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O Presidente, o VPzudo e o paradoxo do publicitário

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O Presidente, o VPzudo e o paradoxo do publicitário

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PEDRO GRAVENA
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O Presidente, o VPzudo e o paradoxo do publicitário

Dando sequência a uma discussão que lançamons ontem aqui sobre tecnologia e criatividade na nossa indústria, este artigo do Pedro Gravena joga mais luz sobre o debate: "Acredito que o Brasil é o único país com a possibilidade de fazer a criatividade casar com a tecnologia ".


22 de maio de 2018 - 7h26

 

 

.

Por Pedro Gravena (*)

 

Depois de 20 anos trabalhando em grandes agências, conquistando prêmios e reconhecimento, comecei a sentir a distância entre o discurso e a prática. No discurso

tudo estava bonito, mas na prática a propaganda estava se distanciando cada vez mais das pessoas. Sem conseguir relevância, a comunicação seguia num discurso lindo e eu fiquei com duas opções: ou deixar quieto e fingir que a prática era tão bonita quando o discurso, ou correr o risco de fazer do jeito que acredito, e talvez virar mais um de sonhador irresponsável, que viraria estatística entre os 80% dos empreendedores brasileiros que fecham seu negócio depois de um ano.

 

 

Pulei na parte da prática e estava decidido em abrir a agência. Porque realmente acredito que o Brasil é o único país com a possibilidade de fazer a criatividade casar com a tecnologia e assim fazer o nosso trabalho voltar a ter utilidade concreta na vida das pessoas. Me joguei e nasceu a Mosh.  Mas não

sem sofrer e (quase) voltar a acreditar no discurso 🙂

 

Essa história que conto agora, aconteceu em 2017 alguns meses antes de abrir a Mosh

Me mostrou um caminho muito claro, espero que mostre algo pra vocês também.

 

 

Presidente de uma grande agência:

Estamos usando ao inteligência artificial pra fazer várias coisas bacanas aqui. Temos parcerias incríveis e alguns jobs fantásticos estão na ponta da agulha. Isso vai mudar toda maneira de criar. Usar dados muda tudo. Quero que os dados sejam a principal fonte criativa da agência. Tecnologia, sabe. Eu quero a tecnologia no centro de tudo aqui. Vem trabalhar aqui com a gente.

 

Eu:

Pô legal heim e como vai ser isso?

 

Presidente de uma grande agência:

você vem pra cá, e juntamos mais 3 pessoas num departamento aqui dentro e começamos.

 

Eu:

Parece interessante, vou dar uma pensada na proposta e te ligo.

 

Voltei pra casa. Empolgado. Fiquei espantado em como aquele cara que eu via soltar trabalhos tão rasos, poderia ter um pensamento tão avançado. Era incrível. Algumas coisas eu até discordava, mas estava tudo ali.

Falei com minha mulher, e ponderamos juntos que talvez fosse o caso de desistir de abrir agência.

Afinal esse gigante estava disposto a fazer grande parte do que a Mosh se propunha.

Valeria a pena tentar abrir algo semelhante, sabendo que ele ia fazer quase o mesmo, só que numa escala 1000 vezes maior?

 

No mesmo dia  dois caras que admiro muito me ligaram:

 

Eles:

 – cara vc tem que conhecer o VPzudo da agência Gigantástica. Ele tem ideia incríveis! Parece muito com tudo o que temos conversado há anos. Tecnologia criativa, sabe? Ele quer ver a Gigantástica, trabalhando tecnologia como ferramenta de criação, tecnologia no nascedouro, na ideia. Sabe? Achamos que você deveria falar com ele. Pode surgir alguma coisa aí.

 

Eu:

 – Quem? O VPzudo? Certeza? Esse cara não é aquele que todo mundo fala que ainda está trabalhando nos anos 90, métodos antigos, valores ultrapassados? Certeza?

Eles:

Certeza cara ele é incrível, você precisa conhecer. Não abre nada sem antes falar com ele!

 

Eu:

Parece interessante, vou dar uma pensada e ligo pra ele.

 

Parei pra dar uma pensada:

 

Espera aí, se esse tal VPzudo tem ideias tão maravilhosas porque eu não vejo nada em prática? Só video manifesto?

E 3 pessoas? 3 Pessoas num departamento separado vão mudar a agência inteira senhor Presidente? Esquisito.

 

 

Uma paradinha a mais pra pensar:

 

Mas como?

Como o que eles fazem era tão distante de como pensam?

Se eles estavam falando tudo o que eu queria ouvir? Por que a prática era outra?

 

 

Demorei um pouco até entender onde estava o problema: é a distância do discurso na prática. Eles até falam tudo o que eu quero ouvir, mas não verdade não acreditam. Quer dizer, até acreditam, mas não com o empenho necessário para mudar. Acreditam apenas o suficiente para contratar meia dúzia de pessoas, ou acreditam o suficiente para fazer mais um vídeo manifesto agora, e esperar para colocar tudo isso em prática entre o manifesto do final de ano e o do Carnaval. Quem sabe Cannes? Em Cannes rolam essas coisas diferentonas, né?

 

Nunca mais liguei para o Presidente e, até hoje, não quis conhecer o VPzudo. Fui correr atrás do meu sonho e estou vivendo a dura realidade de uma startup, com poucos e bons parceiros focados na inserção da inovação na Comunicação. Estamos nos associando a outros empreendedores que não entendem nada de Propaganda, mas colaboram com tecnologia de ponta, afinal no código não existe escrever uma coisa e a máquina fazer outra 🙂

 

Levando o pensamento para muito além do nosso mercado, no livro “Vícios Públicos, Benefícios Privados”, do Eduardo Gianetti, aprendi o que significa o paradoxo brasileiro. O paradoxo do brasileiro é o seguinte: cada um de nós, isoladamente, tem o sentimento e a crença sincera de estar muito acima de tudo isso que está aí. Ninguém aceita, ninguém aguenta mais, nenhum de nós pactua com o mar de lama da nossa vida pública. O problema é que, ao mesmo tempo, o resultado final de tudo o que fazemos é exatamente isso que está aí.

 

Então me aproprio do termo criado por Giannetti para falar do “paradoxo do publicitário”. Todos nós, entendemos que a comunicação está num momento de transformação, ninguém aguenta mais antigas práticas de abuso moral, trabalho excessivo, discussões irrelevantes para o poder da ideia, um mercado que vê a tecnologia como um alienígena conversando com uma pedra. O problema é que, ao mesmo tempo, o resultado final de tudo o que fazemos é exatamente isso que está aí.

 

O problema é que fazer, mudar, é muito difícil . Mas no discurso, bom no discurso é sempre mais fácil.

 

(*) Pedro Gravena é sócio fundador e CEO  da Mosh

 

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