Representatividade em campo: o papel de Ana Thais Matos na Copa do Catar
Comentarista da Globo Globo fala sobre os desafios e expectativas de participar in loco desta edição do evento
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Valeria Contado
3 de outubro de 2022 - 6h00
Formada em jornalismo, Ana Thais Matos, que faz parte do quadro de comentaristas esportivos da Rede Globo, estará presente no Catar para realizar esta edição da Copa do Mundo. Ela, que participou da cobertura da edição da Copa de 2018, no Sportv, agora será a primeira mulher a comentar a competição in loco na TV aberta. Junto com Galvão Bueno e outros profissionais da Globo, a comentarista já arruma as malas para enfrentar os desafios que o Catar oferece para as profissionais que farão essa cobertura.
No jornalismo esportivo desde 2009, quando ingressou no Lance!, Ana Thais conta ao Meio & Mensagem que nunca teve a pretensão de usar o esporte para levantar uma bandeira, mas entende a importância de ser uma das pioneiras no segmento, principalmente para as futuras profissionais e como isso é importante para as causas que defende.
Meio & Mensagem -Quais são suas expectativas para essa Copa do Mundo?
Ana Thais Matos – Temos uma agenda tão intensa de transmissões, de viagens, programas, institucionais, que a Copa começou para mim durante o programa Bem Amigos, quando o Galvão Bueno perguntou para mim qual a minha expectativa par o amistoso que a gente transmitiria na sexta-feira, 23, entre Brasil e Gana. Agora comecei a entender um pouco mais e me imaginar nesse lugar que é tão difícil. Nunca aconteceu de ter outra mulher ali, ocupando esse espaço.
M&M -Quais são as suas referências femininas para realizar essa cobertura?
Ana Thais –Eu tenho um parâmetro que é muito positivo para mim, que são duas mulheres que me ajudaram a entender que esse lugar é possível: a Fátima [Bernardes], que fez a Copa do Mundo de 2002, e a Fernanda Gentil. Cada uma dentro da sua realidade, mas elas mostraram que é possível. A Fátima Bernardes, principalmente, porque eu era uma adolescente de 17 anos e que jogava futebol e via nela a possibilidade de talvez um dia estar ali. Eu quis ser a Fátima Bernardes, estar com a seleção brasileira. Então a minha expectativa hoje é essa: qual será a cara que eu vou dar pra essa cobertura? O que vão lembrar de mim quando a Copa acabar ou durante a competição? Qual vai ser a minha imagem para as pessoas? Hoje essa é uma expectativa muito individual. Sei que já falei algumas vezes sobre as mulheres, o que eu represento e luto por elas. É uma causa minha de vida e, até quando eu não me identificava como feminista, eu acreditava que esse era um caminho para chegar onde cheguei. E sabendo que vão ter críticas, que vão ter elogios, mas qual que vai ser a minha imagem como comunicadora.
M&M – Como você encara esse legado e o que você diria para outras meninas que querem entrar no jornalismo esportivo?
Ana Thais –Além delas se projetarem em ser uma comentarista, ser uma jornalista, ser uma narradora, tem a questão de se sentirem ouvidas. As mulheres precisam ser ouvidas, precisam estar em casa e poder falar do time delas e o pai, o tio, o irmão, a mãe olhar e falar, ‘pô que legal falar de futebol’. Para mim esse é o ponto de partida, porque até as mulheres que não se identificam com o meu lado profissional, o lugar que eu estou hoje, é importante para elas. Elas vão discordar de mim, vão dizer que não gostam de mim, mas vão falar. E não falávamos, não tínhamos esse lugar. E aí vem o segundo processo: se elas quiserem ser jornalistas, narradoras, comentaristas, repórteres, apresentadoras, ou se elas simplesmente quiserem falar de futebol. O que digo é isso: batalhem para serem ouvidas, mas mais do que batalhar, porque as vezes é cansativo, que as pessoas que estejam perto dessas mulheres ouçam também. Troquem ideias, discordem, e isso é importante, é um pouco do que eu quero deixar de marca.
