O marketing está preparado para a Inteligência Artificial?

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Opinião

O marketing está preparado para a Inteligência Artificial?

Convivemos com muitas mais perguntas do que respostas em relação a IA, mas alguns estudos ajudam a estruturar os elementos de uma jornada complexa


6 de dezembro de 2017 - 15h31

Estamos preparados para adotar IA (inteligência artificial) em marketing?

Os profissionais de marketing sabem o que é isso?

Quais são as implicações?

O que marketing pode ambicionar com essa tecnologia?

Essa tecnologia permite apenas criar um chatbot bonitinho e dar uma experiência bacaninha para o cliente ou pode realmente transformar o marketing e até o negócio?

Será que IA consegue transformar toda uma organização?

Qual é a jornada para adoção dessa tecnologia em marketing?

Hoje convivemos com muito mais perguntas do que respostas em relação à IA. Aliás, buscamos alguém que consiga responder a algumas dessas perguntas. Ainda estamos na pista de decolagem, mas alguns estudos de mercado sinalizam o caminho e ajudam a estruturar os elementos de uma jornada complexa. Várias dessas pesquisas e análises sinalizam que as dimensões e a base para uso da Inteligência Artificial seguem as mesmas premissas da curva de transformação digital de uma organização. É por aqui que começa a nossa conversa.

A adoção de IA em marketing é dependente do estágio de maturidade digital que a organização se encontra. Ela pode ser determinante na amplitude da adoção da tecnologia, portanto cabe fazer uma análise dos elementos que afetam a jornada digital das empresas.

“Hoje convivemos com muito mais perguntas do que respostas em relação à IA. Aliás, buscamos alguém que consiga responder a algumas dessas perguntas”

Um estudo do MIT Sloan Management Review, em colaboração com a Deloitte, publicado há dois anos, mas que continua incrivelmente atual, analisou a jornada de transformação digital das organizações, os elementos que influenciam e determinam a sua maturidade digital. Foram 4,8 mil profissionais de negócios pesquisados, de 129 países e 27 indústrias diferentes, portanto uma amostragem significativa. O título do excelente documento final do estudo já denuncia uma das principais conclusões da grande pesquisa: “Estratégia, não tecnologia, determina a transformação digital.” Sem entrar no leque de todos os detalhes, vou destacar a seguir algumas importantes conclusões do relatório.

Apenas 15% das empresas que estão nos estágios iniciais de maturidade digital reconhecem a existência de uma estratégia clara e coerente em suas organizações. Por outro lado, nos negócios digitalmente maduros, esse índice é de 81%. Organizações imaturas digitalmente tendem a focar seus esforços em tecnologias e operações específicas, sem atentar para o cenário e os grandes problemas. Ou seja, a existência de uma estratégia claramente instituída, com um propósito e escopo definidos, plenamente comunicada e comprometida, com os funcionários da empresa engajados, é fundamental para as ambições de uma organização em sua jornada digital. Muitas empresas falham por não desenvolver uma estratégia clara do caminho que estão seguindo.

“Apenas 15% das empresas que estão nos estágios iniciais de maturidade digital reconhecem a existência de uma estratégia clara e coerente em suas organizações”

A maioria dos colaboradores não tem o conhecimento e as habilidades necessárias para entender como o digital irá impactar o negócio. Não é um problema de skills em tecnologias ou ferramentas digitais, mas de skills em negócio, em análise, em visão sistêmica e planejamento. Isso exige uma visão horizontal da organização, de intensa colaboração entre áreas e alinhamento de estratégia. Uma organização formada por silos organizacionais é uma organização tacanha em sua ambição digital. Além do desafio dos skills, a maioria dos colaboradores das empresas digitalmente imaturas afirma que suas organizações são avessas ao risco. Esse é um imenso obstáculo para o processo de transformação do negócio, que tem a aceitação ao risco como fator essencial. Na verdade, a aceitação ao risco tem vínculo direto com o nível de conhecimento que os profissionais têm do negócio. A falta desse conhecimento gera profissionais mais inseguros e conservadores em suas tomadas de decisão.

A agenda digital tem de ser liderada pelo topo do negócio. Quem trabalha nas organizações digitais confia na competência e na fluência digital de seus líderes, que se posicionam, que comandam a estratégia, que colocam a “cara” na frente do negócio, que compartilham o propósito e alinham a organização em prol de uma visão consistente. Liderar por exemplo é o nome do jogo. A pesquisa do MIT aponta que 90% dos entrevistados das empresas mais maduras digitalmente dizem que seus líderes têm skills e experiência para liderar a transformação digital, enquanto nos iniciantes digitais esse mesmo índice fica ao redor de 15% e 20%. Portanto, a amplitude da transformação digital é proporcional a dois movimentos: um movimento top-down com a liderança comandando o processo, e um movimento bottom-up com profissionais habilitados em conhecimento digital e do negócio, empoderados com skills e autonomia para tomada de decisão.

