A interferência da economia sobre o propósito das marcas
Especialistas avaliam o impacto de crises econômicas sobre o consumo e busca por marcas com propósito, mas alertam para o cerne da razão de ser da empresa independente de contextos externos
A interferência da economia sobre o propósito das marcas
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Giovana Oréfice
15 de junho de 2023 - 6h02
A trajetória do Brasil moderno é marcada por diversas crises econômicas, que foram encarando uma evolução concomitante à atenção das marcas pela questão do propósito. Ainda em meio a um cenário de pandemia, a pesquisa Pesquisa PPI Brasil 2021 mostrava que 90% dos consumidores atribuem confiança a uma empresa com propósito.
Contudo, em cenários de incertezas, sobretudo no que diz respeito ao poder de consumo, o quanto do propósito é levado em consideração no momento de compra? A população vive hoje uma conjuntura que leva a repensar ou a priorizar os motivos de escolha de algum produto ou serviço. Em momentos de crise, é possível que o consumidor prefira comprar pelo preço ou conveniência, mas a relação com a marca vai muito além dessa transação.
“Na minha visão, o propósito continua sendo muito relevante para diferenciar realmente as marcas e criar pontos de conexão entre o propósito e cada um que se relaciona com elas”, declara Mônica Gregori, diretora-executiva e sócia da Cause, consultoria que auxilia empresas a se conectarem com as causas dos novos tempos. Segundo ela, tal conexão entre marca e consumidor não é mensurada exclusivamente pelo consumo, mas também por confiabilidade, credibilidade e admiração, por exemplo.
O ponto é corroborado por Marcus Nakagawa, coordenador do Centro ESPM de Desenvolvimento Socioambiental e professor de responsabilidade socioambiental, sustentabilidade e ética da universidade. “No final do dia, na gôndola, o brasileiro médio com certeza compra por preço, pela marca que ele conhece”, diz. “Caso tenha alguma marca com um produto mais sustentável, esse propósito pode fazer com que ele acabe comprando”, complementa.
Um ponto relevante a ser citado é que apesar de uma tendência de discussão acentuada nos últimos anos, o propósito é uma estratégia de negócios. Uma das empresas referências no assunto, a Patagonia anunciou no ano passado a doação de 100% dos lucros a entidades dedicadas a combater mudanças climáticas. Marcas como Ben & Jerrys, da Unilever, também dedicam-se a causas socioambientais guiadas por seu propósito.
“Temos que lembrar que o propósito não é apenas para inspirar os consumidores, mas está muito relacionado à estratégia do negócio e vai fundamentar a cultura da marca”, descreve Guilherme Costa, co-coordenador do Centro ESPM de Desenvolvimento Socioambiental (Ceds) e gerente de Estratégias de Marcas do Grupo Sal. Para ele, ter culturas bem estabelecidas em gestão e presença de mercado estipuladas são fundamentais para que marcas atravessem desafios econômicos.
Ele atenta para o fato de que o propósito pode estar mais ou menos relacionado ao produto ou serviço consumido. Itens de necessidade básica e alimentação, por exemplo, costumam ter impacto menor do que os do segmento de cosméticos, saúde e autocuidado.
Dinamarca, Luxemburgo e Suíça são os países mais sustentáveis do mundo, segundo o Environmental Performance Index (EPI), da Universidade de Yale. Em nações desenvolvidas, é natural que o consumo voltado para causas socioambientais sejam mais acentuado, conforme pontua Marcus, da ESPM. “Nos países mais maduros e desenvolvidos, na Europa – como por exemplo a Alemanha e Holanda – os consumidores já acabam efetivamente comprando produtos e serviços com esse cunho ambiental”, complementa.
No Brasil, também é possível ver uma reivindicação relevante. O Trust Barometer 2022 da Edelman mostra que um terço da amostra afirmou boicotar marcas que ainda faziam negócios na ou com a Rússia. Ademais, a pesquisa revelou que as respostas das marcas a problemas da sociedade importam mais do que o que acontece na vida pessoal.
Por se tratar de um país com desigualdade, pode haver o senso de que a escolha de marcas com propósito fique restrita a classes sociais mais altas. Contudo, é necessário ter um olhar holístico para o significado do conceito. “No final das contas, o preço de produtos têm uma maior influência em conjunções de crise econômica ou em classes sociais com maiores restrições, mas tudo depende de como se mensura a relação com a marca”, descreve Mônica, da Cause. Ela alerta para que marcas não caiam na falácia de que consumidores de mais baixa renda não estejam atentos à coerência ou busquem uma identificação de propósito com as marcas.
O Novo Outdoor Social (NÓS) demonstra que os consumidores de favelas são extremamente conectados. Principalmente, meio de smartphones, utilizando aplicativos de redes sociais, bancos, compras/lojas, streamings, entre outros. Apesar disso, ainda é um público pouco explorado pelas marcas.
“Estamos entre o propósito sendo algo super enaltecido e que de alguma forma pode criar vínculos com os consumidor, mas ao mesmo tempo temos que ter responsabilidade como comunicadores em entender o que é realmente propósito para não banalizá-los com o tempo e criar um efeito colateral”, adverte a diretora-executiva e sócia da Cause. Nakagawa reforça, dizendo que a publicidade, propaganda e marketing são fundamentais para a criação de valor para que a marca seja reconhecida pelo seu propósito.
Neste sentido, é preciso que o propósito esteja enraizado no cotidiano da companhia, bem como nos colaboradores. Isso faz com que os planos e estratégias de comunicação da companhia transpareçam ações reais. Do contrário, é comum que práticas de green ou socialwashing aconteçam.
A nível de exemplificação, Costa cita o The Golden Circle, de Simon Sinek. A teoria coloca a razão da existência da companhia no centro, sinalizando que o propósito deve refletir a identidade da marca. É por esta razão que surfar na onda do ESG por pressão da sociedade e, inclusive, de investidores pode ser uma armadilha do oportunismo.
Confira como e quando será o evento Marketing Network Knowledge.
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