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A engenharia do impossível começa com uma boa história

Afinal, fazer o impossível parecer real começa por fazê-lo parecer crível. E poucas empresas têm contado essa história com tanta habilidade quanto a Colossal


4 de junho de 2025 - 16h41

No palco do South by Southwest (SXSW) London 2025, o cofundador e CEO da Colossal Biosciences, Ben Lamm, compartilhou algo maior do que um avanço científico. Compartilhou uma história. Em entrevista conduzida pela atriz Sophie Turner – ícone pop global graças à série Game of Thrones – Lamm não apenas apresentou o retorno dos direwolves, espécie extinta há mais de 12 mil anos. Ele mostrou como uma ideia aparentemente impossível pode ganhar legitimidade quando é contada da forma certa.

Na construção de reputação, a confiança é um ativo tão valioso quanto a inovação. E é justamente aí que a Colossal tem revolucionado: ao transformar ciência de ponta em narrativas acessíveis, emocionantes e, acima de tudo, convincentes.

Fundada por Lamm, em parceria com o geneticista George Church, a Colossal Biosciences é uma empresa de biotecnologia com sede no Texas (EUA) que se dedica à desextinção de espécies, restauração de ecossistemas e conservação da biodiversidade. Usando engenharia genética, modelagem computacional e inteligência artificial, a empresa trabalha para reviver espécies como o mamute-lanoso, o dodô e o tigre-da-Tasmânia – ao mesmo tempo em que compartilha ferramentas com projetos globais de preservação.

A startup não apenas recriou uma linhagem genética extinta, mas criou também um enredo capaz de engajar crianças no TikTok, investidores em biotecnologia, líderes indígenas e até o autor de “As Crônicas de Gelo e Fogo”, George R. R. Martin, que visitou os lobos em uma reserva privada e descreveu a experiência como “mágica”.

Essa é a força do storytelling bem executado. Ben Lamm entendeu cedo que, para que o público compreendesse e aceitasse projetos disruptivos como a engenharia genética de espécies extintas, era preciso mais do que dados. Era preciso emoção, contexto, pertencimento. Era preciso contar histórias.
Ao contrário de muitos fundadores com perfis acadêmicos, Lamm vem da indústria de software e marketing. Sabe como articular visões complexas com linguagem acessível – e como conectar tecnologia com cultura. Ao criar direwolves, e não apenas “canídeos geneticamente restaurados”, ele ressignifica a biotecnologia com um toque de mitologia moderna.

E mais: cada experimento da Colossal é posicionado com propósito narrativo. O nascimento dos lobos é tratado como marco emocional e simbólico, reforçado por vídeos documentais, bastidores com especialistas e diálogos com a cultura pop. O uso de IA para decodificar os uivos dos animais, por exemplo, não é apenas uma aplicação de bioacústica – é apresentado como um novo idioma sendo descoberto. Isso transforma uma solução técnica em uma jornada quase mágica.

É esse tipo de abordagem que torna uma inovação “aceitável”. A Colossal opera em um terreno altamente sensível: manipulação genética, reengenharia da natureza, uso de inteligência artificial em organismos vivos. Sem um bom storytelling, qualquer uma dessas frentes seria imediatamente rejeitada pelo grande público como perigosa ou fantasiosa.

Mas quando Lamm conta que uma funcionária da equipe começou a cantar para os filhotes e eles responderam uivando, ou quando narra sua própria emoção ao assistir ao nascimento dos animais por videoconferência, a Colossal deixa de ser uma empresa de ciência e vira uma narrativa de futuro.

Essa capacidade de traduzir o complexo em experiências emocionais não serve apenas para cativar a audiência. Ela constrói um ativo ainda mais estratégico: confiança. E, num mercado em que a viabilidade de projetos depende de mobilização social, capital e legitimidade institucional, confiança é tudo.

O marketing tradicional se esforça para parecer inovador. A Colossal vai além: transforma a própria inovação em linguagem, em mito moderno, em marca viva. E nesse processo, redefine também o papel das empresas no século XXI – não como fornecedoras de produtos, mas como autoras de narrativas que moldam o imaginário coletivo.

Afinal, fazer o impossível parecer real começa por fazê-lo parecer crível. E poucas empresas têm contado essa história com tanta habilidade quanto a Colossal.

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