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27 de julho de 2018 - 7h37
Por Marcelo Trevisani (*)
A transformação digital já é uma realidade. Toda a sociedade contemporânea está cada vez mais conectada. Estamos interligados por redes profissionais, sociais, digitais e isso está mudando não apenas a forma como nos relacionamos, mas o modo como empresas e negócios se fundamentam. Grandes e pequenas companhias precisam entrar na era digital, alinhando-se com um cenário em que a tecnologia muda a dinâmica dos mercados, gerando transformações constantes a uma velocidade nunca antes vista.
Somente em 2019, segundo estimativa do International Data Corporation (IDC), companhias globais gastarão US$ 1,7 trilhão para levar seus negócios para um novo patamar no processo de transformação digital.
Diante disso, todas as estruturas empresariais são atingidas e precisam se redefinir, do operacional ao estratégico. No marketing, entretanto, diferentemente de outras áreas, não temos mudanças de fundamentos. Os pilares seguem os mesmos. A grande diferença estará no modelo de atuação e, logo, nas competências e no perfil de seus líderes.
Frente à transformação digital, precisamos redesenhar a maneira como o processo de trabalho como um todo é conduzido. O que sempre moveu o marketing (campanhas, prêmios, glamour) perde espaço para ações continuadas, que estimulem a experimentação e o aprendizado rápidos com foco no cliente. Como diz Jeff Bezos, CEO da Amazon, “você pode ser um competidor focado no concorrente, pode ser focado no produto, pode ser focado na tecnologia, pode ser focado no modelo de negócios e muito mais. Mas, na minha opinião, o foco obsessivo no cliente é de longe o modelo mais protetor… ”
A nova complexidade operacional exige equipes multidisciplinares e multiprofissionais e, logo, uma liderança capaz de fomentar a colaboração e levar todos para um caminho comum. Assim, o chefe autocrático abre espaço para um líder capaz de rever de maneira contínua as estratégias, táticas, objetivos, metas, timings, formatos.
Acha exagero? Saiba que isso já é lugar comum nos EUA. Por lá, um relatório da Forrester mostrou que, em 2017, pelo menos 30% dos CEOs confirmaram que demitiriam seus CMOs por “não reunir o conjunto de habilidades pessoais que precisam para promover a transformação dos negócios digitais”.
Outra pesquisa, desta vez do Capgemini Digital Transformations Institute Survey, mostra que as empresas já estão atentas a isso, fazendo exigências nesse sentido no formato de soft skills. Colocar o consumidor no centro das preocupações, paixão por aprender, colaboração e capacidade de decidir são pré-requisitos não atendidos para 65%, 64%, 63% e 62% das companhias, respectivamente.
Recentemente, a queda de Martin Sorrell do cargo de Chief Executive da WPP mostrou que não basta só conhecer a “cartilha” da transformação digital. O homem que disse “Nosso negócio não é mais de comunicação. É de tecnologia.”, deixou o comando do maior grupo de comunicação do mundo sob acusações de utilização indevida de recursos, mas também de não saber aplicar o que ele próprio profetizou.
Por onde começar
A transformação digital e tecnológica afeta todas as cadeias de negócio de todas as economias do mundo, trazendo novas oportunidades para empresas que podem adotar a tecnologia com rapidez suficiente. Ela muda a forma de produção, os canais de distribuição, os modelos de negócio e, principalmente, a forma como os clientes experimentam produtos, serviços e o que eles valorizam.
Quem consegue entrar no jogo acelera o time-to-market, reduz custos e desbloqueia novos fluxos de receita. Por outro lado, nesse momento – quando os consumidores migram ou se afastam de uma marca devido à má experiência -, só cresce exponencialmente quem tem o foco no consumidor, entendendo não apenas seu mix de canais, mas sua relação em múltiplos touchpoints on e offline.
Para isso, a área de marketing precisa ter excelência operacional para entregar mais valor de forma constante e ágil, aumentando significativamente o retorno dos negócios. Isso só é possível se começarmos por reconhecer que o digital não é apenas mais um canal. É uma forma de pensar e agir. Como disse Satya Nadella, presidente da Microsoft, toda empresa será de tecnologia no futuro.
