum sentido no futuro? Se não, como ele conclui, “hasta la vista, babe!”.
O gancho é exponencialmente bom para o meu (mesmo) tema aqui e vou ter a arriscada e já inglória pretensão de levar o raciocínio do Eco um pouquinho mais adiante.
Meu foco será o “exponencial”, que citei acima, e que o Eco também cita como importante para ele em seu artigo, notadamente quando se lembra da frase que mais o mobiliza hoje, lida na home do site da Singularity University: “Be exponential”.
Uma primeira grande verdade inevitável sobre nós, nossos empregos e nossa capacidade de sermos ou não úteis no futuro: do jeito que somos, não seremos!
Para entender mais sobre exponencialidade leia o definitivo “Singularity is Near”, de Ray Kurzweil, a bíblia do assunto, mas o que é básico saber é que a aceleração de tudo em breve será tal, que com o repertório que temos hoje, não conseguiremos acompanhar as transformações iminentes pelo seu grau altamente diferenciado.
Nosso grau de obsolescência crescerá em nível exponencial nos próximos anos. Com nossas habilidades e conhecimentos atuais, ficaremos ou totalmente desnecessários ou parcialmente necessários em 10 anos. Pouco mais ou menos. Em 20, o que sabemos hoje não valerá praticamente nada. As profissões dos próximos 25 anos não existem ainda hoje, serão inventadas nos próximos 10. E na medida em que o tempo for passando, o gap vai aumentar.
Não se trata de um aumento linear ano a ano, mas de uma aceleração gradativa que assumirá a dimensão não mais geométrica, mas exponencial, de 2025 a 2045, quando, diz Ray Kurzweil, seremos meio homens, meio máquinas. Cyborgs.
Como você pode duvidar disso, vamos baixar a bola e voltar ao presente. Vejamos o exemplo de um profissional que conheço bem, o jornalista.
Jornalistas já enfrentam hoje um drama significativo não só porque os grandes grupos de comunicação e mídia tiveram que se adaptar à nova realidade e dispensaram massas de mão de obra, como também, por outro lado, a profissão vem se transformando bastante e as habilidades necessárias para um profissional da área há, digamos, 5 anos – o que nem é muito – já não são mais as mesmas de hoje.
Hoje, o jornalista que deseje caminhar razoavelmente na profissão deve conhecer bastante bem sobre redes sociais; sobre como disseminar a informação de forma mais eficaz no mundo digital, o que implica em noções básicas de tecnologia; deve saber como adaptar seus conteúdos ao Snapchat, Instagram, Pinterest, além dos hoje já clássicos Facebook e You Tube. Isso em vários devices, com grande crescimento do mobile.
Seria ideal que soubesse também fazer um “live”, que é, tendo um aparelho qualquer que grave imagens na mão, colocar reportagens ao vivo na rede. Tem que saber como analisar o dashboard de analytics do seu site para melhorar a performance de suas notícias em SEO. E por aí vai.
Há 5 anos não era preciso quase nada isso. Agora é. E parte considerável dos profissionais do setor não tem todo esse domínio. Resultado, perdem o emprego e jovens menos experientes, mas mais preparados para esse novo ambiente, ocupam seus lugares.
Só que também esses jovens já estão sendo desafiados por tecnologias como inteligência artificial, realidade aumentada e realidade virtual, para citar apenas algumas mais difundidas, que eles, apesar de jovens conectadões, ainda não dominam. Eles são jovens, mas já estão enfrentando sua própria obsolescência de forma precoce.
Para piorar, robôs hoje cada vez mais precisos e perfeitos, começam a produzir textos com qualidade humana e quem como eu assistiu palestras sobre isso no SXSW, entendeu que é uma questão de pouco tempo, quem sabe 5 anos, para essas máquinas terem forte impulso nas redações.
Resultado? Nem os jovens espertos que estão saindo da faculdade hoje ou nos próximos anos terão mais tantos empregos de jornalismo a disposição assim, porque sua profissão está sendo transformada de tal forma e com tal profundidade, que seu valor profissional de hoje corre o risco de passar a ser ínfimo em breve.
Isso é a exponencialidade em ação.