O estudo do MIT conclui que a transformação digital de uma organização vem de 3 grandes forças:
– Estratégia: pensar no longo prazo e fazer com que a estratégia e execução sejam focadas em transformação;
– Cultura: desenvolver uma cultura organizacional centrada em colaboração e aceitação ao risco.
– Liderança: a agenda digital tem que vir do topo, e tem por base as interseções entre negócios e tecnologia.

Um outro material imprescindível, que explora esse estudo em detalhes e vai além, em português, é o paper “Sinais do Futuro Imediato”, escrito pelo Professor Silvio Meira, Chief Imagination Officer da MuchMore. É um documento primoroso de 40 páginas, que merece ser impresso e lido como um livro. Garanto que vale a pena. Vai organizar a sua cabeça.

Com base nos pontos do estudo do MIT Sloan Management Review e do paper “Sinais do Futuro”, estamos agora prontos para conversar sobre a introdução da tecnologia de IA – Inteligência Artificial – no marketing. Mas, antes, tenho algumas perguntas que geram profundo desconforto e temor.

“Quem trabalha nas organizações digitais confia na competência e na fluência digital de seus líderes, que se posicionam, que comandam a estratégia”

Marketing está liderando ou tem um papel ativo na jornada de transformação digital da organização?

Quem lidera essa transformação digital dentro da empresa?

Existe uma liderança estabelecida?

Essas perguntas colocam a área de marketing no spot. São perguntas que vão determinar se marketing é protagonista ou coadjuvante na transformação digital de uma empresa. E as respostas vão sinalizar as ambições que marketing pode ter na adoção de inteligência artificial ou qualquer nova tecnologia emergente.

O CMO é uma liderança efetiva na transformação digital da organização com um todo, ou está preocupado apenas com marketing? Qual é a capacidade do CMO de se articular com o restante das lideranças da empresa no processo de sua transformação? O CMO realmente entende do futuro do negócio? Aqui se determina o apetite, a amplitude, o impacto e o espaço que marketing ocupa nos planos futuros de uma empresa. E, por consequência, até onde os projetos de marketing impactam o negócio e o restante da organização.

O estudo “State of Marketing”, publicado em Abril/2017, merece ser lido por todos os profissionais de marketing. Ele sinaliza para onde marketing está indo. Foi resultado de 3.500 respostas dadas por profissionais de marketing de todo o mundo, inclusive Brasil. O objetivo do estudo está centrado em três áreas de foco: Experiência do Cliente, Prioridades e Tecnologias. Aqui pretendo explorar o resultado no último item porque o estudo tem uma parte dedicada à inteligência artificial aplicada à marketing.

“57% dos profissionais avaliam que a IA impactará substancialmente a automação das interações sociais automatizadas através de chatbots e interfaces”

Nos próximos dois anos, estima-se que IA será a tecnologia com maior crescimento de uso em marketing. A expectativa é um crescimento de incríveis 53%. Ou seja, não precisamos mais “vender” o conceito de IA para o povo de marketing, isso já está comprado. Adivinha a tecnologia de maior crescimento em marketing que vem logo depois? É Internet das Coisas.

Segundo o estudo, os profissionais de marketing afirmam que IA vai:
– aumentar a eficiência de sua operação
– oferecer personalização avançada
– entregar experiências inovadoras para seus clientes

57% dos profissionais avaliam que a IA impactará substancialmente a automação das interações sociais automatizadas através de chatbots e interfaces. Essa perspectiva é excelente, porque estamos assumindo que teremos uma tecnologia que vai permitir um melhor atendimento e relacionamento com os consumidores clientes. Na verdade, o estudo mostra que IA vai impactar substancialmente quase todas as atividades de marketing, permitindo maior eficiência operacional dentro do marketing, bem como entregar uma hiper personalização aos clientes.

De todos os obstáculos citados para a execução de uma estratégia de IA, o que surgiu em primeiro lugar foi “restrições de budget”, o que me surpreendeu muito. No meu entendimento existem outros “roadblocks” mais complexos para uso de IA.

