Um molde que não nos serve
Mulheres na liderança vivem diante de escolhas trágicas: entre serem mães ou homens. Independentemente de sua escolha, se sentirão inadequadas
Mulheres na liderança vivem diante de escolhas trágicas: entre serem mães ou homens. Independentemente de sua escolha, se sentirão inadequadas
Com as conquistas das mulheres nas últimas décadas, o termo “empoderar” se tornou a palavra da moda. Passou a ser usado em campanhas publicitárias, Dia da Mulher e até em nome de esmalte. Mas a realidade ainda está longe de dar a elas esse tal poder.
Embora representem mais de 52% da população, mulheres ainda ocupam apenas 12% dos cargos de liderança no Brasil.
Nesse ritmo, elas só conquistarão a tão desejada equidade em cargos de liderança em 2085. Não estaremos no mercado de trabalho, nem mesmo, quiçá, vivas até lá.
Se fizermos o recorte de raça, isso fica ainda mais complicado. Segundo o Women in The Workplace, apenas 0,4% das CEOs do Brasil são mulheres negras.
Ter muito mais homens na liderança das empresas não só mexe nas estatísticas, mas cria uma atmosfera empresarial fincada em valores masculinos. O que também é um espelho do que experimentamos fora do escritório: a cultura patriarcal.
Socialmente, as mulheres sempre foram associadas à esfera privada, de cuidado com a casa e família. Logo, se esperava que elas fossem mais emocionais, multitarefas, organizadas e empáticas.
Já os homens foram definidos pela esfera pública, relacionada ao trabalho e poder. Por isso, eram vistos como racionais, agressivos e assertivos.
Essa concepção fez com que a ideia de homens de sucesso fosse muito mais confortável. As poucas mulheres que conseguiram levar suas carreiras ao topo, tiveram que se adaptar em caixinhas pré-moldadas.
Por isso, na maioria das vezes em que falamos de empoderamento, tentamos fazer com que as mulheres se sintam poderosas e confortáveis em um molde que não serve para elas.
Desde que entraram no mercado de trabalho, as mulheres vivem diante de escolhas trágicas entre: serem mães ou serem homens.
É esperado que elas manifestem os valores femininos da esfera privada, como cuidado e organização. Mas, quando ocupam cargos altos, são cobradas por não se moldarem aos valores considerados masculinos, o famoso “colocar o pau na mesa”.
Esses moldes restringem as possibilidades de agir de forma autêntica, colocando-as em um eterno ciclo de inadequação.
Como disse a vice-presidente da Morgan Stanley, Carla Harris, “toda vez que uma mulher tenta agir de forma inconsistente com quem realmente é, ela cria uma desvantagem competitiva para si mesma”.
Quebrar os moldes masculinos não é só uma questão de respeito e equidade, como também traz resultados financeiros.
Segundo um estudo da consultoria McKinsey, empresas que apostam na diversidade de gênero entre seus executivos, estão 25% mais propensas a ter lucratividade acima da média. Se a diversidade também for racial, esse número pula para 36%.
Mesmo assim, o crescimento percentual de mulheres na liderança das empresas ainda é pequeno. Se todos os países investissem na igualdade de gênero, o PIB mundial aumentaria US$ 12 trilhões até 2024.
Os números são claros e justificam a recente busca de empresas para colocarem mais mulheres em cargos de poder. Como vemos hoje no mercado de comunicação, agências buscando por mulheres na liderança criativa (o inbox da More Grls que o diga).
Mas só o recrutamento por si não é a solução desse dilema. Na maioria dos casos as mulheres na liderança, além das suas tarefas primárias, são colocadas na função de protagonizar as mudanças de cultura daquela empresa. Mas é impossível ser simultaneamente paciente e médico. E cobrar apenas delas essa postura é mais um reflexo da cultura empresarial patriarcal. Afinal, elas são boas de convencer, não é mesmo? (Isso é uma ironia, caso não tenha ficado claro).
Por isso, convocamos os homens, a maioria no poder, para repensar metas, benefícios, cargos, modelo de gestão e atitudes que sustentem o molde da liderança.
Quando o mundo corporativo começar a remunerar o trabalho reprodutivo, o modelo bélico que praticamos desde a revolução industrial perde o sentido. Quem ganha com isso? Todos.
Que tal colocar essa meta para seus executivos?
*Esse texto contou com curadoria de conteúdo da Inesplorato
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