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Mesmo distante no espaço, SXSW capta, de novo, o espírito do tempo

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Mesmo distante no espaço, SXSW capta, de novo, o espírito do tempo

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22 de março de 2021 - 13h31

(Crédito: Reprodução)

O SXSW sempre foi, em minha opinião, o evento em que o espírito caótico do nosso tempo foi melhor capturado em suas nuances erráticas. Sempre foi lá para onde fomos em busca de um pedaço meio perdido de nós mesmos, para tentar entender porque não estamos, em verdade, entendendo direito mais as coisas, como antes entendíamos tão bem.

Mesmo em sua versão digital remota e distante no espaço, uma Austin virtual e em 3D conseguiu semana passada nos entregar a tradução de um mundo em conflito, mas ainda prenhe de possibilidades de avanços e descobertas, tendo como horizonte à frente todo um cenário de maravilhas ainda por acontecer.

É sempre impressionante ver como o SXSW nos devolve, mesmo nos revelando nossas contradições, conflitos e alguns medos, aquilo que somos, Homo Sapiens resilientemente Sapiens, apesar de tudo. E como, sabidinhos e espertos, como seguimos conquistando upgrades recorrentes de nossas versões anteriores.

É verdade, um disclaimer aqui, que o evento este ano ficou pelo menos cinco vezes menor do que o habitual e, portanto, entregou bem menos quantidade e uma consequente menor diversificação de speakers e temas abordados. Mas ainda assim, há inegáveis méritos nessa entrega.

Se você se interessa pelo evento, deve ter lido já bastante coisa sobre ele, sendo sempre uma referência imperdível a cobertura do M&M. Assim, vou ficar aqui no que sempre mais me fascinou lá, que é menos uma ou outra palestra, uma ou outra ação original e criativa específica, mas muito mais a amplidão do todo. Mais a floresta, menos a árvore.

Tudo já estava dado (e foi devidamente entregue) já, na beleza da grande grade do evento, decodificando muito do que estamos debatendo hoje nas nossas reclusas vidas distantes em apenas 7 temas: A New Urgency; Challenging Tech´s Path Forward; Cultural Resilience in The Arts;  The Rebirth of Business; Transforming the Entertainment Landscape; Connections in Disconnections; An Uncharted Future.

Cada um deles é a expressão de uma espécie de espanto, mas corajosamente olhando de frente a nem sempre tão fácil realidade, para propor reflexões de como há tanto a ser contraposto diante dos desafios e eventuais adversidades.

Gosto particularmente destes 5 olhares.

A New Urgency. Todos sabemos do que se trata. Sim, há a pandemia, que nos fez pensar sobre tudo de forma diversa do que pensávamos sobre tudo até então. Mas não é sobre ela. Pelo menos, não apenas sobre ela. É ela e muito mais, já que essa nova urgência vinha já, há anos, sendo registrada no mesmo SXSW de sempre, e será ela que deveremos enfrentar num mundo pós pandêmico, se é que teremos um mundo pós pandêmico. Vários outros temas como injustiça, pobreza, a nova versão do velho nacionalismo, a já também velha e cada vez mais preocupante crise climática, para ficar em alguns, estão sendo debatidos, para que tenhamos um mapa conhecido e possível de um progresso sustentável para todos. A luz acesa da urgência está lá, mas o propósito da prosperidade também.

Não são temas fáceis, aliás, radicalmente o contrário. A nova urgência é onde o evento assume definitivamente seu papel social global, deixando de ser, como em sua origem, um encontro sobre avanços e tendências tecnológicas.

Não há tecnologia sem sociedade e discutir uma sem discutir a outra não faz o menor sentido, sendo que, em alguns momentos, algumas versões mais remotas do SXSW pareceram, ainda que inspiradoras, ilhas de bem-aventurança futurísticas. 

Challenging Tech´s Path Forward. Aqui é o SXSW de sempre, sendo o SXSW de sempre. Mostrando o futuro tecnológico à frente. Mas este ano, o adjetivo “challenging” qualifica o substantivo “path”, todos inseridos no inevitável da vida … o “foward”. O fato de que a tecnologia precisa enfrentar desafios sempre foi, de certa forma, sabido, mas nos tempos modernos os desafios ficaram gigantes e será ela mesma aquela que deverá vir em nosso resgate. E será ela que nos aparelhará para os avanços que viveremos. Ela, entenda-se, do nosso lado, num ambiente em que muito da tecnologia também, muitas vezes, nos parece ameaçador.

The Rebirth of Business. Acredito que essa passou a ser a agenda inevitável do continuum da vida em negócios. Não há mais negócios como antes, cristalizados em práticas, processos e modelos como que pintados em um quadro, um canvas dado, um chart num flipchart. O tema fala em “rebirth” e “rebirth” quer dizer renascimento. Mas ora, só há renascimento, se antes tiver havido passamento. Pois é isso mesmo. As práticas, processos e modelos de negócios estão se reinventando todos os dias, recorrentemente e sem fim. Todo dia morre algo no ambiente dos negócios e essa é hoje a verdadeira essência do nosso novo devir corporativo. Acordamos pela manhã para dormirmos a noite tendo superado, numa velocidade inédita na história, as dinâmicas de negócios que nos movem. Não é ruim não, isso. É só desafiador. Em verdade, pode ser, sim, uma vibrante jornada. Até porque, a mesmice é um saco.

Connections in Disconnections. Aqui, o SXSW captura o espírito do nosso tempo na veia e, reconhecendo que embora estejamos hoje todos conectados, parecemos mesmo é habitar um mundo severamente desconectado. E assim sendo, a grande questão que se coloca é que, hoje submetidos ao isolamento e ao convívio com nossa própria individualidade, precisamos mais do que nunca abraçar a colaboração e os grandes valores da sociedade em seu mais amplo e generoso coletivo. Sós, não somos ninguém (ubuntu, diria a sábia cultura africana).

An Uncharted Future. Finalmente, um futuro não catalogado. Há quem possa supor que o futuro foi sempre não catalogado e que ele sempre nos surpreendeu. Mas há também os que possam afirmar que ele nunca nos surpreendeu tanto como nos surpreende hoje. 

Não canso de, insistentemente e até cansativamente, sempre me valer e sempre citar a futuróloga Amy Webb, para quem o futuro pode ser, sim, previsto. Criou até um método, preciso e infalível, para isso. O princípio de seu método é que o futuro não é algo que cai inesperadamente sobre nossas cabeças, vindo de lugar nenhum, mas muito mais um encadeamento de premissas condicionantes que já existem antes mesmo de acontecer. Ou seja, o futuro sempre esteve aqui e agora, no nosso presente. Basta observar com atenção.

A proposta de abordagem do SXSW sobre essa planilha previsível das imprevisibilidades que nos aguardam ali na curva do tempo que chamamos futuro, foi imaginarmos como avanços como o biohacking, a física quântica, além das conquistas surpreendentes da Inteligência Artificial, podem inspirar as novas gerações de descobertas e inovações da Humanidade.

É isso.Os caras fizeram de novo. Se aquilo que o SXSW remoto e digital deste ano nos ofereceu não é lá um quadro muito bonito de se ver, segue sendo, como disse, o evento em que o espelho de nós mesmos revela, com acurácia única, nossa mais precisa verdade. E se, por vezes, não é tão bom assim o reflexo que vemos, exatamente por ser inevitável e verdadeiro, é, ele mesmo, a certeza de que nossa missão e nosso propósito são seguir indefinidamente na superação de nós mesmos. Se não for assim, levantar da cama pra que mesmo?

 

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