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Marketing

Gabriel García Márquez e a experiência de marca

Personagem de Cem Anos de Solidão, o cigano Melquíades sabia que dependia de clientes leais, já que circundava o mundo passando sempre pelos mesmos pontos


16 de janeiro de 2013 - 7h50

Por Paula Nader (*)

Rodando nas Américas, entre Borges e Allendes, escolhi para as férias o livro Cem Anos de Solidão, do colombiano Gabriel García Márquez.

A história começa com uma família que, ao desistir de encontrar o mar depois de anos de viagem, decidiu não enfrentar o caminho de volta para casa e fundou um povoado no meio da selva.

O desenvolvimento chegava ao povoado de Macondo por meio da visita anual de ciganos, que traziam na bagagem as novidades do mundo. O mais emblemático da trupe, cigano Melquíades, certa vez apareceu com ímãs que, segundo ele, serviam para “despertar a alma das coisas”.

Boquiaberto ante o fenômeno que fazia até objetos perdidos há muito reaparecerem de repente no lugar onde mais foram procurados, o patriarca do povoado, empreendedor feroz, pensou que poderia enriquecer usando os ímãs para atrair ouro debaixo da terra.

Melquíades, ao saber dessa intenção, prontamente afirmou que os ímãs “para isso, não servem!”, mas o patriarca insistiu, queimou suas economias para comprá-los e passou o ano entre tentativas incessantes e frustradas.

Na visita seguinte, ao constatar o inevitável, Melquíades não só aceitou de volta os ímãs como devolveu ao patriarca, em troca, um conjunto de mapas e instrumentos de navegação, que seriam a base do seu novo empreendimento: astronomia.

O marketing de Melquíades era poderoso: tinha a seu favor a aura misteriosa e livre dos ciganos e tirava proveito do acontecimento natural que era sua chegada anual para promover demonstrações espetaculares das novidades que pretendia vender.

As demonstrações não só apresentavam os objetos, como prestavam o serviço de explicar minuciosamente como poderiam ser usados.

Sua marca era ainda mais poderosa: Melquíades entregava tudo o que prometia e não prometia o que não tinha certeza de poder entregar.

Sabia que dependia de clientes leais, já que circundava o mundo passando sempre pelos mesmos pontos, e aprendeu que uma venda bem feita diminui muito os custos da próxima venda, e assim por diante, criando um círculo virtuoso de “eu-compro-porque-preciso-e-fico-feliz-com-o-que-recebo-então-compro-de-novo-e-ainda-digo-aos-meus-amigos-para-comprarem-lá-também”.

Vendia seus produtos enaltecendo o que tinham de bom e de único, e também seus limites: ímãs não atraem ouro debaixo da terra.
Ainda assim, se o consumidor de boa-fé insistisse, comprasse e ficasse insatisfeito, Melquíades não somente aceitava a devolução como, às vezes, ainda enviava outro produto, que sabia ter potencial de ser útil ao seu cliente.

E esse cliente, entre lentes de aumento e kits para alquimia, seguiu comprando com ele por toda a vida.
Assim, sem a complexidade e os incontroláveis custos de manter e administrar operações de pós-venda e de atendimento a reclamações, Melquíades inspirou pessoas e financiou seu bem-sucedido business: dar voltas ao mundo, levar a vida que escolheu e morrer onde quis, contando com o respeito e a admiração dos que estiveram ao seu redor.

Mais do que muitos estudos de caso, Melquíades me trouxe de volta, no meio das férias, uma antiga reflexão: por que algumas marcas conseguem obter resultados crescentes, recorrentes e muito superiores aos de seus concorrentes ao estreitar realmente os vínculos com seus consumidores e outras não?

¿Que te parece?

*Paula Nader é diretora de marketing do Santander e nova colaboradora da coluna Opinião, de Meio & Mensagem. Este texto, o de estreia, foi publicado na edição 1542, de 14 de janeiro.

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