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SXSW

Caminhos para tirar a publicidade da berlinda

Nancy Hill, CEO da Marcus Thomas, e Nick Law, líder de design e creative tech da Accenture Song falaram sobre diferentes campos em que a publicidade vem sendo desafiada


13 de março de 2023 - 1h09

Nancy Hill destaca que quando os tempos estão ruins é “preciso” anunciar (Crédito: Roseani Rocha)

Dos painéis da trilha Brand and Adversing, no SXSW este ano, dois trataram de problemas que a publicidade enfrenta e alguns que ela provoca. No primeiro caso, Nancy Hill, CEO da agência Marcus Thomas LLC e uma das líderes da indústria publicitária americana – foi presidente da American Association of Advertising Agencies de 2008 a 2017 – contou que causou burburinho quando há um ano escreveu um artigo no AdAge chamado “A publicidade em crise”. E, agora, escolheu o termo “brutal” para o título de sua apresentação “Estratégias publicitárias para uma temporada de orçamento brutal”, porque considera grave o cenário, ainda sob consequências da pandemia, e com as marcas reduzindo investimentos, mas diferente da crise de 2008. Para reagir aos problemas atuais, no entanto, diz ela, é possível aprender com lições do passado.

Na crise de 2008, ainda era presidente da 4A’s e recebia várias vezes por dia perguntas sobre como orientar os clientes.  E sua resposta é “quando os tempos estão bons, você deveria anunciar, quando os tempos estão ruins, você precisa fazer isso”. Porque, independentemente da crise, os consumidores estão sempre em busca daquilo que adiciona valor a suas vidas.

Assim, a executiva ressaltou que muito vem sendo falado sobre inflação e recessão, mas além de continuar investindo em marketing, isso precisa ser feito no sentido de que o valor da marca seja efetivamente transmitido ao consumidor. Ela lembrou que em 2010, no rescaldo da primeira crise global, foi a primeira vez que a Audi vendeu mais de 100 mil carros. Isso, porque não desacelerou no momento mais agudo. “O investimento de hoje é o retorno de amanhã”, pontuou Nancy Hill. Nas campanhas que veiculava então, a companhia exaltava o valor de um Audi em relação aos demais veículos. As vendas cresceram 22% sobre o ano anterior, daí um outro conselho: “never go dark” (algo como “não seja excessivamente pessimista”).

Olhar de oportunidade

Entre outras campanhas, também citou a Apple como marca que muitas vezes demonstrou conhecimento profundo de seus clientes, e a Nike, que na crise mais recente, durante a pandemia, criou uma série de vídeos que viralizaram sob o slogan “Play inside, play for the world” (Treine dentro de casa, jogue pelo mundo), incentivando o respeito às medidas de isolamento e ainda assim totalmente dentro de seu território de marca. O vídeo ganhou ainda mais repercussão quando compartilhado pelo jogador Cristiano Ronaldo e outras celebridades do esporte.

Para Nancy, em tempos de crise é preciso olhar as oportunidades que estão à frente. No meio de um prejuízo literalmente brutal, durante os lockdowns, outra marca que chamou atenção nos EUA foi a Double Tree, da rede de hotéis Hilton. Conhecida por um cookie que oferece aos hóspedes, mas sem poder receber clientes, que não viajavam, a marca resolveu tornar pública a receita desse cookie e ganhou muita mídia espontânea.

E alguns outros conselhos da executiva, a clientes e agências foram: abrace novas formas de pensar a respeito de sua marca; flexibilidade é ponto chave, esteja preparado para pivotar e entender seu valor; seja parceiro do chief finantial officer; e assegure suas prioridades.

Ainda que muitas notícias deem conta de que o investimento em publicidade está caindo e os custos de mídia aumentando, essas projeções não são as mesmas para todas marcas e segmentos, lembrou a executiva, destacando que as marcas b2b, ao contrário disso, têm elevado seus investimentos e priorizando mais criatividade e as mídias sociais. “Se seu concorrente não diminuiu os investimentos e você faz isso, é você que pode ter problemas”, disse.