Ser digital exige aprender muito rápido para corrigir rotas sempre que o consumidor precisar, deixando a “era de vender” para trás e abrindo espaço para a “era de ajudar a comprar”. É estar apto a trabalhar com ciclos rápidos, em um processo muito próximo do desenvolvimento ágil, no qual você precisa constantemente fazer testes e experimentos, aprendendo com eles para qualificar o próximo sprint.
Ser digital é buscar, organizar e analisar dados, usando a tecnologia a favor do seu consumidor. É repensar o negócio, não como um mix de produtos ou serviços, mas como parte de um ecossistema de valor que seus clientes podem ou devem acionar de acordo com as necessidades e desejos deles.
Tudo isso exige organizar o ecossistema do marketing em torno de um processo contínuo e eficiente de criação de vivências de marca para todos os seus stakeholders. Nesse novo modelo, perguntas como “qual é a nossa estratégia de produtos? Qual é a nossa estratégia de vendas?” desaparecem para dar lugar a “qual é a nossa estratégia de experiência do cliente? Como vamos usar todas as outras estratégias para entregar valor?”.
Outra mudança primordial na mentalidade do executivo de marketing é o fim dos silos. As equipes não podem ser separadas por grandes canyons. Precisam trabalhar em conjunto para o entendimento do cliente e da jornada do consumidor, reconhecendo que todos os meios (PDV, mídias sociais, site, mídia tradicional, call center) têm papéis diferentes, mas precisam estar interconectados. Eles precisam ser entendidos como parte de uma mesma jornada e são fundamentais para impactar, estimular e engajar seu público de forma personalizada, garantindo a qualidade da experiência em todos os pontos de contato e melhorando a entrega de valor.
Resultado = ganhos
Apesar de tudo que foi exposto até aqui, é importante frisar que Digital Business não é apenas Customer Experience. Nesse novo cenário, o marketing é a ponte entre o que os clientes esperam e o que eles realmente recebem.
Ou seja, o marketing “do futuro” (entre aspas porque o futuro já chegou) é cada vez mais uma maneira de impulsionar agilidade e retorno para o negócio, sempre com foco nas necessidades e desejos do consumidor. É a busca por entregar exatamente o que seu público quer, na velocidade que o mercado exige, que resulta em aumento das vendas e, logo, do faturamento. O digital também torna os colaboradores mais produtivos, promove processos mais enxutos e maximiza ganhos.
Mas, para realizar a transformação digital, é urgente adotar a mentalidade “always beta”. Falhando cedo, rápido e muitas vezes, você desafia conceitos, gerando uma circular de inovação e aprendizado.
Para fazer isso, o ideal é começar em pequena escala. Faça testes e experimentos com um segmento específico de clientes ou de produtos. Aprenda a melhorar e trazer retorno dentro dessa iniciativa, entendendo quais são os desafios, os processos, os dados disponíveis. Quando o micro estiver dominado, escale.
Estamos prontos?
Essa nova realidade exige mudanças profundas e rápidas de quem está no comando. Tenho feito reuniões com líderes de marketing de empresas dos mais diferentes segmentos sobre transformação digital e vejo todos preocupados em promover essa mudança, seja de uma perspectiva funcional ou de negócios. Por outro lado, não percebo uma preocupação em alterar sua postura ou mindset frente a esse desafio.
Mesmo reconhecendo esse novo momento, o mais comum é vermos suas equipes ainda recebendo e atendendo às demandas tradicionais com soluções usuais. Infelizmente, para esses profissionais, tenho que dizer: seu prazo está se esgotando! Em pouco tempo, só continuará no mercado quem conseguir fazer da transformação digital um ponto de virada profissional e não um projeto com começo, meio e fim. É necessário entender isso como um processo que se inicia e evolui de forma constante, se adaptando aos contextos e problemas que estão por vir.
Um estudo da Technology for Marketing (TFM) e da Smart Insights, apontou que 40% profissionais de marketing não têm planos de executar um programa de transformação digital e 30% planejam fazer isso no futuro. Apenas 21% já implementaram algo do gênero.
A maior mudança a se ter em mente é a velocidade da mudança. Não há tempo para resisitir. É preciso mudar sabendo que o que irá determinar quem segue no jogo é a capacidade de encarar o choque, aprender e se adaptar rapidamente.
(*) Marcelo Trevisani é CMO da CI&T