Para Juliana Alencar, inovação depende de uma cultura focada nas pessoas
Fundadora da Weird Garage, ex-sócia da StartSe compartilha seu ponto de vista sobre inovação e liderança
Para Juliana Alencar, inovação depende de uma cultura focada nas pessoas
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Lidia Capitani
2 de junho de 2023 - 12h06
Juliana Alencar é Fundadora da Weird Garage e ex-sócia da StartSe (Crédito: Divulgação)
A veia empreendedora e inovadora já pulsava em Juliana Alencar, quando decidiu abrir sua própria loja de bijuterias com as amigas da escola. O lucro de R$ 1.000,00 vendendo pulseirinhas brilhou nos olhos da menina. Não é à toa que o tema voltou a tomar seu lugar no coração da empreendedora. Depois de atuar no mercado financeiro, surgiu a oportunidade de juntar-se à StartSe, onde se tornou a primeira sócia mulher. Nesse intervalo, começou a entender mais profundamente o papel da cultura e das pessoas no processo de inovação.
A partir deste conhecimento, Juliana decidiu fundar a Weird Garage, uma “garagem” de inovação e cultura que desenvolve empresas para a nova economia por meio de projetos de consultoria estratégica e educação. Nesta entrevista, a fundadora conta sua jornada empreendedora e revela sua visão sobre liderança, cultura corporativa e inovação.
Conte um pouco da sua história profissional e em que momento você decidiu empreender.
Costumo dizer que o empreendedorismo sempre fez parte da minha vida. Aos 10 anos, morando com a minha família em São Paulo, eu criei o meu primeiro negócio com mais 2 amigas, era uma loja de bijuteria chamada Bijuca, e tivemos um lucro de R$ 1.000,00.
O tempo passou e eu acabei entrando no mercado de trabalho formal. A ida para o ambiente corporativo ocorreu por incentivo da minha família, pois meu pai descobriu uma doença rara quando éramos muito novas, e ele veio a falecer quando eu tinha 22 anos. Nesse momento, trabalhar em uma empresa nos proporcionou mais segurança, por ter um plano de saúde e um salário todo mês. Mas o sonho de ter algo próprio e alinhado aos meus propósitos não saía da minha cabeça.
Entretanto, fui me realizando em projetos com os quais eu acreditava, e trabalhei por quatro anos na área de inovação da Amil. Logo, me apaixonei pelo universo da inovação, e nesse espaço eu conseguia empreender de certa forma, propondo ideias fora do convencional dentro dos projetos. Depois da Amil, quis entender o consumidor mais de perto e fui para a área de clientes e estruturação de novos produtos dentro do mercado financeiro, até que na XP conheci os sócios da StartSe.
Um deles me contou que estava investindo na StartSe, e eu vi uma oportunidade de voltar ao universo da inovação e construir um projeto desde a sua fase inicial. Por lá, entrei na área de inovação corporativa e com muito orgulho me tornei a primeira mulher sócia da empresa. Alguns anos depois, o CEO me convidou para ser CCO (Chief Culture Officer). No primeiro momento, eu neguei, pois, acreditava que queria ser especialista em inovação e essa cadeira tinha “uma pegada” de RH. Mas foi dando uma palestra sobre inovação que a “ficha caiu” e me dei conta que todo o meu discurso sobre inovação está atrelado às pessoas, gestão e cultura e que, sem isso, as empresas nunca conseguiriam inovar.
Assim, topei o desafio e foi maravilhoso, porque foi neste espaço que descobri o meu propósito de vida! Além disso, vi novas oportunidades no mercado, e percebi o quanto as empresas estavam se tornando mais competitivas quando organizavam a sua cultura. Também sentimos isso na nossa própria pele na StartSe, pois após o início do projeto de cultura, a empresa começou a performar muito mais e os times estavam muito mais alinhados e engajados. Ali, eu enxerguei a oportunidade de criar uma empresa que só faz isso! E com pouco mais de um ano de Weird Garage, já realizamos iniciativas de transformação cultural em mais de 30 empresas.
Por que a Weird Garage se chama assim?
Weird Garage, quer dizer “Garagem Estranha/ Esquisita”. Foi algo que eu sempre escutei sobre as minhas ideias e sobre mim. Éramos meio “estranhos”. Foi assim que eu sempre me senti no ambiente corporativo. E também pelo momento que estamos vivendo, está tudo estranho! A forma com que fazemos a gestão das empresas e dos times, as nossas profissões, as nossas carreiras, as novas tecnologias, os novos modelos de negócio, é tudo muito esquisito.
Por isso, o nome é uma forma de abraçarmos tudo isso como um convite “pode vir, que aqui na WG somos todos estranhos, então você está em casa”. Garagem, é por analogia o local onde muitas empresas inovadoras do Vale do Silício começaram. E também, para nunca perdermos a nossa essência: da construção de projetos dentro da nossa garagem, com muitos sonhos e poucos recursos.
