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Mídia

Não ler este documento é dar mais um tiro no pé

Relatório aponta que mudanças de tecnologia têm diminuído a qualidade do jornalismo: ele vai piorar antes de melhorar


18 de dezembro de 2012 - 4h50

 *Por Carlos Eduardo Lins da Silva

O Tow Center for Digital Journalism da Columbia Journalism School publicou em novembro o que ele chamou de “parte pesquisa, parte manifesto” sobre a prática do jornalismo e a prática dos jornalistas, que é um dos mais instigantes e provocativos documentos sobre nossa atividade dos anos mais recentes, e que vai fundo nos problemas que temos vivido há 25 anos.

No seu primeiro parágrafo, ele já mostra como é iconoclasta, ao dizer que “não trata do futuro da indústria da notícia porque o futuro já ocorre agora e porque já não há mais algo que se possa chamar de indústria da notícia”.

Constata que “já houve” algo que se pudesse chamar assim porque havia similaridade de métodos entre um grupo relativamente pequeno e coerente de negócios no qual ninguém fora dele seria capaz de produzir um produto competidor em condições de concorrer com ele. “Estas condições não mais são verdadeiras”, afirma o documento em seu segundo parágrafo.

A partir daí, o texto começa a discorrer sobre o que vem acontecendo com o jornalismo nos últimos 15 anos (de fato, em minha visão, no mais recente quarto de século). Numa tentativa de ser extremamente sintético, mas talvez muito simplisticamente, ele afirma: “… numa frase, todo mundo, de repente, ganhou muito mais liberdade: quem faz notícia, quem anuncia, mas especialmente as pessoas antigamente chamadas de audiência…”.

Talvez não tenha sido bem assim, mas — por razões de praticidade — vamos aceitar tais premissas do documento para poder discuti-lo. Em geral, a maioria das pessoas tende a se impressionar muito com uma novidade que parece avassaladora e a concluir que dali em diante tudo terá mudado, quando, de fato, nada de significativo ocorreu. Por exemplo, apenas um, quem achou que o Wikileaks havia definitivamente alterado a maneira de fazer jornalismo e diplomacia, ao que tudo indica, deu com os burros n’água.

De qualquer maneira, é indiscutível que muito vem se alterando no mundo da mídia de 1987 até agora. “O futuro já chegou, só que ele ainda é distribuído de modo desigual”, como William Gibson disse e o Tow Center citou.

Entre as muito importantes conclusões do relatório, uma é de que essas mudanças de tecnologia têm piorado a qualidade do jornalismo, mas não necessariamente em definitivo. “O jornalismo vai piorar antes de melhorar”, os autores dizem estar convencidos.

E, em suas opiniões, o que mais contribui para a piora é que os veículos tradicionais do jornalismo se aferram a conservar métodos de trabalho e formas de hierarquia antigas, apesar de os seus modelos de negócio terem entrado claramente em colapso irreversível há já muito tempo.

Os responsáveis por esses veículos parecem insistir em repetir seus velhos axiomas mesmo quando se utilizam de novas tecnologias. Não só eles continuam a escolher saídas que claramente se têm demonstrado ineficazes (como cortar pessoal para reduzir despesas), como teimam em repetir modelos que eram consagrados em plataformas antiquadas nas atuais (como tentar reproduzir no iPad, no smartphone, no YouTube, no Facebook etc.), os estilos e métodos e linguagem que deram certo por décadas, séculos, no papel.

Os princípios de que os autores desse importante documento partiram para redigi-lo são todos fundamentais e corretos: jornalismo é importante (para a sociedade e para o cidadão); o bom jornalismo sempre foi, de um ou outro modo, subsidiado (por grupos políticos, beneméritos, anunciantes, mecenas ou mesmo o Estado); a internet destruiu o modelo do subsídio dos anunciantes, reestruturar o negócio é imperioso e inevitável; há muitas oportunidades para fazer isso de modo lucrativo para todos, em especial para a sociedade.

É disso que trata esse importantíssimo trabalho (“Post-Industrial Journalism: Adapting to the Present), que pode ser visto em http://migre.me/clGec (em PDF).

Vale a pena acessar, ler, meditar sobre seu conteúdo e agir. Nem tudo ali é certo, claro. Mas ignorar esse documento é dar mais um tiro no pé. E eles já foram tantos, que um a mais pode significar o fim da esperança para o negócio do jornalismo.

*Carlos Eduardo Lins da Silva é editor da revista Política Externa e diretor do Espaço Educacional Educare. Este texto foi publicado na edição 1540 do Meio & Mensagem, do dia 17 de dezembro.

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