Opinião
Não há futuro em diversidade e inclusão sem a economia do cuidado
Mulheres são excluídas do mundo do trabalho, mas geram riqueza 24 vezes maior que a do Vale do Silício
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16 de junho de 2021 - 8h00
O cuidado é um trabalho essencial: todos nós precisamos dele para existir e, se hoje você é uma pessoa adulta, é porque alguém já cuidou de você. No entanto, este trabalho ainda é invisível e mal remunerado. Executadas majoritariamente por mulheres, as tarefas com a casa, a comida, a roupa, as crianças, os idosos, os doentes não hospitalizados e as pessoas com deficiência se sobrepõem à jornada de trabalho, ao ensino a distância e à carga mental da gestão que tudo isso envolve. O resultado: as mulheres estão exaustas e a pandemia só escancarou ainda mais este problema.
Mas como seria o mundo se este trabalho de cuidado fosse visível? Mais do que isso: se fosse reconhecido e remunerado? Como se comportaria a economia? O Laboratório de Exercícios de Futuro da ONG Think Olga se dedicou a desvendar o tamanho deste mercado e, pasmem, as 22 horas semanais dedicadas gratuitamente ao cuidado por meninas e mulheres em nosso País equivaleria a 11% do PIB nacional. Mais que o dobro do que o setor agropecuário produz. Seria o principal motor de crescimento, superando a indústria de transformação, a maior do Brasil e responsável por 9% de toda riqueza produzida por aqui.
Globalmente o cenário não é diferente. O trabalho de cuidado não pago exercido pelas mulheres equivale a 10,8 trilhões de dólares, representando a quinta economia do mundo. São 12,5 bilhões horas dedicadas (Oxfam, 2019), que gerariam uma riqueza 24 vezes maior que a do Vale do Silício, só para dar um exemplo. É três vezes maior que toda a indústria de tecnologia do mundo.
O cuidado é, sem dúvida, o maior subsídio à economia que existe. É porque mulheres e meninas estão em suas casas fazendo este trabalho essencial e invisível que o mundo se organiza como é.
A dedicação a esta tarefa tão desvalorizada é um dos principais motores da desigualdade entre gênero e raça. Meninas têm taxas de abandono escolar 23 vezes maior que meninos, obrigadas a ajudar no cuidado da casa e dos irmãos (IBGE). Homens dedicam praticamente o dobro de horas a tarefas remuneradas, o que limita economicamente as mulheres, acentua o desequilíbrio de poder no ambiente público e doméstico e amplia as desigualdades entre gêneros. Mães têm suas carreiras punidas ou são expulsas do mercado de trabalho e ainda recebem apenas 80% do salário de um homem pela mesma função (IBGE). E agora com a pandemia, sem creche nem escola, a participação da mulher no mercado de trabalho é a mais baixa desde o início da década de 1990 (IPEA, 2020). Se olharmos exclusivamente para os impactos na população negra, as mulheres negras são as que mais sofrem com o desemprego, cuja diferença entre brancos e pretos atingiu seu maior nível desde 2012 (IBGE).
Estamos em meio a uma das maiores crises econômicas mundiais desde a recessão de 1929. Uma crise que já deixa consequências trágicas para as famílias brasileiras e aumenta ainda mais a desigualdade de gênero, raça e classe em todo o mundo. Não podemos mais seguir buscando soluções dentro de ideais limitantes do que é considerado eficiente ou produtivo e seguir ignorando o valor do cuidado. Não podemos mais deixar as mulheres — sobretudo as negras e de baixa renda — para trás. Se não, quem serão as líderes do amanhã? Como as empresas cumprirão com suas metas de diversidade e inclusão se as populações vulneráveis estão sendo cada vez mais excluídas?
Valorizar, remunerar e redistribuir o trabalho do cuidado é urgente. Encontrar formas viáveis de empregabilidade, métricas de resultados e políticas que ofereçam apoio e sustentação às mulheres — sobretudo as mães — é mandatório. Estamos diante de um problema que pode inviabilizar o futuro não apenas dos negócios, mas do pacto civilizatório. O cuidado com as pessoas, com as relações e com o planeta é a chave para a solução.
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