Fale sobre o momento atual da empresa e quais seus planos futuros?
Estamos no momento estruturando as frentes de consultoria personalizada de transformação cultural para empresas e também acelerando as frentes educacionais de preparação da liderança, times e governança.
No futuro, gostaríamos de atrelar as tecnologias para ajudar a escalar os novos momentos das empresas. De forma que elas consigam, com autonomia, cascatear aquilo que acreditam, conectando todos os pontos, e para estarem ainda mais próximas e alinhadas com os seus stakeholders.
Quais características ou habilidades você considera essenciais numa liderança?
Em primeiro lugar, coloco a empatia para conseguir conectar com as pessoas de uma forma genuína, a fim de criar uma relação de confiança com seus liderados. Em segundo lugar, a confiança, que está atrelada à capacidade de ter conversas difíceis e francas com seus times. Um líder precisa ser parceiro e o braço direito de confiança do time, sem isso, a gestão enfraquece.
Outro ponto importante é gostar de desenvolvimento, e sentir alegria e energia na busca do seu autodesenvolvimento e também dos times. A capacidade de desaprender para reaprender diversas vezes é muito necessária para o momento que estamos vivendo. Além disso, ter uma boa comunicação é essencial. Para ser assertivo e conseguir passar as informações de forma clara e objetiva e diminuir os ruídos.
Vemos muitos casos em que os líderes não conseguem passar as suas ideias e no dia a dia o time foca os esforços em iniciativas completamente desconectadas com a estratégia da empresa. Dessa forma, é preciso ter encontros dedicados à gestão de times para entender as barreiras, dificuldades e oportunidades para que o líder contribua verdadeiramente com o time.
Por fim, é preciso colocar a tecnologia como aliada nas comunicações e aqui estamos falando de saúde mental, direcionamento e bem-estar do time. Fugir de reuniões desnecessárias, escalar e registrar as informações e estratégias para que se tornem ainda mais claras são fundamentais! A tecnologia está aí para nos servir e garantir que a informação passada seja a correta.
Como você as desenvolve e as alimenta regularmente?
Estudo muito sobre liderança, e acredito que seja um lado importante da profissão ao qual preciso me dedicar. Sou fiel (e chata demais) com os rituais de encontros com os times e individualmente. Troco constantemente com eles sobre os pontos de melhoria da minha gestão e também para trocar experiências, dores e insights com outros líderes do mercado. Por isso, estar aberto para sempre conhecer novas perspectivas é fundamental! Além disso, busco entender qual o meu papel na empresa e nos times, e como outros líderes podem me completar em outras frentes.
Qual o papel das pessoas e da cultura corporativa para a inovação?
Hoje, é impossível inovar se as pessoas não estiverem com um modelo mental orientado à inovação. Além disso, é essencial ter uma cultura que fomente a inovação e crie os reconhecimentos certos que sustentem a inovação no dia a dia.
Para facilitar esse racional, existem três interlocutores da cultura que impactam diretamente na inovação. O primeiro é a liderança como responsável por puxar as frentes de inovação, contextualizar os times sobre os cenários e incentivar para que a inovação aconteça, além de criar indicadores de sucesso.
O segundo é a governança, que cria processos e reconhecimentos que incentivem e sustentem a cultura, visando fomentar um ambiente de segurança psicológica que aceite testes e erros. Sem isso, a inovação não acontece, pois para inovar precisamos testar.
Por fim, os times precisam estar alinhados aos objetivos de inovação da empresa, precisam ter um perfil inovador que goste de trabalhar com mudanças, descobertas e a criação de novas soluções.
O mundo da tecnologia e da inovação ainda é predominantemente masculino. Você enfrentou desafios por ser uma mulher e liderança no meio?
No primeiro momento da fundação da WG, eu ainda não tinha tão claro qual era o padrão da cultura corporativa no Brasil em relação às mulheres no mercado de trabalho. Quando anunciamos a criação da WG, pude ver o quanto o sucesso de uma mulher é atribuído ao papel de um homem que possa haver por trás.
Eu me deparei com comentários como “ela é filha de quem?” ou “Quem é o marido dela?”. Comecei a trabalhar aos 16 anos, meu pai faleceu quando eu tinha 22 e nunca tive ajuda de um familiar ou marido para construir o que eu tenho hoje. E se eu tivesse, seria muito grata por ter pessoas ao meu lado que me apoiassem e isso não diminuiria minhas conquistas. Mas o fato de as pessoas associarem unicamente o sucesso de uma mulher a um homem, me chocou muito na época.
Hoje, ainda temos uma porcentagem maior de homens em cargos de liderança ou CEOs. Já quando falamos de relacionamento com o mercado, pelo fato de ser mulher, me sinto limitada a fazer networking dentro do horário comercial, porque qualquer outra ação fora do horário comercial pode ser mal interpretada ou causar constrangimento.
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