Ser ou não ser
A propaganda não morreu. Cabe a nós determinar que papel queremos que ela assuma
A propaganda não morreu. Cabe a nós determinar que papel queremos que ela assuma
27 de novembro de 2017 - 15h20
Não sei se você, tal como eu, tem lido artigos e conversado com pessoas que dizem que o mercado publicitário “está em vias de extinção”, e que as agências não terão mais espaço diante das constantes mudanças na sociedade. E se você, tal como eu, é do mercado publicitário, deve se sentir angustiado, solitário e sem saber muito bem como reagir diante de tantas manifestações contrárias à sua existência como pessoa jurídica e ao seu propósito de trabalho. Assim, apesar de você ser apaixonado pelo que faz e acreditar no seu trabalho, tem um monte de gente dizendo o contrário — que vamos “morrer”.
Se a “morte da propaganda” fosse verdadeira, só nos caberia enterrar e seguir em frente, contando a história de alguém que não pode mais se transformar. A morte, afinal, é o fim do processo, o ponto final da história. Para quem morre, não há mais como se transformar, mudar de rumo e continuar.
A propaganda, na verdade, não morreu. Ela ainda pode contar uma história e desempenhar um novo papel. Cabe a nós determinar que papel queremos que ela assuma.
Só existe uma coisa pior do que morrer. Ser irrelevante. Insignificante. Desnecessário. O que temos falado sobre nosso mercado é pior que anunciar a sua morte. Não anunciamos um “descanse em paz”. Fizemos pior. Tratamos como se ele tivesse perdido a importância. Porque nós, anunciantes e agências, estamos discutindo formato, em vez de olhar para as pessoas (e para nós mesmos, como consumidores), para entender, o que ao meu ver, é bastante simples.
As pessoas têm o poder de escolher o que querem, quando e como consumir. Neste cenário, um mercado que ainda discute formatos e meios — e não se atualiza com o mundo de quem consome — se torna irrelevante para as pessoas. Mas a comunicação ainda permanece latente — é por ela que fazemos o que fazemos e nos tornamos humanos.
O mundo precisa de ideias. De histórias. De entretenimento. De propósito. De pontos de vista. É isso que se espera de uma marca. E de uma agência. Fazer e oferecer coisas que importem para a vida das pessoas.
O mercado publicitário não vai acabar! E sim, a marca, identificação das empresas é importante! E sim, a propaganda, forma de comunicação das empresas com as pessoas, também.
A tecnologia transformou o nosso mundo. Qualquer um percebe isso ao ser avisado pelo aplicativo que é hora de sair para a reunião. E aposto que na Revolução Industrial, no lançamento do rádio, da TV, do DVD, etc., todo mundo passou por isso, em maior ou menor grau.
Mas transformar não é decretar o “fim do mercado” e muito menos sinaliza a perda da importância de uma boa comunicação. Sabe por quê? Por que o consumidor e a marca se identificam. Por que a marca representa a pessoa muito mais que dados considerados fundamentais no discurso corrente.
O Instituto Locomotiva fez uma pesquisa no início do ano, ouvindo três mil pessoas, para investigar a relação do brasileiro com a propaganda. Dentre as diversas perguntas, destaco a seguinte: “Quais características você considera importantes para definir sua identidade”? Resultado: 20% dos entrevistados afirmaram que as marcas e os produtos são elementos de definição da sua identidade. Marcas e produtos estão à frente de elementos que seriam apontados como essenciais, tais como “cor” (16%), “orientação sexual” (15%), “posição política” (15%) e “time” (14%). Em outras palavras, consumir determinada marca ou produto é mais importante que a origem dos antepassados (18%) ou o bairro em que moramos (10%).
Acreditar que uma boa comunicação, ou uma boa propaganda é irrelevante ou não terá espaço no futuro é desprezar um dado fundamental que a pesquisa clarifica: somos, também, o que consumimos. A propaganda, que nada mais é que a comunicação da pessoa jurídica, tem o seu lugar e a sua vez, e tem ainda muita estrada para percorrer.
A propaganda está mais viva que nunca, se reinventando e traçando um novo caminho, como todos nós — os vivos. E aí, queremos mesmo ser insignificantes? Sair da cena no meio da peça? Ser ou não ser relevante, é o que se coloca.
Se você, tal como eu, acreditar que fazemos a diferença, vamos parar com o mimimi sobre o fim do mundo e bora trabalhar, assumindo que mudança é a única certeza que temos. E isso é extraordinário.
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