M&M- Geralmente, quando te vemos comentando os jogos de ou competições nacionais, sabemos que você está conversando com um público que em geral acompanha a modalidade e dá para puxar temáticas mais técnicas. No caso da Copa, esse público se expande muito. Como você vai se preparar para conversar com as pessoas que não tem tanta familiaridade com o esporte?
Ana Thais – Consegui nos últimos anos desenvolver a minha linguagem. Essa foi a minha conquista individual, tecnicamente falando. Foi ter chegado em uma linguagem legal. O fato de eu fazer um programa semanal, que é o Encontro, que não é só para quem assiste futebol, me permitiu trazer o meu papo de futebol, que tenho com meus amigos, para a televisão. Fui amadurecendo e tenho amadurecido cada vez mais. As vezes a pessoa quer conhecer a linguagem técnica, o que são os extremos, o que são essas linguagens mais acadêmicas, mas é importante também trazer essas pessoas e falar ‘olha, as vezes você não quer falar os extremos, você pode falar outra palavra, pode usar uma outra linguagem’. Esse é o meu principal patrimônio como comunicadora. A minha linguagem ser objetiva didática dentro dessa realidade que a TV aberta pede.
M&M – Quais serão os principais desafios para a realização da transmissão de uma Copa do Mundo “fora de época” como agora?
Ana Thais – Temos que lembrar que vamos falar da principal paixão do brasileiro, que é a seleção brasileira. Isso é muito grande. Temos que mostrar o que é essa seleção. Claro que fazemos críticas ou elogios, mas é uma oportunidade de levar leveza para essas pessoas que estão em casa. Não tenho nenhuma pretensão de usar o futebol para que as pessoas se sintam mais felizes, ou mais alegres, não é essa a minha questão. A relação do brasileiro com a seleção é muito íntima. Ser porta-voz desse contato, levar o que a mãe do Gabriel Jesus pensa sobre ele, o que a família do Neymar pensa sobre ele, o contexto social que esses caras vivem, cada um jogando em um País, tudo isso influência. É assim que contamos a história do que é a seleção brasileira, para quem está em casa e que tem essa relação tão maravilhosa.
M&M – Você, como uma das primeiras comentaristas a cobrir in loco uma Copa do Mundo, estará em um País com o contexto como o do Catar, com todas as dificuldades que as mulheres enfrentam. Como vê essa oportunidade e o que espera para esse momento?
Ana Thais – Foi uma escolha complexa. Sabemos do que foi essa construção dessa Copa, da forma como foi, da escolha. Estou esperando uma Copa muito masculina. Por isso eu acho que a minha presença ali no estádio vai chamar atenção, para o bem ou para o mal, espero que mais para o bem. Vai ter uma mulher sentada numa bancada onde terá majoritariamente homens. Tenho entrado em contato com mulheres que vão fazer a cobertura e são pouquíssimas para a Copa no Catar. Acho que o estádio também será muito masculino. Então estou nessa expectativa de entender por que não somos bem-vindas no País. Claro que sabemos o contexto histórico*, mas como vai ser o comportamento nessa Copa do Mundo? E que essa Copa deixe um legado para as mulheres desse país. Que elas se sintam convidadas a participar do futebol. Que não seja sazonal, que não seja só para essa competição. Temos uma Copa do Mundo feminina pela frente, temos o futebol feminino crescendo, e eu espero muito que as seleções femininas entendam que isso vai acabando aos poucos, e a Copa do Catar vai ser interessante para ver isso.
*Por contexto histórico, a Ana Thais se refere às leis que o Catar impõe para as mulheres frequentarem lugares públicos, como estádios. Para a Copa do Mundo, o País liberou a presença feminina durante as partidas, algo que até então era proibido. O local é regido pela lei Islâmica, com costumes que devem ser seguidos por todos, independente da nacionalidade, apesar de algumas restrições terem sido flexionadas para a realização da competição.
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