O que a compra do Twitter por Elon Musk pode significar para a indústria de Adtech, para a democracia e para a sociedade

Buscar
Meio e Mensagem – Marketing, Mídia e Comunicação

O que a compra do Twitter por Elon Musk pode significar para a indústria de Adtech, para a democracia e para a sociedade

Buscar
Publicidade

Opinião

O que a compra do Twitter por Elon Musk pode significar para a indústria de Adtech, para a democracia e para a sociedade

Pode ser que a compra do Twitter por Elon Musk precipite essa discussão no Congresso americano (ainda) com maioria democrata


6 de maio de 2022 - 10h04

Já é notícia. Elon Musk está comprando o Twitter por US$ 44 bilhões. Entre a notícia e a realização do fato, ainda há um espaço. É preciso passar pelas instâncias de governança do Twitter e administrativas dos órgãos reguladores do mercado. Mas isso apenas atrasa um pouco o que é, provavelmente, inevitável: o maior bilionário do mundo comprou uma das redes sociais mais populares. Quais serão as consequências disso?

Musk é um tuiteiro popular e contumaz, mas sua relação com o Twitter sempre apareceu nas notícias relacionadas às suas mensagens polêmicas sobre fatos do momento ou sobre o mercado de criptomoedas. O usuário Elon Musk decidiu (ou tornou pública sua intenção de) virar dono do Twitter muito recentemente. Em 4 de abril de 2022, o bilionário tornou pública sua grande quantidade de ações da rede social, o que lhe permitia um assento no Conselho da empresa. Neste momento, Musk afirmou que este movimento se devia a 1) o imenso potencial de negócio do Twitter, que, segundo ele, estava adormecido e que ele destravaria; e 2) para defender a liberdade de expressão, algo fundamental para uma democracia (nas próprias palavras de Elon).

Estes dois argumentos apontam as prioridades do Twitter sob nova direção e nos permitem analisar seus impactos.

Na indústria de adtech

US$ 44 bilhões parece muito dinheiro porque é mesmo. Mas é uma fração do valor de mercado do Facebook (US$ 500 bi), do Google (US$ 1,7 tri) ou mesmo da Amazon (US$ 1,5 tri). Para ter uma ideia, o lucro líquido do último trimestre da Apple foi de US$ 35 bilhões. Ou seja, o lucro de três meses da gigante da maçã compraria quase o Twitter inteiro. Em outras palavras, no mercado das big techs, o Twitter é, no máximo, uma mid-tech, incapaz de disputar de igual pra igual com seus concorrentes maiores.

Para destravar valor do Twitter, o mais provável é que Musk siga o modelo vencedor do mercado, baseado na oferta de conteúdos (inclusive anúncios) ultra segmentados. É assim que Google e Facebook obtém o grosso de suas receitas, por exemplo.

Se isso acontecer, pode haver um impacto positivo na indústria de AdTech. A chegada de um player de grande porte que concorra com Google e Facebook na oferta de soluções para marketers é bem-vinda. A Amazon tem feito este papel de maneira acelerada, mas ainda incapaz de abalar a dominância do duopólio.

A chegada do pragmatismo e agressividade do Twitter powered by Musk pode ser bom, ao pressionar a oferta de soluções mais abertas (menos jardins murados), ao forçar que as gigantes sejam mais acessíveis aos seus clientes e ao, também, estimular novos modelos de negócios, bem como ofertas mais competitivas ou, ao menos, transparentes.

Ou seja, uma indústria de adtech liderada por Big 4s (Facebook, Google, Amazon e Twitter) é melhor que dominada por um duopólio.

Para a democracia e sociedade 

O Twitter tem pouco mais de 200 milhões de usuários ativos no mundo. 10% da base do Facebook, por exemplo, ou o equivalente ao número de usuários do Roblox. Entretanto, essa base relativamente pequena contempla muitos formadores de opinião e lideranças da sociedade, inclusive líderes eleitos, que usam a rede como ferramenta básica de comunicação social.

Musk afirma que vai estimular a liberdade de expressão para fortalecer a democracia, mas, ao que parece, a sua visão é mais libertária do que liberal. Ou seja, mais próxima de um vale tudo verbal. Desta forma, parece menos provável que o Twitter sob a liderança de Musk modere publicações de líderes populistas, como Donald Trump.

Mesmo sua afirmação de que tornará público o algoritmo de como a rede distribui conteúdos pode servir mais para explicar para grupos extremistas como manipular o algoritmo do que para organismos de controle detectarem e barrarem conteúdos de ódio.

Claro que se trata de um sistema complexo e se Musk tornar o Twitter o paraíso do discurso populista de direita, pode afastar o público com posições diferentes ou, simplesmente, desinteressados de temáticas políticas, neutralizando o efeito sob a democracia (a Fox existe há décadas sem maiores impactos na sociedade, por exemplo). Mas pode ser que isso não aconteça, e a rede se torne mais popular, mais presente no dia a dia das pessoas, e mais difícil de controlar a disseminação de conteúdos duvidosos.

Um efeito colateral deste cenário é a precipitação da regulamentação das Big Techs. Recentemente, a União Europeia aprovou o Digital Services Act, que aumenta a responsabilização das Big Techs sobre os conteúdos que circulam nas suas plataformas. Há uma discussão semelhante na Câmara dos Deputados brasileira e no congresso canadense, por exemplo. Mas, apenas uma legislação americana teria o poder de impactar de forma relevante o papel destas plataformas no nível global.

Pode ser que a compra do Twitter por Elon Musk precipite essa discussão no Congresso americano (ainda) com maioria democrata. E essa regulamentação pode tocar pontos para além da disseminação de conteúdos, como a monetização do jornalismo profissional, as práticas de concorrência desleal e as obrigações e regras a serem cumpridas por seus acionistas. Ou seja, pode-se colocar em pauta soluções sistêmicas (legais) para controlar o poder que um bilionário excêntrico pode ter ao comprar uma big tech.

Musk não tem medo de polêmica e é o tipo de cara que atravessa a rua para pisar numa casca de banana (porque acha que não vai cair). Isso pode ser bom para o Facebook de Zuckerberg, que pode perder o posto de Geni que tem hoje. Desde o escândalo da Cambridge Analytics, Zuck tem sido pressionado como nenhum outro líder do setor a fazer mais. Como Musk parece gostar de ser odiado ou idolatrado, pode tomar esse posto e dar um respiro ao Meta.
Fiz aqui um exercício especulativo de projeção e análise de cenários, que deve ser refeito e ajustado ao longo do tempo, mas estas conclusões preliminares devem ser levadas em conta: 1) um novo player de adtech é bom para a indústria; 2) uma plataforma social libertária pode ser ruim para a democracia num momento de populismo forte; 3) tudo isso deve precipitar os debates sobre regulamentação das big techs.

Há uma frase que gosto de usar em momentos de incerteza que diz “tudo pode acontecer, inclusive nada”. Mas com a chegada de Musk no mundo das Big Techs, podemos dizer que tudo pode acontecer, e com certeza vai mesmo.

Publicidade

Compartilhe

Veja também