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Opinião

Se tudo mudou, por que tudo parece igual?

É preciso tratar da porta para dentro as questões de equidade racial, social, de gênero, religião ou origem


20 de julho de 2016 - 19h03

Não conheço Bethany Iverson, diretora de estratégia da Space150 NY, mas ela chamou minha atenção ao publicar um artigo que começa dizendo: “Sou grata àquelas pessoas que estão se encarregando de construir uma indústria que reflita o mundo em que vivemos, mas estaríamos sendo negligentes se falássemos sobre o progresso que estamos buscando sem falar sobre um assunto mais urgente e desconfortável que mantém a diversidade fora das agências.”

O “assunto urgente” ao qual Bethany se refere é a equidade racial, mas é impossível chegar ao final do artigo sem pensar em equidade social, de gênero, religião ou origem — e sem pensar no quanto é verdade que temos mantido nosso foco em tratar a diversidade da porta para fora enquanto, muitas vezes, esquecemos de nos perguntar o quanto temos ou não investido em refletir essa mesma preocupação da porta para dentro.

Ser reflexo do mundo que conhecemos hoje não é simples. Estamos vivendo grandes polarizações e contradições em que, na contramão da busca pela inclusão, países reforçam fronteiras e na contramão da busca pela mudança, o conservadorismo ganha força.

Ser reflexo do mundo em que vivemos hoje não é fácil. Não nascemos preparados. Somos fruto de outra consciência. Aprendemos a rir do que nos machuca porque isso parece nos fazer sentir menos dor. Aprendemos a não ver, a deixar passar, a fazer vista grossa, habilidades sem efeito em um mundo onde tudo está o tempo todo visível.

Está certo. Estamos falando de negócios e não podemos construir as melhores empresas sem as melhores pessoas. Mas podemos percorrer caminhos mais difíceis e ajudar o melhor a existir. Conheço um grande executivo em Palo Alto que uma vez me disse “não perco meu tempo olhando currículos que não venham de Harvard, Stanford, Berkeley ou MIT; se já não é fácil encontrar os melhores lá, imagina no resto”. Não pude deixar de comentar que era mesmo curioso que o mundo o tivesse colocado ali na minha frente, querendo saber o que uma estudante do Colégio Tiradentes de Manhuaçu e da PUC de Minas Gerais tinha a dizer sobre um problema que o andava deixando sem dormir.

Precisamos levar a diversidade para dentro da indústria da comunicação, não só para dentro das agências. Isso é sobre crenças e propósitos, antes de ser sobre RH. Resolvido se realmente vemos na diversidade um valor, a etapa seguinte é implementar iniciativas que comecem ajudando a corrigir erros históricos e apoiem a formação e o desenvolvimento pessoal e profissional de pessoas que até hoje tiveram acesso a muito pouco — um primeiro passo que precisa ser seguido pela implementação de novas diretrizes no processo de recrutamento e pelo desenvolvimento de novos processos de integração e aculturamento.

Em seu artigo, Bethany propõe cinco caminhos que podem nos ajudar a dar alguns passos para além de onde estamos agora. Peço licença para ampliar um pouco o que ela propõe:

1. Criar programas de aprendizagem para novos talentos ou apoiar programas existentes.

2. Recrutar em comunidades e escolas técnicas e oferecer bolsas de estudo.

3. Criar líderes conscientes de questões relacionadas à equidade racial, social, de gênero, de religião e de origem.

4. Criar oportunidades de discussões internas e zonas livres de julgamento onde as pessoas sintam-se estimuladas a aprender e livres para cometer erros.

5. Tornar mais fácil para todos o acesso e o desenvolvimento de uma compreensão mais profunda, histórica e atual, sobre segregação e luta por igualdade e direitos civis.

Como inspiração na busca de novos modelos, vale conhecer projetos como o BrandLab, a Fundação Lemman e as Escolas Germinar, projetos bem diferentes entre si.

O mundo está mudando enquanto nós mudamos e muitas vezes parece que o mundo está se movimentando mais rapidamente do que damos conta de acompanhar. É natural que muitas vezes não saibamos como agir, que passo dar, quando vai ser suficiente. Se você sentir-se assim, olhe à sua volta: você não está desconfortável sozinho.

Olhe de novo, chegue mais perto, você vai ver também que, de pessoas comuns a grandes corporações, tem muita gente transformando desconforto em ação positiva. Como o Ian Black, que resolveu levar seu curso de formação em gestão de conteúdo para jovens transexuais interessados em construir uma carreira em publicidade. Iniciativas como a do Ian, se solitárias e isoladas, podem fazer pouco efeito, mas ele não se importa. Ian acredita em microrrevoluções e quer fazer a parte dele. E você? Quer fazer o quê?

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