Por que uma pesquisa que todo mundo já sabe o resultado também é resultado?

24 de janeiro de 2023 - 15h00

Todas as pesquisas estão certas e esta é a grande novidade. (Crédito: Shutterstock)

Pouco tempo atrás produzi uma pesquisa sobre a realidade da população negra aqui no Brasil. Muita gente me disse que uma pesquisa como essa não iria trazer muitas novidades porque um monte de pesquisa já havia sido feita sobre este mesmo assunto.

O que é verdade. Nunca se viu tantas pesquisas publicadas sobre os pretos e/ou pardos como nesse último ano. Mas resolvi fazer de qualquer jeito.

Perguntei nesta pesquisa se: você acha que o negro (negra) tem mais dificuldade em arrumar emprego do que o branco? Responderam sim, para 84% dos perguntados a resposta era sim. Perguntei também: os negros são tratados com maior ou menor justiça por ser negro (negra)? Menor justiça 81%.

Mais uma questão sem nenhuma novidade. Perguntei também: Na hora de entrar em um restaurante, é melhor ser uma pessoa negra ou uma pessoa branca? Ser branca 57%. De novo, algo previsível.

Todas as pesquisas estão certas. E esta é a grande novidade.

Tanta pesquisa nunca é demais. Todas elas são sobre o mesmo tema, mas possuem olhares diferentes, suscitam questões diferentes, revelam realidades diferentes e servirão para elucidar questões diferentes, no caso, as que interessam a quem a promoveu. No caso, nossa investigação era sobre mercado de trabalho, por isso partimos de aspectos mais amplos e depois para as mais específicas.

Vamos a esta pergunta: Quando existe uma promoção no trabalho e na disputa há uma pessoas branca e uma pessoa negra, qual você acha terá mais chance de ser promovido? Branca 71%.

Mais uma vez nenhuma novidade, apenas a constatação. Mas isso também prova que as pesquisas estão corretas. Mas não é só isso. Na hora que você lê uma pesquisa, tem que ler todas as pesquisas que fazem parte deste ecossistema, tem que ler portais, jornais e assistir vídeos para ampliar e consolidar a interpretação desta pesquisa. E todo esse reflexo do tempo em que vivemos precisa estar contido na sua apresentação.

Mais uma pergunta desta mesma pesquisa: na hora de ser contratado para um emprego, ser negro (negra) ajuda ou atrapalha? Atrapalha 48 %.

Mas por que devemos ler pesquisas que, supostamente, já conhecemos o resultado?

Primeiro, para entender se a opinião publica está mudando com o tempo. Qualquer povo muda de opinião. E, no mundo de hoje, muda mais facilmente e rapidamente. É só lembrarmos as pesquisas eleitorais de outubro de 2022, cujos resultados oscilavam em menos de uma semana. Ou seja, precisamos entender a variável tempo.

Segundo, devemos levar em conta o porquê de existirem tantos institutos fazendo uma mesma pesquisa, para os mais diversos clientes. No caso da questão negra é porque se tornou urgente que o assunto seja tratado pela sociedade brasileiro. Isso é um dado importante na leitura das pesquisas.

Terceiro, uma pesquisa pode inspirar uma outra pesquisa sobre o mesmo tema. E aí podemos nos aprofundar mais no assunto ou num recorte deste assunto, ainda inexplorado.

Quarto, podemos entender melhor as generalizações. O que significa isso? Conceitos e proposições que perpassam todas as pesquisas, e como um dado geral se correlaciona com um dado específico.

Uma ótima inspiração para leitura de pesquisa isso são os livros de best-sellers de não ficção do canadense Malcolm Gladwell. Como unir pontos e pular obstáculos teóricos. Ou seja, vá atrás de mais informações do que aquelas contidas na sua pesquisa. A riqueza, quem sabe o inusitado, está em ler um maior número de dados, apesar de você achar que já sabe o resultado

Lembrem-se: uma pesquisa é sempre um ponto de partida, nunca uma linha de chegada. Ela é instrumento. Quem pesquisa, normalmente quer entender um problema para então resolvê-lo. E as empresas que responderem a questões cruciais como as do tema da pesquisa mencionada neste artigo, estarão um passo à frente.