Como a criatividade pode resistir ao autoritarismo
Pela primeira vez, festival recebe um palestrante da Georgia, que denunciou repressão ao meio criativo no país em meio à influência russa
Como a criatividade pode resistir ao autoritarismo
BuscarPela primeira vez, festival recebe um palestrante da Georgia, que denunciou repressão ao meio criativo no país em meio à influência russa
Roseani Rocha
23 de junho de 2025 - 6h00
Futebol tem sido um dos meios para propagar o sentimento de resistência (Crédito: Reprodução)
Pela primeira vez um palestrante da Georgia, pequeno país que já foi uma república soviética e fica entre a Rússia e a Turquia, colocou os pés num palco do Cannes Lions. Isso aconteceu no último dia do festival, com a presença de Vato Kavtaradze, creative chairman da Windfor’s, que se apresentou com Salome Asatiani, jornalista da Radio Free Europe/Radio Liberty.
“Estou feliz por estar aqui, mas o tópico pelo qual estamos não é algo para ficarmos felizes”, começou Kavtaradze. Depois, exibiu fotos de dezenas de pessoas que chama de “Prisoners of conscience”, explicando que muita gente anda sendo presa em seu país – principalmente profissionais das indústrias criativa, cultural e do jornalismo – porque o governo atual resolveu se alinhar ao autoritário regime russo de Vladmir Putin.
A dupla explicou um pouco da história da Georgia, para ressaltar sua origem diversa, influenciada por culturas tão distintas quanto a dos romanos, mongóis e árabes. Mas essa história tem sido marcada por lutas recorrentes pela independência. Nesses respiros, disseram, o país se mostra progressista. No curto período da primeira república do país, entre 1918 e 1921, por exemplo, mais especificamente em 1919, seis mulheres foram eleitas no parlamento. E havia ali uma cena cultural ativa.
Mas em 1921, esse ciclo foi interrompido pelo regime bolchevique e, mais recentemente, a Rússia ocupou 20% do território do daquela nação e tem voltado a impor seu mindset “de corrupção e crime”, nas palavras do criativo, apoiada por um governo que cortou relações com a União Europeia.
Mas ele ressalta que as pessoas estão percebendo que o momento atual é crucial e têm ido às ruas prostestar, daí também a quantidade de prisões. “No centro desse protesto há muitas formas criativas de como nos manter unidos, defender o humanismo e resgatar um passado político diferente. O que estamos propondo é uma resistência criativa”, argumentou Salome.
E a criatividade tem sido aliada na luta para inspirar a resistência. Um exemplo foi um case para a Georgian Footbal Federation, que envolveu a mudança de uniformes locais com mensagens que fazem referência à essa resistência. Com isso a intenção foi passar de carregar uma mensagem “from few to fields”, ou de poucos para as multidões dos estádios. “Vamos vencer essa luta”, era a mensagem final do vídeo.
A jornalista da Radio Free diz que a luta é por parte da mente das pessoas quando a história de perseguição ao meio criativo e jornalístico se repete num contexto em que o que definiram como uma frente totalitária internacional, com nomes que vão dos governantes da citada Rússia até à China e mesmo os EUA, se espalha como uma metástase, escalada pelo narcisismo masculino (último ponto ressaltado por Salome).
No principal fórum global da publicidade, as mensagens não pouparam a plateia de uma avaliação crítica: “O mundo consumista torna mais fácil comprometer valores morais, especialmente para nós da indústria criativa”. Por outro lado, é nessa mesma indústria que Kavtaradze e Salome se apoiam para levar adiante sua mensagem de resistência no que chamam de “uma guerra mundial por valores” em curso, em que estão em oposição os autocratas do mundo e as mentes criativas.
Nesse sentido, dizem, todos podem participar, inclusive pela facilidade do ativismo na batalha online. “Tomem um partido e façam do mundo um lugar melhor”, pediram.
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