Simplicidade profunda

Há um ano atuando como líder global de design e creative tech da Accenture Song, Nick Law trouxe uma discussão sobre o fato de que apenas a simplicidade profunda pode resolver a crise de complexidade que as marcas e suas agências enfrentam – e quando não fazem isso, são elas que criam também complexidade. Como introdução ao tema, por exemplo, comentou a saga que enfrentou para conseguir confirmar seu voo e fazer check-in de Nova York, onde trabalha, para Austin. Para isso, acabou tendo de passar pelos apps de três companhias aéreas, resetar senhas e trocar alguns e-mails.  A ideia foi mostrar o transtorno que produtos e serviços mal desenhados criam.

Nick Law: na economia do “self-service” tornou-se mais complexo saber onde está o interesse das pessoas (Crédito: Roseani Rocha)

Falando não apenas sobre narrativas, mas design e todas as capabilities da comunicação, Law lembrou que se alguém está ganhando dinheiro é provavelmente, porque está fazendo coisas nas quais as pessoas têm interesse. O problema é que as pessoas estão sempre mudando aquilo pelo qual se importam hoje em dia, dinâmica com a qual a internet contribuiu muito. “As últimas partes da vida que podíamos mediar sem a internet foram conectadas a esta durante a pandemia, por necessidade”, disse.

Hoje, cabe às agências pensar no indivíduo não apenas como cliente, mas uma pessoa conectada num mundo conectado. O problema é uma “taxa de complexidade”.  As promessas da internet eram ótimas, mas chegou-se a um ponto em que as coisas ficaram mais complicadas, diante da economia do self-service no mundo dos apps, que trouxe alguns problemas.

Um deles, pontuou Nick Law é o da “quantidade” – de conteúdos e formatos-, ou o scroll infinito, que causa ansiedade; outro, é o da qualidade. Segundo ele, há mais coisas para serem projetadas que designers para fazê-las. O problema não é ter que baixar um app para usar um serviço, mas este não precisa ser tão mal desenvolvido, como acontece com muitos, alfinetou. Lembrou, em seguida, que as pessoas estão falando tanto do ChatGPT porque as versões anteriores desse tipo de ferramenta eram muito ruins.

E a forma como a indústria publicitária é organizada, muitas vezes não ajuda a encarar a complexidade e simplificar processos, pontuou, utilizando o exemplo do formato de uma ampulheta com a “marca” no topo e a “performance” na base. Para ele, tudo deve começar, na verdade, pelo meio. “Fazer o meio do funil simples, é ir ao lugar certo para ajudar as pessoas a tomar decisões, seja para comer alguma coisa, comprar ou recomprar. Se conseguir fazer o meio bem feito, consegue o alto e a base também”, argumentou.

Law, que antes da Accenture Song, estava na Apple, puxou sua antiga empresa para a conversa, ao dizer que a big tech fez apenas uma campanha de branding na vida “Think different” e todas as outras são de produto. Mas sempre fazendo as pessoas entenderem o valor intrínseco nesses produtos.

Ele relembrou os modelos binários das agências, antigamente com o núcleo diretor de arte e redator; mais recentemente com algumas atualizações, como na RGA, onde passou mais de uma década atuando, e que se chamava stories & systems (este mais maleável). Mas para o criativo, para a estratégia se conectar com a criatividade, depende de quanta informação está sendo transferida e colaboração desde o começo de um processo. Pessoas certas nas empresas certas, a propósito, ajustam esses processos e, defendeu, é preciso criar conexão entre as diferentes parte da organização. Assim como embora existam dois hemisférios do cérebro, quando se cria algo criativo, os dois lados são ativados. “Não podemos ficar em uma escolha falsa entre branding e performance. A ação está no meio”, defendeu.

E para resolver as complexidades de um produto é preciso uso de engenharia reversa, processos, com as pessoas certas, sendo a agência responsável pelo topo e pela base. Combinar as pessoas e seus talentos e, aí sim, conseguir um ótimo trabalho.

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