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Sou Uber e já apanhei bastante

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Sou Uber e já apanhei bastante


2 de dezembro de 2015 - 2h30

Por James Scavone

Permita-me usar o rosto desfigurado do motorista do Uber de Porto Alegre como exemplo.
Cada soco, chute e pontapé é um soco, chute e pontapé com a marca da covardia.
É o medo que marca a valentia dos taxistas.
É o mesmo medo que me fez vítima algumas vezes.
Só não estava atrás de um volante, estava sentado confortavelmente em uma mesa de reunião.

 

 

Vivo há sete anos no Tibet da agência-própria.
Faz sete anos que abri a Salve com os três amigos que se tornaram meus sócios.
Já é o emprego em que fiquei mais tempo na carreira e isso significa muita coisa.
Abrimos a Salve em abril de 2008, o ano da crise-marolinha, que era crise de verdade.
A gente empolgado e esperando o telefone tocar e grande parte dos clientes planejando cortes nos custos (sounds familiar? ói nóis aqui traveis!)
A nossa sorte é que o facão significava buscar alternativas mais econômicas – como as que os meninos da internet ofereciam.

 

 

Naqueles tempos, a gente era "os meninos da internet."
As pessoas perguntavam já naquela época se a gente fazia viral.
A gente sabia que pedir viral era como pedir para um escritor produzir um best-seller.
Primeiro se escreve um bom livro, depois vem o best-seller, a gente dizia.
O pessoal que cuidava de internet no cliente há sete anos era bem jovem.
Estava mais para rito de passagem do que para paixão.
Tipo: vou cuidar da internet e mostrar serviço para depois migrar para o ATL, aí vou fazer TV com artista global e coisa e tal.
Hoje, a coisa mudou e não chama mais internet e sim digital.

 

 

Na época da internet, a coisa era difícil.
A gente era Uber antes do Uber.
A gente incomodava demais e levava socos, chutes e pontapés.
A maioria debaixo da mesa de reunião, é verdade.
A maior parte das agressões no tapetão do alinhamento global.
No tapetão da reunião com o alto escalão do marketing que a gente não tinha acesso.
Muita agência tradicional, muitas gigantes multinacionais bateram na gente sem dó.
Porque tinham medo do que agências como a Salve representavam.
O key visual vinha impresso pra gente ter que refazer na unha.
A verba, a nossa ínfima verba, sumia sob as asas do departamento de mídia deles.
"A agência usou para comprar um pacote de cinema que tava com um preço muito bom"
A gente pedia para colocar a URL do site da campanha no finalzinho do filme da televisão.
"O RTV esqueceu de colocar, foi mal aí."
Era sabotagem para ludita nenhum botar defeito.

 

 

Em 2015, Salve se juntou ao ABC de Nizan Guanaes e Guga Valente.
Que se uniu ao grupo Omnicom – veja só.
Em 2015, todo mundo quer andar de Uber.
Todo cliente quer andar de carro preto com ar condicionado e garrafa de água.
Toda agência tradicional se diz uberizada, isto é, digitalizada.
Apanhamos muito, mas continuamos rodando os caminhos da propaganda.
Chegamos longe mesmo sabendo que, no fundo no fundo, ainda estamos no começo.
É como acabar uma fase do Super Mario e ficar todo empolgado.
Mas é só uma fase completada e na tela a mensagem explica:
Parabéns! Mas a princesa está no outro castelo.
E lá vamos nós em busca da princesa.

 

 

(*) James Scavone é sócio e CCO da Agência Salve, que integrou o Grupo ABC em 2015.
 

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