Largo da Batata esquina com La Croisette
Queremos viver num país em que o significado e os valores pelos quais guiamos nossas vidas sejam representados nas ações do governo e da iniciativa privada
Queremos viver num país em que o significado e os valores pelos quais guiamos nossas vidas sejam representados nas ações do governo e da iniciativa privada
Meio & Mensagem
25 de junho de 2013 - 10h04
(*) Por Rodrigo Leão
Há alguns anos eu venho me sentindo fora de sincronia nessa profissão. Hoje por exemplo, enquanto escrevo (17/06), todos os publicitários mais importantes do mundo estão com a mente ou o corpo lá no Festival de Cannes. E eu estou aqui, totalmente obcecado pelo Largo da Batata, onde vai acontecer um mega protesto às 17hs, que quando você estiver lendo este texto já será história.
O fato é: não consigo me interessar muito mais pelas traquitanas maravilhosas e exercícios formais lindos (como genial filme "Dumb Ways to Die" do Metro Australiano), pelos videocases excelentes, as interfaces inovadoras e o escambau todo que por lá será celebrado. OK, confesso que tenho um fraco pelas ativações fantásticas, como "Meu Sangue é Rubro Negro", da Leo Burnett. Sou apaixonado pela comunicação bem feita em qualquer uma de suas inúmeras formas. Mas isso não diminui a sensação que tenho de que tudo isso é meio irrelevante.
Tenho chegado a conclusão de que o que faz eu me sentir assim é ideia que eu tenho do que significa ser um publicitário decente (nos dois sentidos). Penso que o meu trabalho é criar significado para o consumo. É ajudar os clientes a criar sentido e contexto humanos verdadeiros para suas empresas e para os produtos e serviços que elas vendem. Quando isso acontece, a prosperidade é para todos: donos da empresa, funcionários, parceiros e consumidores. Para mim o consumo sem sentido é claramente o vilão do mundo. Não precisamos de tantas coisas. Precisamos de coisas que signifiquem mais em nossas vidas. É uma questão de ecologia e de psicologia humana.
Um bom exemplo desse embate: a tal da "bebabilidade" da cerveja que alega que não estufa — pra você poder tomar 20 latinhas — versus o slogan as cervejas artesanais que dizem "Beba menos. Beba melhor." Uma quer você alcoolizado e sem sabor. Outra quer você aprendendo a apreciar como é feita uma boa cerveja. Ou então, o excesso de roupas baratinhas de fast fashion produzidas por milhares de semi-escravos morrendo em arapucas incendiárias em Bangladesh pra você poder comprar sua saia-lápis abaixo do preço de custo. E assim por diante.
A mesma falta de sentido que atinge o consumo geral também atinge o consumo cultural. Parte da crise do jornalismo atual é uma crise de desimportância. O jornalismo, que nasceu 100% partidário e evoluiu para ser apartidário e de consumo hoje sofre com a crise de significado da cultura de consumo vazia que celebra. E tome Copa. E tome BBB. E tome whisky com água de coco. A mídia está assustada pois estão melando o produto Copa das Confederações o que vai atrapalhar o lucro deles e do mercado publicitário. Repórteres tiveram de ser alvejados na cara para os veículos acordarem.
A grande campanha de comunicação tosca do governo que é a Copa sofre por ser de uma entidade podre e corrupta, a FIFA, celebrando outra, o governo brasileiro. Queríamos uma Copa que nos ensinasse heroísmo e abnegação, fair-play e espírito coletivo. Gostamos do futebol pois acreditamos que ali no campo as regras são um pouco mais justas e os melhores homens vencerão.
Promovi uma enquete no Facebook perguntando às pessoas que iriam à manifestação de hoje o motivo pelo qual elas estava indo as ruas protestar. Cada um tinha seu motivo mas quase todos giravam em torno dos seguintes temas: menos corrupção, menos violência, fim da brutalidade policial, mais educação, raiva contra os políticos. As pessoas querem que o país devolva o tanto que lhes é tomado de impostos. Querem um governo legal como os brasileiros. São consumidores cansados de ser esfolados por uma marca (o governo brasileiro) que não entrega o que promete.
Queremos viver num país em que o significado e os valores pelos quais guiamos nossas vidas sejam representados nas ações do governos e da iniciativa privada. No fim, o que era uma pequena manifestação virou uma grande campanha. Por apenas R$0,20 compramos de volta o interesse pelo debate político no Brasil. Tá barato.
(*) Rodrigo Leão é sócio-diretor da Casa Darwin e professor dos MBA de Marketing, MBA Executivo Internacional e International MBA da FIA. Este artigo está publicado na edição 1565 do Meio & Mensagem, de 24 de junho, nas versões impressa e para tablet, exclusivamente para assinantes.
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