Quem foi que disse que não?
Lendas ou não, os contos discorrem sobre pontos que podem ajudar a aumentar as chances de qualquer tipo de ideia.
Lendas ou não, os contos discorrem sobre pontos que podem ajudar a aumentar as chances de qualquer tipo de ideia.
Meio & Mensagem
22 de abril de 2014 - 3h37
Por Thiago Nascimento (*)
Certa vez ouvi um conto, acho que chinês, que falava sobre a história de uma cidade que se encontrava na parte baixa de um vale e que, com certa frequência, precisava levar e buscar mercadorias até a cidadela da parte de cima da colina. O transporte era feito através de burros de carga, que seguiam de acordo com o seu conceito de GPS até o topo do vale, sempre com êxito. Com o passar do tempo, nasceram as carroças que continuaram utilizando a trilha criada pelos antecessores. Seguiram-se as eras, uma via de terra consistente foi firmada no solo, aproveitando o rastro das carroças, com a invenção do asfalto, e finalmente virou estrada, repleta de placas sinalizando suas curvas, e de motoristas se perguntando por que diabos demoram tanto para chegar até o topo.
Versa a lenda que o inescrupuloso Genghis Kahn só conseguiu transpor a muralha da China porque teve a humildade de ouvir o integrante mais novo de seu exército, que apareceu com uma ideia no mínimo não convencional: pombos. Uma das maiores fortalezas da muralha, além de suas rochas espessas, era o seu exímio exército de arqueiros, que ficam responsáveis lá do alto de saraivar todo e qualquer ser vivo não chinês que ousasse se aproximar da muralha. A ideia do novato consistia em fazer chegar o mais próximo possível da muralha centenas de caixas, cada uma delas repleta de pombos, que, ao avançar da tropa de Gengis Khan, eram libertados, voando e atrapalhando bastante a vida dos arqueiros, para que nesses minutos de caos os soldados derrubassem os portões e entrassem com a cavalaria.
Kahn foi o maior conquistador de territórios da história, porém, não teria um terço se não tivesse ultrapassado a muralha.
Lendas ou não, os contos discorrem sobre pontos que podem ajudar a aumentar as chances de qualquer tipo de ideia.
A primeira tem a ver com QUESTIONAR:
Quantas vezes, sendo sincero, questionamos o porquê da coisas? O objetivo ou o razão do briefing ? Ou simplesmente paramos para analisar os fatos com a frieza e inocência necessária, sem colocar soluções enlatadas na frente dos bois?
Parece que o mundo das ideias foi substituído pelo das fórmulas – "Bora fazer do jeito que sempre foi feito" – e que questionar virou ofensa pessoal ou motivo de rompimento de relacionamento entre pessoas. Falamos o tempo todo sobre a velocidade com que as coisas mudam, de como as pessoas estão mais críticas, mais analíticas, de como se tornaram jornalistas revolucionários afiados, com opiniões ferrenhas e negativas sobre qualquer tipo de fato, e, na outra ponta, no geral, continuamos fazendo mais do mesmo, tudo do mesmo jeito.
Mais uma campanha ditando como as pessoas devem agir, respirar e ser?
Mais uma promoção querendo mudar a vida das pessoas com trocados?
Mais um produto inovador só porque mudou de cor?
Velhas gigantes norteadas por resultados continuam sendo engolidas diariamente por start-ups movidas por ideias e ideais, se preocupam em resolver a vida das pessoas ou simplesmente fazê-las se importarem mais, e como isso está difícil, e, provavelmente, continuará, se ficarmos presos constantemente a fórmulas obsoletas e empoeiradas.
Escutei de um alto executivo a afirmação de que ele só contrata pessoas que pensam da mesma forma que ele. A justificativa: contar com gente que saiba executar exatamente as suas ideias. Talvez por isso exista aquela máxima de que quem dirige o mercado no dia a dia é incapaz de pensar na sua inovação, só em evolução. Aí vem o Whatsapp cobrando U$$ 1 por ano causando um prejuízo U$$ 150 por usuário e de US$ 32,5 bilhões por ano nas companhias de telefonia, com previsão de dobrar, e muda na base da boa ideia as velhas regras do jogo.
Toda vez que alguém questiona, algo novo nasce: me lembro da primeira vez que ouvi Sepultura e de pensar “Porra, o caras enfiaram uma batida tribal, indígena, no meio de um Thrash Metal”. Igor, Max e Andreas devem ter se perguntado: “Por que não, porra?” Ou do Ferran Adrian, chef nº1 do mundo, que começou a misturar técnicas de química e física com culinária, e dessa improvável indagação fez nascer os pratos mais inovadores e disputados dos últimos 15 anos do universo da Gastronomia. Para visitar o El Bulli era necessário um planejamento nostradâmico. Ou, ainda, de José Saramago – Ah, Saramago! – que desatinou a questionar o porquê de não de colocar a Morte como personagem central de uma história, com carne, osso, sentimentos e conflitos, e brincou de forma delicada no seu Intermitências da Morte com todas os perrengues possíveis e imagináveis que o mundo enfrentaria caso o ser humano realizasse o seu maior desejo: o da imortalidade.
Recentemente aqui na NewStyle a gente lançou uma pesquisa que buscava questionar como as pessoas absorviam os diversos estímulos promocionais. Descobrimos coisas surpreendentes e instigantes, inputs que nos fazem questionar uma série de coisas que fazemos sem nem mais saber exatamente o porquê.
A segunda tem a ver com OUVIR:
Será que estamos sabendo ouvir, de verdade, os mais novos, os inocentes. Aqueles que, no primeiro abrir de boca, escutam logo um "Eu tenho experiência nisso" ou "Vamos fazer como no passado", sendo delicadamente convidados a sumariamente calar a boca, possivelmente, ficando traumatizado e pensando 100 vezes antes de falar qualquer outra coisa numa próxima oportunidade. Desperdiçando totalmente a espontaneidade, a falta de vício, o primeiro olhar sob algo desconhecido.
Não estou descartando o valor da experiência, até porque o experiente Gengis Khan soube ouvir e executar uma ideia de alguém que nunca havia lutado uma batalha antes. Agora imagine se o estagiário da guerra tivesse ido pra forca?
O apego ao passado, o descrédito às ideias dos inocentes, tem ajudado a tornar o futuro ineficiente. O apego traz mais do mesmo, a desvalorização da inocência força a otimização de algo decadente em vez de uma mudança de perspectiva. O novo, como diz O Rappa, já está nasce velho, cansado, surrado.
Um não questiona, o outro não sabe ouvir e, no final do dia, ambos se perguntam por que demoram tanto para alcançar resultados ou, ainda, por que anda tão difícil transpor muralhas e voltar a crescer vertiginosamente, como era no passado.
Talvez, ande faltando coragem para questionar, batalhar por pontos de vista esquisitos, ousadia para desconstruir caminhos sólidos e desapego ao já conhecido, simplesmente para estar apto a ouvir, considerar e executar o novo.
Nunca é tão fácil perder-se como quando se julga já conhecer o caminho. (Provérbio chinês)
* Thiago Nascimento é diretor de planejamento da NewStyle
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