O estudo apresenta um “country profile” para cada país e fui analisar o perfil do Brasil. Os 350 profissionais de marketing entrevistados do Brasil citaram os seguintes três obstáculos principais para adoção de IA: restrições de budget, preocupação com a privacidade das informações dos clientes e a inexistência de uma estratégia definida para IA dentro da empresa. Um dado me surpreendeu muito: o Brasil é o país onde os profissionais de marketing mais acreditam na afirmação que IA é essencial para o marketing, com um incrível índice de 67%. Todos os outros países apresentaram nível mais baixo do que esse.

“De todos os obstáculos citados para a execução de uma estratégia de IA, o que surgiu em primeiro lugar foi “restrições de budget””

A conclusão é que os profissionais de marketing já estão convencidos que IA será fundamental para o marketing nos próximos anos e que tal tecnologia vai impactar quase tudo que fazemos hoje. Mas agora vem uma nova pergunta: Será que esses mesmos profissionais estão preparados para trabalhar com essa nova tecnologia? Um estudo que apresento a seguir nos ajuda a responder essa pergunta.

O estudo “From data deluge to inteligente insighs” (numa tradução livre: Do dilúvio de dados a “insights” inteligentes) do IBV (IBM Institute for Business Value) é resultado de longas entrevistas presenciais com 525 CMOs e 389 Líderes de Vendas (C-Level) ao redor do mundo, de 18 indústrias diferentes, inclusive no Brasil. O propósito desse documento, publicado em Agosto/2017, é responder a pergunta: Os CMOs e os Líderes de Vendas estão preparados para a era cognitiva?

O estudo mostra que 61% dos CMOs e Líderes de Vendas dizem que a computação cognitiva será uma força disruptiva em suas indústrias. E, surpreendentemente, 64% afirmam que suas indústrias estão preparadas para adotarem tecnologias cognitivas nos próximos três anos. Porém, no momento, apenas 24% afirmam possuir uma estratégia estabelecida para aderir à IA. Tal paradoxo indica que muitas organizações estão tratando IA como uma adoção tática e não estratégica. A maioria dos CMOs e Líderes de Vendas reconhecem que ainda estão nos estágios iniciais de consideração e avaliação de IA. E, para esses, formular uma estratégia parece ser prematuro.

Lembram-se quando concluímos no início desse post de que a existência de uma estratégia clara tem conexão direta com a maturidade digital de uma organização? Esse mesmo conceito se aplica à IA. A inexistência de uma estratégia não é apenas um inibidor, mas é um limitador da amplitude e do impacto que uma tecnologia como IA pode trazer para uma empresa. Construir uma estratégia tem implicações em modelos de negócios, processos, experiências de clientes e até experiências de funcionários.

“64% afirmam que suas indústrias estão preparadas para adotarem tecnologias cognitivas nos próximos três anos”

Os CMOs estrevistados afirmam que o uso de tecnologias cognitivas vai ajudar a endereçar os principais desafios de marketing existentes hoje em dia, mas destacam que a real vantagem reside em duas áreas-chave:
– Melhor experiência do cliente
– Resultados financeiros: gestão dos programas de marketing e ROI

Sobre os principais obstáculos, CMOs e Líderes de Vendas afirmam que:
– Não possuem a tecnologia necessária para implementar soluções cognitivas, ou seja, acesso à tecnologia é um real desafio na visão deles.
– Não acreditam que tenham as habilidades e os conhecimentos necessários. Tal desafio de skills permeia todo o time que o CMO lidera, inclusive ele próprio.
– A governança de dados e as políticas de compartilhamento de dados podem ser uma barreira. Ou seja, segurança e privacidade estão no radar dessas lideranças.

O estudo avaliou as organizações de maior sucesso na adoção de tecnologias cognitivas, e afirma que a construção de uma espécie de “Agenda Cognitiva” da organização é fundamental para determinar as aspirações e o potencial de sucesso de uma jornada nesse sentido. A “Agenda Cognitiva” tem 3 dimensões:
– Cultura: criar uma cultura cognitiva centrada em estratégia, governança, colaboração e inovação
– Pessoas: foco total em desenvolver liderança e desenvolver skills
– Tecnologia: investir em tecnologia de computação em nuvem e gestão e captura de dados.

Por fim, o documento apresenta quatro recomendações finais que acho extremamente pertinentes, e por isso me permito elaborar mais em cada um dos pontos.

