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Recados da Lava-Jato ao mundo corporativo

Quem acredita que a operação envolvendo a Eldorado Brasil respinga somente na JBS, gigante na produção de proteína animal, precisa ampliar seu foco de visão


4 de julho de 2016 - 15h29

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Equipe da Polícia Federal deixa sede da JBS na última sexta-feira, 1o de julho (Crédito: Futura Press / Folhapress )

Quanto maior uma empresa, maior o número de públicos diferentes com os quais ela precisa lidar, ou os chamados “stakeholders”. O governo é certamente um desses públicos, visto que todas as empresas operam em mercados que estão dentro de uma organização (ou desorganização) política. Até onde vai esse relacionamento é que é a questão. Há algum tempo, a JBS vinha enfrentando questionamentos sobre o alto envolvimento da companhia com o Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES) e, desde 2013, lida também com boatos de que um dos filhos do ex-presidente Lula estaria entre os “donos” da Friboi. A empresa chegou a criar uma plataforma online para rebater esse tipo de críticas e a situação aparentemente havia acalmado.

Mas na última sexta-feira, 1º de julho, a JBS voltou à mídia. Uma nova fase da operação Lava Jato, com base na delação premiada de Fábio Cleto, ex-vice-presidente da Caixa Econômica Federal, envolvendo esquema de propina para liberação de recursos do FI-FGTS, tinha como alvo a Eldorado Brasil, empresa de celulose da J&F Investimentos, holding que controla a JBS. A sede administrativa de todas as empresas fica no mesmo complexo, na Vila Jaguara, em São Paulo, o que facilitou ainda mais a percepção de tudo como uma única coisa.

Até que ponto essa nova operação trará prejuízos à marca JBS e às demais que atuam sob esse guarda-chuva, como Friboi, Seara e Swift, entre outras? Daniela Khauaja, coordenadora acadêmica de pós-graduação da área de marketing da ESPM, acredita que a empresa tem um grande problema do ponto de vista B2B, ou em sua relação com fornecedores e investidores, por exemplo, mas tem mais facilidade de contornar a crise no que diz respeito a proteger suas marcas de produtos. “Eles têm que trabalhar muito bem para isolar esse problema das marcas que estão no mercado. E isso é mais viável”, afirma. Para Daniela, o consumidor não vai deixar de comprar um produto porque o presidente do conselho da empresa possa ser preso. Uma contaminação na carne seria algo, do ponto de vista do consumidor, muito mais grave.

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Repercussão no B2B, segundo especialistas, é pior que junto às marcas direcionadas ao consumidor final (Crédito: Divulgação)

Sobre a resposta inicial dada pela JBS à operação da última semana, a professora avalia como “muito econômica”. Mas ressalta que o comunicado curto possa ser atribuído ao impacto inicial do evento, ocorrido no fim da semana e que respostas mais elaboradas podem vir no decorrer do caso. “O comunicado não foi ruim, mas protocolar. Não falar nada já não é mais uma opção às empresas. Do ponto de vista da marca, é muito importante se comunicar de forma muito clara. Dizer que o problema é relativo à empresa tal, para não deixar a história crescer”, analisa.

Rodolfo Araújo, diretor de pesquisa e branding da Edelman Significa, também concorda que o silêncio seria “negativamente mais eloquente”.  O executivo destaca o fato de que seja no Brasil seja no exterior há um panorama geral de radicalização da transparência. Fatos como o acontecido na última semana, diz Rodolfo, acendem o sinal de alerta para todas as empresas ao fato de que hoje não basta ser uma companhia de grande porte, ter bons produtos e saúde financeira. “Cada vez mais as pessoas não vão olhar para marcas e empresas de forma despersonalizada, ainda mais em um País com crise de representatividade. Nesse contexto, os CEOs serão mais cobrados por seu comportamento. Sai aquele que entrega resultado financeiro e entra o que é também responsável pelo comportamento geral da empresa”, avalia.

O executivo aponta cinco aspectos que devem ser observados/vividos pelas empresas atualmente: integridade (ética e transaparência nas práticas de mercado), engajamento (quanto diálogo estabelece; relação além do consumo com todos os stakeholders), propósito (olhar para temas socialmente relevantes); bons produtos e serviços (condição sine qua non); performance operacional (dividendos, lucros, resultado financeiro).

Outro desafio da citada radicalização da transparência é que ela muda a prática da gestão de crise em si, que precisa ser uma gestão de reputação em tempo real.  O executivo da Edelman lembra que globalmente já houve momentos dramáticos na história das marcas, como o caso da Enron, que chegou a faturar US$ 100 bilhões e sumiu, após ter escândalos financeiros comprovados. As marcas, destaca, estão expostas hoje de uma maneira sem precedentes. Quanto aos fatos ocorridos na última sexta, Rodolfo espera ainda um saldo positivo. “Espero que tudo isso traga benefícios à população, na maneira de as empresas fazerem negócios e em suas medidas de governança. É o papel das lideranças; os executivos têm que entender que suas agendas são cada vez mais ampliadas”.

Já a visão da professora Daniela Khauaja é um pouco menos otimista. O caminho que as empresas deveriam tomar é o da transparência, mas esta é justamente o problema do momento. “Se eu fosse consultora da marca, recomendaria reconhecer eventuais problemas e deixar claro que está adotando uma nova governança. Mas é muito pouco provável que isso vá acontecer”, diz a coordenadora da pós-graduação da ESPM.  Diante do cenário atual, não apenas em relação à JBS, ela defende um trabalho institucional de longo prazo e envolvendo várias empresas para que haja uma mudança efetiva na cultura corporativa brasileira.

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