Não estou dizendo nem que o jornalismo vai acabar, nem que as máquinas substituirão os jornalistas completamente. Mas certamente parte dos postos de trabalho hoje ainda resilientes tenderão a ser reduzidos num futuro nada distante, porque uma nova lógica de produção de conteúdo estará vigente. E que os jornalistas sofrerão com isso, ah sofrerão!
Na verdade, não há área da atividade humana em que processos semelhantes não acontecerão e o Eco tem razão, assim como a Singularity University, de que a única forma de sobrevivência é ser também exponencial.
Bom, diante disso, o que nos resta fazer? Como ser exponencial?
Uma boa ideia é fazer um cursinho rápido na Singularity University (J). Mas há outras coisas à mão também.
A principal certamente é não aceitar a obsolescência e ter essa como uma premissa profissional radical, uma filosofia de vida. Há como fazer isso, sim, e há como não ser atropelado pela história acelerada que viveremos em futuro bastante próximo.
Se levarmos em conta que viveremos em média 100 anos, um cara de 60 como eu tem em tese ainda uns 40 de vida pela frente e nada poderia, também em tese, me impedir de adquirir os conhecimentos necessários para viver pelo menos 20 ou até 30 desses anos profissionalmente ativo. Desde que eu me prepare para eles com a realidade que descrevi acima e saindo da minha zona de conforto, que é o conhecimento que eu tenho e me basta hoje.
Serei facilmente despedido e substituído em breve se meu arsenal diante do futuro for apenas o que eu sei agora. Ganho no entanto novas perspectivas de sobrevivência profissional se incorporar novas disciplinas, conhecimentos e habilidades em meu repertório nos próximos 5 anos, ou menos.
Basicamente, eu preciso saber muito mais do que sei hoje e saber fazer coisas que os outros jornalistas não sabem. E se sabem, tenho que fazer melhor do que eles. Mais que isso, preciso dominar ambientes de produção e distribuição do meu trabalho em permanente mutação. Preciso ainda conhecer muito bem as novas plataformas do jornalismo totalmente embedado pelo tecnológico.
Não é agradável ler o que estou escrevendo aqui e todas as vezes que converso com pessoas sobre isso sinto uma profunda (e genuinamente compreensível) reação adversa ao tema. Este texto aqui, ele mesmo, não deverá ter alto índice de leitura, porque as pessoas em geral fogem dessas realidades cruas, uma vez que essas realidades lhes negam a ideia de prosperidade mais facilmente possível, colocando barreiras onde elas desejariam nirvanas.
Não haverá nirvanas daqui para a frente no âmbito das profissões. O fantasma da obsolescência acelerada bateu definitivamente em nossas portas e ignorá-lo será assombrar sua própria viabilidade profissional futura.
Meu conselho? Comece lendo muito sobre exponencialidade e suas manifestações. Depois, entenda melhor seus gaps profissionais e veja para onde aponta o futuro da sua atividade. Entenda que tecnologia será uma segunda pele para todas as profissões e, creia você ou não, máquinas poderão substituir aquilo que você faz hoje, na maior parte das vezes com ganhos de assertividade e produtividade. Fora a rentabilidade (para quem te emprega).
Se você tem habilidades criativas e trafega em áreas em que a originalidade e a inventividade humanas são o motor, como no caso do Eco, você está um pouco mais protegido, já que as máquinas possivelmente nunca serão tão criativas como os homens (quer dizer, sei lá!). Mas ainda assim, novos conhecimentos avançados que o preparem para um mundo em que, por exemplo, robôs criarão campanhas de publicidade ou até planos estratégicos de marketing (já existem alguns fazendo isso) seguem sendo necessários. Você terá que ser e fazer mais do que eles.
As áreas analíticas, como o jornalismo interpretativo e opinativo, por exemplo, estão igualmente mais preservadas, mas também elas terão que se adaptar a um mundo novo em que opinião é o que mais existe e ter a sua própria virou uma commodity digital. Para que você se destaque das máquinas e da galera do Face, você tem que ser único. E de fato fazer a diferença. Só que isso não é fácil.
Bem-vindo a era do emprego afrontado pela exponencialidade. Esse será seu (único) futuro.