Concorrência vira tábua de salvação do ano
Disputas por verbas de grandes clientes, como Vivo, Tim e C&A, estressam ainda mais a rotina das agências
Disputas por verbas de grandes clientes, como Vivo, Tim e C&A, estressam ainda mais a rotina das agências
Alexandre Zaghi Lemos
6 de novembro de 2015 - 2h18
Tradicionalmente, o segundo semestre é o período mais movimentado em termos de grandes concorrências por contas publicitárias, o que se explica por, nesta época, os anunciantes estarem planejando o ano seguinte — e muitos não querem começar 2016 com as parceiras que têm hoje. Entretanto, a temporada de 2015 ganha contornos ainda mais sofridos para as agências, pois boa parte delas precisou fazer cortes e irá encerrar o atual exercício com resultados financeiros piores que os dos anos anteriores. Ou seja, muitas têm se agarrado às concorrências como possíveis tábuas de salvação em meio ao “tsunami” provocado pelo momento ruim da economia nacional, o agravamento na crise de relacionamento com os anunciantes e a cobrança por melhores resultados nas operações locais das multinacionais — a palavra “tsunami” foi usada por Martin Sorrell para descrever a onda global de revisão de contas, especialmente na área de mídia.
Analogia semelhante faz Marcio Oliveira, presidente da Lew’Lara\TBWA. “No primeiro trimestre, a terra tremeu embaixo do oceano. Em abril, os elefantes correram para a montanha e em junho a água começou a inundar tudo.” Ele diz que o ano começou com as agências imóveis, como se estivessem paralisadas por uma areia movediça — “quanto menos se mexessem, mais demorariam para afundar”. Entretanto, a partir da metade do ano, perceberam que era preciso se mover, e até mesmo acelerar, para não serem engolidas pelas contingências econômicas e pelo corte de custos dos anunciantes. “A crise acelera processos, provoca demissões e troca de fornecedores”, enumera Oliveira.
A lista de concorrências iniciadas ou finalizadas nas últimas semanas é grande —com isso, estão mais intensas nas agências as reclamações pelas noites não dormidas. Inclui desde as contas principais de empresas listadas no ranking dos maiores compradores de mídia no Brasil, como Vivo, Tim e C&A, até fatias menores das verbas de grandes anunciantes como Ambev, Fiat e Johnson & Johnson.
Neste segundo caso, a David acaba de vencer a concorrência da Bohemia, marca da Ambev que passou nos últimos anos pelo portfólio da AlmapBBDO. A Fiat está instituindo um novo modelo de relação com agências, escolhendo parceiras por jobs (leia mais adiante). E a Johnson & Johnson promove disputa entre seis agências por parte de sua verba digital, pacote que inclui marcas como Listerine, Carfree e Neutrogena. Há alguns meses, a empresa assinou novos contratos para as contas digitais de seus dois principais produtos, que estão fora da atual concorrência, com a DM9DDB (Johnson’s Baby) e a Sunset (Sundown). A disputa em curso envolve, além dessas duas, outras parceiras atuais da J&J, como Mirum e Riot. Já a conta offline se mantém dividida entre a DM9DDB e a J. Walter Thompson.
Ruivo órfão
Entretanto, a maior concorrência aberta atualmente no mercado brasileiro é a de Vivo. A disputa pela verba off-line está entre Africa, DM9DDB, DPZ&T, Havas e Y&R. Já a área digital envolve DM9DDB, Havas e Wunderman, além de um inédito consórcio formado por empresas da Publicis: AG2 Nurun, Espalhe MSLGroup e SapientNitro.
Sua concorrente Tim também colocou em concorrência a conta publicitária hoje dividida entre cinco agências: Neogama/BBH (institucional), WMcCann (varejo), Artplan (Live Tim), R/GA (Tim Beta) e Wieden + Kennedy (digital). A disputa envolveria outras cinco participantes: AlmapBBDO, Isobar, J.Walter Thompson, Publicis e Z+. Na última concorrência, encerrada no início do ano passado, a Tim optou por manter a verba onde já estava.
Por sua vez, a C&A estaria na fase final de acerto financeiro, com propensão a se definir entre AlmapBBDO ou Leo Burnett Tailor Made. Mas outras participantes também disputaram a conta que está na DM9DDB desde o final de 2007, quando a agência venceu uma concorrência e tirou a verba da house Avanti, que cuidava da comunicação da rede varejista de moda desde a chegada da marca ao Brasil, em 1976.
A entrada da AlmapBBDO nas concorrências de C&A e Tim denota uma mudan- ça de postura da agência, que por muitos anos se recusou a participar de disputas especulativas, sendo quase que uma voz única crítica a este modelo de seleção. Com essas duas disputas, especificamente, a Almap espera repor anunciantes perdidos recentemente: a Marisa, que em março voltou para a Giacometti após três anos, e a Oi, que lhe entregou parte da conta em agosto do ano passado — a parceria foi curta, mas rendeu um troféu no prêmio Profissionais do Ano.
Já encerradas, as disputas pelas verbas das companhias aéreas Latam e Azul também envolveram muitos profissionais e tiveram algumas reviravoltas. O Grupo Latam, holding que controla as marcas LAN e TAM, optou por um caminho que tem atra- ído alguns grandes anunciantes globais: a concorrência entre holdings. A disputa terminou com a vitória do Interpublic, o que significa que a verba no Brasil será transferida da Y&R para a WMcCann — com partes menores da conta, Wunderman (digital) e DM9DDB (TAM Viagens) também deixam de atender a empresa. O curioso é que após perder essa concorrência, a Y&R conseguiu ser admitida na disputa pela conta da Azul, depois de o anunciante ter assistido às apresentações de Africa, Crispin Porter + Bogusky, Mullen Lowe e DPZ&T — a conta estava na DPZ desde setembro de 2008. Embora tenha chegado por último, a Y&R terminou em primeiro e repôs sua perda no segmento de companhias aéreas.
Outra prática adotada há alguns anos por grandes anunciantes, como a Coca-Cola, que vem se disseminando entre empresas que investem alto em publicidade, é a de concorrências por jobs — para desespero das agências. É um método que afeta também contas públicas. No governo federal, quando a verba para determinado projeto é grande, faz-se uma disputa entre as agências que atendem a conta. Entretanto, a esfera pública lida com limitações não impostas à iniciativa privada, como estar circunscrita ao pequeno grupo de parceiras que venceu a licitação e obedecer uma distribuição mí- nima de verba para cada uma delas.
Sem essas amarras, os anunciantes privados que aderem às concorrências por job replicam na publicidade o modelo clássico de relacionamento das áreas do marketing promocional e dos eventos. Embora parte deles, como é o caso da Coca-Cola, mantenha um time de agências credenciadas anteriormente, nada impede que uma ou outra experiência seja feita no decorrer dessas disputas por projetos.
Entre os grandes anunciantes que estão aderindo a essa prática está a Fiat Chrysler Automobiles (FCA). As duas parceiras principais de Fiat no Brasil são a Leo Burnett Tailor Made, que atende a conta há 18 anos, e a Isobar, há 13 anos. Em 2011, a montadora inaugurou um novo modelo de relacionamento com as duas agências, tentando aumentar a sinergia e a integração entre elas, por meio do que chamou de “Agência Fiat”. Agora, abre espaço mais fragmentado e arejado, passando a ouvir outras agências, especialmente para ações de lançamento de novos produtos. Assim, há chance tanto para agências que já atendem a FCA aumentarem sua fatia, como o caso da Pereira & O’Dell (que há três anos cuida das mí- dias sociais de Fiat), como para a entrada de novas parceiras.
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