Crises, nostalgia e reflexões embaladas para presente: minhas impressões sobre Barbie

Buscar
Publicidade

Opinião

Crises, nostalgia e reflexões embaladas para presente: minhas impressões sobre Barbie

Filme reúne boas pitadas de deboche, a afirmação da competência das mulheres e uma provocação sutil


18 de agosto de 2023 - 9h37

(Crédito: Alena-A-Shutterstock)

(Contém Spoilers) 

Nos últimos tempos, uma onda pink invadiu a internet, e extrapolou para o mundo real. O fenômeno Barbie, impulsionado pelo filme de Greta Gerwig, levou milhões de meninas e mulheres a lotarem os cinemas vestindo cor-de-rosa. 

Eu nem sou a maior fã da cor rosa, mas também cedi ao hype e fui ver Barbie. E definitivamente não estava preparada para o que vi na tela. Fiquei muito impactada e acho que o longa é uma verdadeira obra de arte! 

O que mais me surpreendeu foi que o filme tem várias nuances, como se fosse um bolo de festa que, conforme a gente corta, surgem camadas e mais camadas de recheio. Não é um filme bobinho de boneca. Pelo contrário,  dá margem para várias reflexões, principalmente para a gente que é mulher e já se viu nas situações descritas na tela. 

A gente vai ao cinema buscando entretenimento e nostalgia e recebe uma baita crise existencial embalada para presente, numa caixinha fofa. 

De uma só tacada, Greta consegue reunir boas pitadas de deboche, a afirmação da competência (e, em muitos casos, da superioridade) das mulheres e uma provocação sutil, porém certeira, à famosa auto estima exacerbada de muitos homens. 

Em um certo momento, a vida perfeita no mundo mágico da Barbie começa a ruir. Então, ela se vê obrigada a ir até o mundo real, levando o namorado Ken a tiracolo. 

No mundo real, Ken conhece o conceito de uma sociedade patriarcal e fica maravilhado ao perceber a supremacia dos homens, algo totalmente oposto ao que ele estava acostumado na Barbielândia. 

Nesse momento, há uma ironia incrível quando a diretora retrata a ausência total de vergonha do personagem ao se candidatar a empregos para os quais ele não tem nenhuma qualificação, como médico ou advogado, somente por ser homem. 

Tem uma fala do Ken em que ele se pergunta: “Como assim precisa ter um diploma ou MBA? Não basta ser homem?”. Isso me lembrou de um dado que vi outro dia. 

Sabe aquelas vagas de emprego com uma lista cheia de requisitos? Pois bem: De acordo com uma pesquisa do LinkedIn, as mulheres só se candidatam quando cumprem 100% dos critérios, enquanto os homens se sentem confiantes para se candidatar obedecendo apenas 60%. 

Tem a ver com aquela velha síndrome da impostora que faz com que mesmo mulheres super qualificadas e experientes em determinada área não se sintam boas o suficiente para assumir determinado cargo. E, mesmo quando tomam a coragem de se candidatar e conseguem o tal emprego, têm de lidar com a constante sensação de que são uma fraude. 

Enfim, com a autoestima potencializada pelo patriarcado, Ken volta para a Barbielândia todo empoderado, mesmo tendo poucas qualidades que realmente o destaquem. E é aí que temos uma grande reviravolta! 

Como nós ficamos sabendo desde o início do filme, na Barbielândia, são as mulheres que assumem os cargos de prestígio: elas são presidentes, membros da Suprema Corte, ganhadoras do Prêmio Nobel, etc. 

Já os homens, representados pela figura dos Kens, são relegados a posições de subalternidade. Eles são meros coadjuvantes e só existem para “servir” às Barbies, de certa forma. A existência do Ken só faz sentido quando a Barbie olha para ele, e sua única função é ficar ostentando o corpo na praia com um sorriso maroto. 

Porém, quando ele volta do mundo real trazendo o conceito de patriarcado e propagando essas ideias entre os outros Kens, a situação se inverte. E até mesmo as Barbies, antes acostumadas a estarem em posições de destaque, sofrem uma “lavagem cerebral” tão forte desse “novo” patriarcado que se deixam rebaixar a posições de submissão. 

Assim, elas passam a existir somente para servir os Kens e serem acessórios de decoração. E o pior: sem reagir, normalizando aquilo como se fosse a única possibilidade. Uma excelente alegoria para mostrar que a força do patriarcado é tão grande que as mulheres se submetem a ela, muitas vezes sem reação nem contestação. 

Já dei spoilers demais do filme Barbie neste texto, então, basta dizer que a forma como esse conflito é resolvido foi muito inteligente. Tem um monólogo no finalzinho do filme que, juro, é genial! Não sei se tive mais vontade de chorar, de sair gritando ou de tatuar trechos inteiros.  

Vejam! E falamos depois. 

Publicidade

Compartilhe

Veja também

  • Algoritmos novos, vieses antigos: como a IA reforça estereótipos

    Algoritmos novos, vieses antigos: como a IA reforça estereótipos

    Especialistas refletem sobre a urgência de uma abordagem crítica e transparente na implementação de tecnologias de inteligência artificial

  • De estagiária a VP global: os 20 anos de Thais Hagge na Unilever

    De estagiária a VP global: os 20 anos de Thais Hagge na Unilever

    A nova VP global de marketing para Seda fala sobre sua trajetória na multinacional e como concilia a carreira com outras áreas da vida