Macacos nada entediados: decifrando o marketing da BAYC
O que podemos aprender com a estratégia de marca da Bored Ape Yatch Club, empresa sensação do universo Web 3 avaliada em US$ 4 bilhões
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Você pode acreditar ou não no potencial das NFTs (non-fungible tokens), mas com certeza já viu por aí a imagem colorida de um macaco estampada no perfil de rede social de alguma celebridade. A lista dos que pagaram milhões de dólares por uma dessas figuras é longa e vai de Neymar a Justin Bieber, passando por Paris Hilton, Jimmy Fallon, Post Malone e mais recentemente Madonna, entre outros.
Trata-se do fenômeno Bored Ape Yacht Club (BAYC), uma das coleções de NFTs mais populares da atualidade. Criados por um algoritmo que combina 170 características de maneira aleatória, seu lote inicial com imagens de macacos em diferentes looks e situações se esgotou rapidamente e colocou a empresa no centro das conversas relacionadas ao tema. Agora, com um aporte de US$ 450 milhões, a empresa alcança um valor de mercado de impressionantes US$ 4 bilhões. Tudo isso em menos de um ano de existência.
Naturalmente, a curiosidade que surge é como se constrói uma marca tão relevante, em tão pouco tempo, num ambiente e modus operandi pouco conhecido de Web 3 (descentralizada, baseada em blockchain, quase a nova internet)? E mais: o que ela pode ensinar a profissionais com a cabeça Web 2?
Fui entender a estratégia da BAYC e a primeira resposta é que muito do que eles fazem tem espelho na lógica de construção de marcas atual, só que adequadas a este novo universo. Uso de celebridades, lógica de escassez, formação de uma comunidade e a criação de uma utilidade real para o ativo estão entre as iniciativas adotadas.
Vamos começar com as celebridades. No caso do BAYC, dezenas delas, ao redor do mundo, com um papel bastante relevante para o awareness, geração de desejo e posicionamento de uma marca até então desconhecida do mainstream. Eu mesmo só fiquei sabendo da existência da coleção quando li uma notícia de um famoso que havia comprado uma das imagens – e, claro, achei absurdo o valor pago. Se fosse só esse o papel das celebridades, já faria sentido.
Agora, imagine o seguinte: e se esse exército de celebridades não só NÃO tivesse cobrado cachê como pagasse para estrelar uma campanha da sua marca? Foi o que aconteceu. Esses famosos pagam milhões de dólares para comprar suas imagens exclusivas dos animais e ainda fazem questão de mostrar pro mundo inteiro que as compraram. De graça. A maioria inclusive estampa seus macacos na parte mais nobre de suas redes sociais, na foto de perfil. É o sonho de qualquer profissional.
Isso acontece pelo posicionamento que a marca conseguiu comunicar ao mercado. Ao contar ao mundo que detém um dos Bored Apes, as celebridades estão, na verdade, mostrando que estão por dentro do que há de mais cool e disruptivo no universo de arte pop da atualidade. Não basta fazer parte, preciso que todos saibam disso. Além desse status, ter o seu próprio macaco entediado ainda te coloca como parte de um grupo exclusivo a quais meros mortais não têm acesso.
Esse, inclusive, é o segundo elemento do marketing tradicional que essa empresa explora com maestria. Na prática, não é só a compra de um JPEG de um macaco, é a porta de entrada para uma comunidade exclusiva. Um grupo ativo e formado apenas pelos detentores dos Apes que tem acesso a eventos físicos e digitais, merchandising da marca, troca de criptomoedas e games. Todos eventos foram sold out e, claro, com cobertura feitas pelas próprias celebridades participantes em suas redes sociais, gerando mais desejo e retroalimentando o sistema. A marca foi muito feliz ao anunciar um roadmap das experiências que estavam por vir, criando frenesi antecipado em torno do calendário. Uma aula de criação e, o mais importante, manutenção de uma comunidade e o uso disso como mecanismo de aquisição e retenção de clientes.
Ao entender que a compra de uma das imagens traz esse tipo de valor agregado, a marca tenta transcender a dinâmica da “NFT fútil”, dando utilidade prática ao ativo. Ser um membro do BAYC te oferece a possibilidade de trocas de experiências e geração de negócios entre os membros. São cada vez mais frequentes histórias como essas, a partir de conexões surgidas na rede.
Se não bastasse, a marca permitiu que seus membros explorassem comercialmente as imagens de seus Apes, trazendo a possibilidade de um ganho real para seus membros que passam a poder monetizar seus ativos. Essa é uma diferença brutal em termos de dinâmica de consumo que se assemelha muito mais à aquisição de uma ação de uma empresa do que a compra de um agasalho ou boné. É a diferença entre ser um consumidor passivo e um sócio que ganha à medida que o bolo cresce (um pouco do que o Nubank tentou fazer em seu IPO, em certa medida). Além disso, o time de marketing ganha o reforço de milhares de membros, trabalhando ativamente na construção coletiva dessa marca.
Tudo isso reforçado por uma lógica de escassez que gerou um enorme senso de urgência entre consumidores. São apenas 10 mil exemplares da coleção, todos únicos, que vêm sendo paulatinamente ampliados por novas coleções que estão sendo lançadas (ex: há alguns meses o BAYC lançou um soro que transformava os 10 mil exemplares originais em macacos mutantes, dobrando o tamanho da coleção e criando o MAYC – Mutant Apes Yatch Club). Pode parecer muito, mas projete isso numa escala global. O FOMO em torno do item foi real entre o target da marca. Compre logo ou vai ficar sem! Por ser um ativo em quantidade limitada, quanto mais as pessoas demandam, mais o preço sobe e isso aumenta no valor de mercado de todos os detentores. De novo, consumidores ou shareholders?
O BAYC agora promete ir muito além e deixar de ser apenas uma NFT para ter, entre outras coisas, seu próprio metaverso. A porta de entrada serão os games. Quais serão seus próximos passos exatamente, ninguém sabe, mas com certeza tem alguém ali que está sendo muito feliz em adequar as melhores práticas da Web 2 ao universo Web 3. Seguimos acompanhando.
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