1- Dê espaço para a inclusão de soluções cognitivas na sua estratégia de transformação digital
Em vez de considerar a iniciativa cognitiva como uma iniciativa isolada, os CMOs devem considerá-la como um componente importante da estratégia de transformação digital. Empresas de todas as indústrias estão reinventando a experiência do cliente com uma variedade de tecnologias digitais, de mobile apps a IoT (Internet of Things) a realidade virtual. Esses novos pontos de contato digitais estão produzindo novas fontes de dados estruturados e não estruturados, que podem ser usados como um contínuo loop de feedback para municiar as empresas sobre as preferências individuais, comportamento e atitude de seus clientes. Uma capacidade analítica poderosa, modelada numa abordagem cognitiva, permitirá que os executivos de marketing obtenham “customer insights” para melhorar a experiência do cliente.

2- Desenvolva skills de negócios no time de marketing e não somente skills digitais e de análise de dados
Com a introdução da tecnologia cognitiva, marketing precisa de profissionais capazes de discernir implicações de negócios a partir de ideias cognitivas. É necessária uma perspectiva ampla da estratégia da empresa e das engrenagens do negócio. A falta de capacidade analítica, visão ampla do negócio e skills de tomada de decisão podem impactar tremendamente a implementação de soluções cognitivas de alto impacto. É preciso investir em “change management”, que inclui capacitação e comunicação, além de identificar evangelistas para abraçar novos projetos e mentorizar outros.

3- Considere a tecnologia cognitiva como uma oportunidade de ouro para colaboração e inovação
A implementação de soluções cognitivas exigirá uma nova forma de pensar o relacionamento e atendimento aos clientes, implicando em forte alinhamento das áreas de marketing, vendas, serviço ao cliente, cadeia de suprimentos, desenvolvimento de produtos, RH, treinamento, bem como operações e finanças. É uma oportunidade única de alcançar inovação através de novos conceitos e processos. Líderes de empresas estabelecidas, que tem um legado, que tem silos estabelecidos dentro da organização, podem tirar vantagem para desenhar novos processos e modelos de trabalho através de maior colaboração. Soluções cognitivas implicam em “new thinking”.

4- Comece pequeno, se necessário – mas comece
Executivos temem que a mudança para o mundo cognitivo implique na substituição radical de ferramentas e processos relacionados à análise de dados e experiências de clientes. Construir um business case para mudanças nessa escala é assustador. A melhor estratégia é começar pequeno, assim é possível aproveitar os benefícios de uma solução cognitiva e estudar a melhor forma de expansão. Mais da metade dos Outperformers já iniciaram sua mudança para cognitivo.

A conclusão desse longo post não é simples. Essa nova tecnologia chamada IA é tão impactante, com um potencial tão intenso e ainda tão desconhecido, que não deve ser tratada de forma trivial e leviana. Poucos profissionais têm a real dimensão do que temos diante da gente. Estamos apenas diante do início de uma grande revolução tecnológica.

Para concluir e facilitar o entendimento de tudo que foi dito acima, apresento abaixo uma imagem que cria um “framework da adoção de IA em marketing”.

Eis o resumo:

– Os CMOs e profissionais de marketing reconhecem que IA já é essencial para o marketing. Não é preciso mais “vender” o conceito dessa tecnologia para eles.

– Os benefícios de IA no marketing se concentram em eficiência e inovação:
– eficiência na operação interna de marketing
– melhor gestão nos programas de marketing e ROI
– Personalização avançada e melhores experiências aos clientes

– Existem vários obstáculos pela frente. A principal é a falta de uma estratégia de IA estabelecida na organização. Mas também aparecem os seguintes “road blocks”: restrições de budget, acesso à tecnologia, falta de pessoal com skills e preocupações com segurança e privacidade dos dados dos clientes.

– O processo de adoção de IA em marketing pode ser acelerado com a criação de uma agenda cognitiva, com três dimensões:
– Pessoas: desenvolver liderança e skills
– Cultura: criar uma cultura centrada em estratégia, governança, colaboração e inovação
– Tecnologia: investir em tecnologia de computação em nuvem e gestão e captura de dados.

– A ambição do uso de IA em marketing é diretamente dependente do protagonismo da área de marketing e do CMO dentro da organização.

– O sucesso do uso de IA é diretamente proporcional à maturidade da transformação digital da organização, que está centrada em 3 pilares: estratégia, liderança e cultura.

 

Tudo isso pode soar assustador e especulativo, mas também sinaliza um futuro promissor de grandes transformações em marketing. Todos nos sentimos despreparados em lidar com isso. Medo e entusiasmo são mais próximos do que a gente imagina.

Boa sorte para todos. Vamos precisar.

Obs.: Conteúdo apresentado pelo autor no evento MarkeTHINKers em 28 de novembro de 2017

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